Por Paulo Stekel
“Não há gays no
Irã!” Esta teria sido a frase dita pelo presidente do Irã,
Mahmoud Ahmadinejad, em setembro de 2007, nos EUA, e que desde
então tem causado tanto protesto por parte do Movimento LGBT e pelos
defensores dos Direitos Humanos. Mas, o que exatamente ele disse na
ocasião? Ele disse (ver fonte):
“No Irã, nós não temos homossexuais COMO em seu país. No Irã,
nós não temos este fenômeno; eu nem sei quem lhes disse que o
temos.”
Leiamos as palavras
originais (ver fonte):
“In Iran we don't have homosexuals like in
your country. In Iran we do not have this phenomenon, I don't know
who has told you that we have it.”
Fica claro que
Ahmadinejad quis dizer que no Irã não há homossexuais “da
mesma maneira” (like) que no Ocidente. Ele se referia a toda
a visibilidade LGBT ocidental, ao orgulho e à dignidade da pessoa
gay, do “ser gay”, algo que, definitivamente, o Irã não possui.
Em certa medida, ele disse a verdade: não há gays visíveis,
pleiteando direitos e se reunindo em grupos porque são todos
assassinados por seu regime totalitário! Assim, os gays lá
existentes – e, existem, sim! - estão todos acuados, trancafiados
no armário, com medo da morte. Estes são os gays de Ahmadinejad:
uma comunidade inteira sem reconhecimento, sem existência, sem
cidadania, sem direitos, sem expressão, sem felicidade, mesmo sendo
cerca de 10% da sociedade iraniana – neste país de 75 milhões de
habitantes, os LGBT são cerca de 7,5 milhões.
Ahmadinejad é
conhecido por sua negação do Holocausto judeu, mas promove um
verdadeiro holocausto gay – um “homocausto”, nas
palavras de Luiz Mott – em seu país. E, bem aos olhos da
ONU e das organizações internacionais de defesa dos Direitos
Humanos. A coisa é muito mais séria do que se imagina! Fora isso,
ele ainda afirma mentirosamente que há direitos humanos no Irã, que
seu povo é muito feliz e livre para expressar o que pensa. Balela! O
mesmo discurso de outra ditadura, a Chinesa, para ludibriar os
organismos internacionais de defesa dos Direitos Humanos.
Mas, ninguém mais se
engana! Salvo alguns poucos marxistas-leninistas dinossauros de uma
época utópica que ainda defendem regimes como o da China, Cuba e
Irã (todos profundamente homofóbicos), a maior parte da humanidade
esclarecida percebe a manipulação e a mentira destes regimes. O que
há nestes países é ditadura com todas as letras, e os LGBT ali não
têm voz nem vez! Não se trata de uma crítica ao Comunismo ou ao
Islamismo, mas o reconhecimento de que nestes países nem sequer o
regime é comunista ou republicanismo islamita. São governos
corruptos e assassinos. O Capitalismo não é melhor, pois a
corrupção também é evidente em muitas democracias capitalistas.
Não estamos tratando de preferência política, mas de defesa da
vida, de defesa da dignidade humana e de direitos LGBT.
Aliás, há poucos
dias, em Nova Iorque, durante uma entrevista para a CNN, Ahmadinejad
voltou a ser polêmico ao dizer que apoiar gays é coisa de
capitalistas de linha dura, que não se importam com os autênticos
valores humanos (ver fonte).
“Autênticos valores humanos”? Por acaso, nós, gays, não somos
seres humanos? Não temos valores? E, valores autênticos? Quanto
discurso nazistoide embasado numa visão religiosa medieval e cruel
contra as minorias, mulheres e os de fora da fé (os “infieis”)!
E, associar apoio à causa LGBT ao Capitalismo é de uma boçalidade
sem tamanho. É fazer dos gays um joguete para atingir o regime
capitalista ocidental sem se importar com a dignidade das pessoas. É
isso que ensina o Islamismo? Tenho certeza de que a imensa maioria da
comunidade islâmica brasileira discorda! Tenho todo o respeito pelas
religiões em geral, e pelo Islamismo em particular, mas não posso
concordar de forma alguma com a redução da dignidade e do valor da
vida humana por conta das diversas orientações sexuais possíveis,
algo natural, não anormal, já que 10 a 20% da humanidade manifesta
desde a terna idade comportamentos não-heteronormativos. Se a quase
totalidade dos livros sagrados não percebeu essa naturalidade,
devemos aceitar passivamente ou devemos contra-argumentar, buscando a
correção do erro, lutando pelo que temos defendido através do
Movimento Espiritualidade Inclusiva – a Inclusão?
Ahmadinejad
chamou a homossexualidade de comportamento “muito desagradável”
e proibido por “todos os profetas de todas as religiões e todas
as fés”. Sim, ser gay sempre é muito desagradável para
pessoas que guardam preconceitos hediondos. Mas, ele está errado!
Nem todas as religiões proibiram as relações homossexuais. As
religiões de matriz africana tratam a questão com bastante
naturalidade; as diversas escolas budistas, ainda que apresentem
situações pontuais de preconceito, não possuem proibições à
sexualidade LGBT; as práticas neo-pagãs são mais abertas ao
assunto. E, mesmo que todas as religiões proibissem a
homossexualidade, não significaria que estivessem corretas. Apenas
evidenciaria que a ignorância é geral no meio religioso.
No final, a grande
batalha a ser vencida é a conquista do reconhecimento da
naturalidade das diversas orientações sexuais possíveis para um
ser humano, de modo que isso interfira definitivamente na
obtenção da cidadania plena, do direito igualitário e da inclusão
no meio religioso-espiritual.
Na mesma entrevista à
CNN, Ahmadinejad ridicularizou os políticos que apoiam os
LGBT “apenas para ganhar quatro ou cinco votos a mais”.
Também os ridicularizamos, mas com outras intenções, pois sabemos
que muitos políticos no mundo ocidental – e, no Brasil, há
centenas deles – passam anos atacando gays ou se eximindo de
apoiá-los, mas em períodos eleitorais surgem do nada como baluartes
dos direitos LGBT e da diversidade. Isso, realmente, é deplorável.
Devemos aprender a identificá-los, denunciá-los, não votar neles e
defenestrá-los de uma vez por todas da política através da mais
poderosa arma que temos: o voto!
Para Ahmadinejad,
as pessoas “viram homossexuais” e não nascem assim. Não
é o que a experiência tem demonstrado. Ora, 100% dos gays e
lésbicas nascem de um homem e de uma mulher. A maioria esmagadora
destes pais é heterossexual e educa seus filhos com suas referências
heterossexuais. Nenhum pai heterossexual educa seu filho para ser
homossexual. Então, como 10% da humanidade é homossexual? Todos nós
já vimos crianças de tenríssima idade apresentando sinais de uma
sexualidade diversa da heterossexual, com uma orientação diferente
da maioria dos seus iguais de gênero. E, isso não é incentivado
pelos pais heterossexuais. Pelo contrário, frequentemente isso é
motivo de agressividade parental para com o filho LGBT.
O que acontece no mundo
islâmico, em maior ou menor grau, é um patrulhamento moral intenso
das mulheres, das crianças e das pessoas que pareçam não
encaixar-se no modelo “santo” pregado pelas escrituras. Isso, em
muitos casos, acaba oprimindo as mulheres, inferiorizando-as e
causando enorme depressão e infelicidade, por causa do medo
constante da falsa acusação de adultério que possa redundar em
apedrejamento. As crianças são tratadas como continuadoras de um
sistema predeterminado de opressão (masculina) e submissão
(feminina). Quem discorda, só tem duas opções: ou foge, ou aguenta
as consequências da lei, que consegue forçar a barra mesmo em
locais onde a sharia (a lei islâmica) não é oficial.
O que sobra para gays,
lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais? A morte certa! A
única exceção no Irã é o caso dos transexuais, aos quais se
permite uma vida um pouco menos humilhante, uma vez que as cirurgias
de adequação de gênero são permitidas naquele país. O motivo
disto é muito simples: o machismo fundamentalista iraniano prefere
ver um homem “convertendo-se” oficialmente em mulher, passando a
obedecer às regras para mulheres (podendo, inclusive, casar-se
normalmente com um homem), do que vê-lo continuar um homem
fisicamente, e ver este manter relações com outro homem.
Ahmadinejad
defendeu hipocritamente em sua entrevista a resolução dos males da
humanidade e a promoção da liberdade e dignidade humanas. Mas,
declarou que tal liberdade não pode ser aplicada aos homossexuais
porque “a homossexualidade cessa a procriação”. Ora
essa, quem disse que os LGBT são estéreis???? Mais uma vez o
fundamentalismo generalizante tentando amedrontar a humanidade com o
“mal gay”.
Ahmadinejad tem
tanto medo dos gays de seu país que os nega até a morte... ou
antes, os nega PELA pena de morte... E, os clérigos muçulmanos
iranianos são os maiores responsáveis por esta chacina chamada de
“ordenamento divino”, que tem a capacidade de condenar ao
enforcamento meninos de 12 anos acusados de homossexualidade, e cuja
única prova é o fato de terem sido encontrados vestindo calções
curtos... A bestialidade humana que mata nossas crianças em nome de
um Deus – que se existe, deve estar muito irado – aumenta a cada
dia neste mundo caótico e tão carente de amor, compreensão,
compaixão e aceitação do outro.
Vamos aproveitar para
refletir o quanto nós, aqui no Brasil, também estamos sendo cruéis
com pessoas por conta de sua orientação sexual, de seu gênero e de
sua identidade sexual. O verdadeiro valor da vida humana está sendo
esquecido em nome de supostos princípios religiosos arcaicos e
medievais, por pessoas de alma embrutecida que se auto-intitulam
arautos de Deus, mas que nada mais são que os mensageiros do Mal na
Terra...
Um comentário:
Paulo Stekel.
Fui convidada a dar uma entrevista por uma Sophia Sheimberg, e vi que você também havia dado uma entrevista lá. Queria pedir que me escevesse, gostaria de conversar com você sobre isso. Meu e-mail é asaheuser@yahoo.com.br
Abraço
Åsa Heuser
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