quinta-feira, 25 de abril de 2013

Nota da ANNEB – Aliança de Negras e Negros Evangélicos do Brasil contra o fundamentalismo religioso


Postado por Prª. Wall e Pr. Will em 14 abril 2013 às 17:30 (postado originalmente em http://negrosnegrascristaos.ning.com/profiles/blogs/anneb-ltimos-acontecimentos-em-torno-da-elei-o-da-presid-ncia-da e reproduzido aqui pela relevância) 



NOTA PÚBLICA Nº 01 - 2013 

Tema: Últimos acontecimentos em torno da eleição da Presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal

Assunto: Pronunciamento


Nós, da ANNEB – Aliança de Negras e Negros Evangélicos do Brasil vimos reafirmar o nosso compromisso com as Sagradas Escrituras (AT e NT), cujos valores inspiram a nossa luta contra toda e qualquer forma de discriminação à dignidade humana. O próprio Senhor Jesus Cristo, em seu evangelho, nos constrange a buscar entre todas as pessoas e de forma integral (Corpo, Alma e Espírito) uma vivência marcada pelo amor, pela justiça e pela paz, como testemunho autêntico de fé e compromisso com o seu Reino, principalmente com aquelas e aqueles que são consideradas e considerados mais vulneráveis em nossa sociedade.

Afinal, como bem diz o evangelho de Lucas 9.56 “O Filho do homem não veio para destruir as almas das pessoas, mas, para salvá-las”. Consequentemente, Jesus Cristo, por não fazer acepção de pessoas, convida a todos à vida plena, ao continuar dizendo: “Vinde a mim todos os que estais cansados e oprimidos e eu vos aliviarei” (Mt.11.28).

Isto posto, é nesse espírito de paz, justiça e amor que, de forma firme e irrevogável, nós, afiliadas e afiliados da ANNEB, repudiamos veementemente os pronunciamentos injuriosos contra as mulheres, os afrodescendentes e os homossexuais, proferidos pelo atual Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal.

Justificativa:

Nós, brasileiras e brasileiros, formamos um povo plural do ponto de vista étnico-racial. A diversidade assim compreendida é pauta atual e imprescindível nas relações sociais, institucionais e religiosas. Ao mesmo tempo é tão antiga como a imagem do corpo utilizada por Paulo (I Cor. 12.12), a qual evidencia a importância das diferenças das partes e a igualdade de valor de todas para o bom funcionamento do corpo, mesmo diante de classificações preconceituosas como: esta parte é melhor ou mais nobre que outras.
Embora afirmemos o ensino bíblico de que Deus criou a mulher e o homem e que esta é a sexualidade reconhecida pelas Igrejas Evangélicas, respeitamos o direito de escolha das pessoas homoafetivas, visto que vivemos numa sociedade democrática. Todavia, entendemos serem também inalienáveis os direitos iguais aos evangélicos no que tange à opção pela heterossexualidade.

Com efeito, o impasse que ora se estabelece na sociedade exige de todos nós, serenidade, maturidade e, sobretudo, responsabilidade em nossos discursos. Por isso, lamentamos a falta de preparo científico e amor fraterno do atual Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal, ao se pronunciar sobre temas, que no mínimo, nos convida a uma reflexão mais criteriosa.

A propósito, segundo Freitas, Arantes e Perilo (2010), essa possível virada icônica; hetero-homo; deve ser vista tanto no sentido da sexualidade-afetiva, quanto numa perspectiva política. De certa forma, a homossexualidade é também uma proposta de reorganização social, implicando em remanejo do capital econômico. Nesse sentido, o movimento homossexual deixa de ser visto como uma mera reação ao moralismo e passa a ser uma resposta à repressão e à exploração perpetrada por um sistema econômico patriarcal que junto com a modernidade já dá sinais de exaustão. Por aí se vê, que meros reducionismos ou mesmo, a violência verbal, não servirão em nada para dignificar o debate democrático. Isto posto, entendemos que precisamos de um moderador, cujo perfil esteja profundamente comprometido com a diversidade cultural e religiosa do nosso país. Não vemos esse perfil na atual presidência.

Reconhecemos que o racismo, os preconceitos e as discriminações são tratados nas igrejas e nas instituições evangélicas como tabu e com restrições. O assunto tem ensejado idéias de demonização e negativismo a respeito do povo negro e de seus costumes e tradições. Um exemplo disso são as afirmações do atual Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal, primeiro, atribuindo uma pseudo-maldição bíblica sobre as e os afro-descendentes, o que se constitui tanto uma perversidade, quanto um desrespeito crasso da exegese bíblica. Em tempo, a interpretação de textos sagrados a serviço da política ou mesmo da dominação e do controle social, não tem sido incomum na história da humanidade.

Nesta mesma linha de raciocínio, segue a segunda afirmação do Presidente em apreço, reforçando as representações machistas, ao propor a negação de direitos iguais às mulheres.  Certamente, o mesmo não conhece a realidade das mulheres brasileiras, a começar de sua própria comunidade de fé. Não sabe que no país em que vive, mais da metade das famílias são monoparentais, chefiadas por mulheres. O nobre Senhor, não acompanha os jornais que diuturnamente demonstram que nossas mulheres estão sendo assassinadas. Certamente, o mesmo não tem tido interesse de acompanhar os últimos relatórios do Conselho Mundial de Igrejas que demonstram que “68% dos atendimentos a mulheres vítimas de violência, a agressão aconteceu na residência”.

Portanto, é inadimissível um parlamentar tão inconsequente em seus discursos os quais certamente, não representa as evangélicas e os evangélicos, as brasileiras e os brasileiros, incluindo católicas e católicos, comprometidas  e comprometidos com uma vivência consciente dos valores do Reino de Deus (Paz, Justiça e Amor).

Nós da ANNEB entendemos, portanto, que dependendo da epistemologia cultural que uma dada sociedade alimente, haverá ou não respeito com a diversidade cultural de suas cidadãs e de seus cidadãos. E as religiões reúnem universos culturais simbólicos altamente diversos, por isso, a discussão dos direitos humanos certamente passa também pelo viés religioso. Do contrário, como bem nos lembra (Leitão e Vieira, 2010), “resta-nos a astúcia da ideologia da guerra e da classe oposta à outra”.


Referências

FREITAS, Fátima Regina Almeida; ARANTES, José Estevão Rocha; PERILO, Marcelo de Paula Pereira. Combatendo o preconceito: Discriminação e homofobia – Curso de Especialização, Diversidade Cultural e Cidadania, Universidade Federal de Goiás, 2010.

INFORMATIVO REGIONAL DA IGREJA METODISTA. 5ª RE. Ano 16. Janeiro-Fevereiro de 2013.

LEITÃO, Rosani  Moreira e  VIEIRA, Marisa Dama. Diversidade cultural e Cidadania In CIAR (Centro Integrado de Aprendizagem em Rede, UFG), 2010.

 
Assessoria:
Rev. José Roberto Alves Loiola
Relatoria Ministerial

Encaminhada para ANNEB-DF em 02/04/2013.

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