Por Espiritualidade Inclusiva
A pedidos, apresentamos aqui o vídeo-documentário "O Mesmo Amor", que mostra o trabalho realizado no Brasil pelas Igrejas Inclusivas.
O vídeo-documentário "O Mesmo Amor" foi produzido por quatro pessoas em parceria com a produtora Firehouse Media. "O Mesmo Amor" aborda a temática da homossexualidade dentro da religião, focando na existência de igrejas cristãs inclusivas.
Os produtores Luiza Judice, Mariane Galacini, Ligia Dumit e Paulo do Valle são formados em Jornalismo pela PUC-Campinas e o vídeo é resultado de um projeto de conclusão de curso, produzido, gravado e editado de forma totalmente independente (e com o conteúdo bastante autoral).
"Em tempos de Felicianos, Malafaias, Bolsonaros e a intolerância (ou ignorância/desconhecimento) de grande parcela da população, acreditamos que o tema do documentário incita a reflexão, repensa a tolerância e proporciona discussões por outro viés do assunto." [Palavras de Luiza Judice, uma das produtoras do vídeo]
O MESMO AMOR [documentário]:
http://www.youtube.com/watch?v=KzXmnrG7-Fk
O documentário "O Mesmo Amor" é um retrato da relação de homossexuais com a religião a partir da história de vida de personagens que encontraram, dentro de um ambiente religioso que acolhe a diversidade, conforto e realização com a própria fé. O projeto tem como foco a Igreja Cristã Evangelho Para Todos, uma das primeiras igrejas cristãs do Brasil a pregar a Teologia Inclusiva.
Parabéns aos produtores pela iniciativa!

Blogue do Movimento Espiritualidade Inclusiva. Artigos sobre visão inclusiva nas diversas formas de espiritualidade; denúncias de preconceito religioso e fundamentalista contra LGBTs; dicas de blogues, sites, filmes e documentários; tradução de artigos; divulgação de eventos LGBT e os inclusivos; notícias do mundo LGBT; decisões legislativas e debates políticos relativos aos direitos LGBT; temas culturais relevantes. Contato: espiritualidadeinclusiva@gmail.com
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quinta-feira, 18 de abril de 2013
segunda-feira, 31 de dezembro de 2012
quarta-feira, 26 de dezembro de 2012
[Editorial] Ser Gay: o peso da discriminação
Por Paulo Stekel
Nestes últimos meses,
em especial em novembro e dezembro, estive um tanto afastado das
atividades do Movimento Espiritualidade Inclusiva e, mais ainda, das
atualizações do blogue. O motivo foi familiar, já que perdi um
irmão muito querido em uma tragédia. Depois disso, alguns ajustes
foram necessários, o que me tomou mais tempo, sem contar a
assimilação do que ocorreu. A morte, por mais que saibamos ser a
única coisa certa após o nascimento, sempre desestabiliza a todos
nós em alguma medida.
A propósito, a
homofobia – discreta ou declarada – também tem a propriedade de
desestabilizar qualquer um, por mais firme que alguém esteja em sua
identidade e dignidade. Vejo isso a todo o tempo com meus amigos e
amigas da comunidade LGBT, e mesmo na própria pele pude sentir isso
ultimamente...
O processo do “ser
gay” passa por várias fases: o descobrir-se, o aceitar-se, o
identificar-se e o sentir-se digno, apesar do preconceito da
sociedade. Cada pessoa LGBT passa por estas fases de um modo muito
particular, e muita gente nunca chega à última.
A descoberta tem a ver
com comparações de si mesmo e de seus desejos e sensações com os
de outras pessoas do mesmo sexo. A aceitação tem a ver com um não
poder mais negar a si mesmo que algo diferente da maioria acontece. A
identificação com outros semelhantes ajuda a gerar a identidade
“gay”, não padronizada, mas peculiar, ainda que LGBT na
essência. A dignidade, por fim, tem a ver com o entendimento de que
se é um ser humano como qualquer outro, não se justificando aceitar
qualquer tipo de discriminação.
Passei por mais um
teste desta última fase nas últimas semanas. Percebi a sutileza
guardada pela homofobia familiar, instigada por doutrinas diabólicas
de fundamentalistas evangélicos. O mais interessante é que, em
todos os casos, o indivíduo gay é considerado impuro, sujo,
pecaminoso, mas seu dinheiro é aceito de muito bom grado...
Hipocrisia infernal! Nas famílias, em geral, por saber-se
naturalmente o quanto os filhos gays cuidam de seus pais com
responsabilidade, muitos se aproveitam disso e, nas horas mais
graves, somem-se os filhos heterossexuais e restam apenas os gays
para garantir a dignidade aos pais. Dignidade, aliás, que a estes
filhos mesmos é negada... Não há nada de divino nesta relação de
interesse. Por isso, a abomino e a desmantelo colocando todos os
pingos nos “is” e exigindo minha dignidade por direito. Parece
estar funcionando... mas ainda resta o peso da discriminação, que
podemos sentir nas palavras não ditas e nos desvios calculados...
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No dia 13 de dezembro
nosso blogue completou seu primeiro ano, bem como o próprio
Movimento Espiritualidade Inclusiva. Fizemos muita coisa neste tempo.
Vamos a uma pequena retrospectiva:
Em janeiro, tivemos
duas atividades inseridas no Fórum Social Temático, uma em Porto
Alegre e outra em Canoas, no RS (ver:
http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com.br/2012/01/evento-palestra-sobre-espiritualidade.html).
Em fevereiro, fomos os
primeiros a noticiar um caso de homofobia em Minas Gerais, e nosso
artigo foi reproduzido por várias mídias LGBT de lá (ver:
http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com.br/2012/02/homofobia-me-machuca-ou-mais-uma.html).
Em março, o Movimento
Espiritualidade Inclusiva participou da 1ª Marcha das Mulheres em
Eldorado do Sul – RS (ver:
http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com.br/2012/03/evento-palestra-de-espiritualidade.html).
Em maio, o Movimento
Espiritualidade Inclusiva entrou em processo de instalação de
coordenadorias estaduais e municipais; participou como debatedor no
Cine LGBT na 28ª Feira do Livro de Canoas – RS; foi recebido pelo
representante da Coordenadoria Estadual de Diversidade Sexual, uma
coordenadoria recente ligada à Secretaria da Justiça e dos Direitos
Humanos e criada pelo atual governo gaúcho (ver:
http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com.br/2012/05/noticia-movimento-espiritualidade.html).
Em junho foi criado o
primeiro Grupo de Encontro do RS (ver:
http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com.br/2012/06/evento-primeiro-grupo-de-encontro-no-rs.html).
Em agosto, o jornalista
e coordenador do Movimento Espiritualidade Inclusiva, Paulo Stekel,
debateu o tema “Saúde Espiritual da Pessoa LGBT através da
Inclusão”, dentro da 8ª Semana do Orgulho de Ser, no auditório
da Faculdade Santo Agostinho (Teresina – Piauí) – ver:
http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com.br/2012/08/saude-espiritual-religiao-e-cidadania.html.
Em setembro, foi criado
o Grupo de Encontro em Porto Alegre – RS (ver:
http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com.br/2012/09/evento-participe-do-primeiro-grupo-de.html).
Em dezembro, o
Movimento foi uma das três entidades da sociedade civil envolvidas
na organização da 4ª Parada Livre de Canoas.
Em 2013, queremos
continuar ampliando o número de Grupos de Encontro e o ativismo
pró-LGBT, especialmente através de ações de enfrentamento da
homofobia religiosa, que parece ter aumentado consideravelmente em
2012.
Um de nossos objetivos
para o próximo ano é o lançamento de um livro sobre
Espiritualidade Inclusiva, aliás, o primeiro sobre o assunto em
Língua Portuguesa. Aguardem!
Outro objetivo
importante, é a realização do 1° Seminário de Espiritualidade
Inclusiva, que ocorrerá provavelmente em Porto Alegre – RS, mas
ainda sem data definida.
Então, só nos resta
dizer que estamos de volta e... Feliz Ano Novo a todos e a todas!!!!
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quarta-feira, 17 de outubro de 2012
Nova Espiritualidade: A Homossexualidade
Por “Jesus Cristo”
(mensagem canalizada através de Pamela Kribbe – ver
www.jeshua.net)
Nota de Espiritualidade
Inclusiva: Há algum tempo pessoas nos têm indagado sobre a opinião
dos praticantes da “Nova Espiritualidade” a respeito da
homossexualidade. A “Nova Espiritualidade” tem a ver com práticas
dissociadas das grandes religiões históricas e inclui crenças como
Teosofia, Ufologia, Canalização, Grande Fraternidade Branca,
Consciências Índigo, além da prática de muitas terapias
holísticas (Reiki, Florais, Apometria, Cromoterapia, etc).
Realmente, há pouco material vindo destas fontes sobre a
homossexualidade e, quando aparecem, geralmente guardam algum tipo de
preconceito: ou a homossexualidade é entendida como “carma” de
vidas passadas, ou como uma inadequação ao se nascer em um gênero
diferente do vivido em encarnações recentes, ou disfunções nos
chacras. Tudo preconceito puro e desconhecimento da realidade
homossexual e, antes ainda, da realidade da sexualidade humana. O
texto abaixo reproduzido é uma rara exceção. Apresenta a
homossexualidade como natural e critica o preconceito, não a pessoa
homossexual. É uma “canalização” (channeling), uma mensagem de tipo mediúnico recebida por uma canalizadora (médium) que vive na
Holanda. Independente de acreditarmos ou não na origem espiritual da
mensagem, o que é importante enaltecer é seu teor inclusivo,
propósito principal do nosso blogue e do Movimento Espiritualidade
Inclusiva.
A mensagem:
Meus amados Filhos,
Não há nada de errado
com a homossexualidade. A homossexualidade é perfeitamente
respeitável; a forma em que ela vem sendo retratada por várias
tradições religiosas, como pecaminosa e prejudicial, origina-se do
medo e do preconceito. Não há nada de errado em se sentir atraído
por pessoas do mesmo sexo. Na verdade, a preferência pelo mesmo sexo
ou pelo outro sexo não é tão fixa e rigidamente dividida como
muitas pessoas pensam. Você pode ser heterossexual e, ao mesmo
tempo, ser atraído por pessoas do seu próprio sexo. Você pode
sentir uma conexão de alma que transcende a forma física. Em outras
palavras: você pode ser heterossexual no geral, mas sentir-se
atraído por alguém do mesmo sexo porque existe uma conexão
profunda no nível da alma. Existe uma escala móvel entre
heterossexualidade e homossexualidade, e não uma fronteira fixa.
Do ponto de vista
espiritual, o que importa nos relacionamentos sexuais é como um se
conecta com o outro de alma para alma. Sempre que existe uma conexão
profunda, marcada por uma parceria verdadeira e respeito mútuo, o
fato do relacionamento entre homem-mulher, homem-homem ou
mulher-mulher realmente não importa.
É lógico que é
importante para o mundo se você é homossexual. Em muitos lugares ao
redor do mundo ainda existe preconceito e hostilidade contra a
homossexualidade. Muitas almas que encarnam como homossexuais são
bastante corajosas, porque sabem que enfrentarão a questão da
marginalização, de ser diferente dos outros e ter que lidar com
hostilidade e incompreensão. A alma pode ter decidido
conscientemente passar por essa experiência para enfrentar e superar
a dor emocional de ser rejeitada e, com isto, tornar-se forte e
independente, ou para elevar a consciência na Terra, fazendo as
pessoas refletirem sobre as definições tradicionais mesquinhas e
limitadas sobre a identidade sexual. Os homens homossexuais, por
exemplo, podem mostrar como de ser do sexo masculino pode facilmente
combinar com ser sensível e artístico. Homens e mulheres
homossexuais encorajam as pessoas a pensarem de modo diferente sobre
o que significa ser do sexo masculino ou feminino.
Para os homossexuais
que se sentem dilacerados e em conflito sobre sua natureza sexual, eu
diria:
Não julgue o seu modo
natural de sentir; respeite sua natureza e sinta-se livre para ser
quem você é. Seja fiel a si mesmo, não se esconda. Outras pessoas
podem aprender alguma coisa com você. Cônjuges ou pais, que se
sentem chocados e ofendidos quando você lhes conta sobre a sua
natureza, serão tocados, de alguma forma, pela sua coragem e
honestidade, mesmo que não demonstrem isso abertamente. A verdade
sempre liberta as pessoas. Ao permanecer fiel a si mesmo, você se
curará e será uma luz para os outros.
JESUS CRISTO
Mensagem de Jesus
Cristo, através de Pamela Kribbe.
© Pamela Kribbe 2011
Tradução de Vera
Corrêa veracorrea46@ig.com.br
Direitos Autorais
Pamela Kribbe - A permissão é concedida para cópia e distribuição
deste artigo na condição de que o endereço www.jeshua.net
, esteja incluído como recurso e que ele seja distribuído
livremente. E-mail: aurelia@jeshua.net
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sexta-feira, 28 de setembro de 2012
Inclusão na Espiritualidade
Por Jéferson Cristian
Guterres de Carvalho
Recebi um desafio de
compartilhar neste espaço uma difícil, mas não impossível missão:
espiritualidade inclusiva. Sim, digo difícil por que somos
hipócritas ao dizer que adoramos um Deus que une os povos e ama a
todos e a todas sem distinção de classe social, etnia, sexualidade
ou religiosidade, mas continuamos “inundados” em pré-conceitos
que atravessaram o tempo desde a era medieval na Europa e vêm em
pleno século XXI em uma sociedade que se diz mais politizada e
compreensiva. Fico imaginando a indignação de Deus ao enviar seu
filho à Terra, entregando seu corpo e sangue por nós para que não
maltratássemos o próximo e a próxima, e de repente vemos nos
noticiários pessoas assassinadas por falsos movimentos ideológicos
porque sua orientação sexual era diferentes destes. Quando penso em
espiritualidade, melhor, quando a vivencio em meu dia-a-dia, vejo um
mundo onde a felicidade é para todos e todas e onde ninguém critica
o modo de pensar ou agir de cada um e cada uma.
Vivemos em um país que
foi construído por diversas nacionalidades, tendo uma incrível e
bela miscigenação que constitui um povo de múltipla beleza. E,
como podemos ter esta riqueza genética em nosso povo e continuar
matando uns aos outros, ou umas às outras, por coloração de pele
ou modo de agir? Acredito que no início dos tempos, ou melhor, na
pré-história, quando o(a) primata que deu origem à primeira
espécie humana em nosso planeta, por não ter uma racionalidade como
temos nos dias de hoje, provavelmente não compreendia que a ação
sexual deveria ser hétero, a deve ter consumado com seres de mesmo
sexo, e para eles e elas isso era normal. Temos também exemplos
durante nossa história de autoridades políticas gregas, romanas,
egípcias, e demais períodos em que se consumava o ato sexual com
pessoas do mesmo sexo e não era considerado alguma agressão a moral
e bons costumes, valores este criados por uma sociedade, ou melhor,
por um governo que temia uma revolta do povo, e que criou certas
regras de etiqueta a partir de uma imposição religiosa para que
tivessem sempre o controle da situação. É fácil uma religião se
utilizar de Deus, ou outro tipo de divindade, para favorecer seus
interesses e de seu governo.
A liberdade religiosa
deve ser uma dádiva não apenas de poucos, mas de todos,
independente de sua orientação sexual, pois conheci um Jesus humano
que vivia no meio dos(as) excluídos(as) sentado ao chão, comendo de
pão puro e bebendo apenas água em copo de barro sujo, abraçando
leprosos, perdoando falsos pecados impostos pela sociedade da época
e amando seu próximo e sua próxima. Os templos religiosos não
podem mais a renunciar seus fiéis, pois se assim o fizerem, deixarão
de ser religiões e serão instituições homofóbicas e
preconceituosas. E, digo com toda a veracidade que ao ler e pesquisar
sobre as religiões em diferentes continentes para escrever este
artigo não encontrei nenhuma DIVINDADE que seja contra a pessoa que
tem sua orientação sexual definida: independente se é
heterossexual ou se é homossexual, pois conforme a filosofia de cada
religião, seita, doutrina ou sociedade, o importante é viver na paz
e no amor se beneficiando de suas atitudes mais do que de seus
pensamentos.
Sobre o autor
Jéferson Cristian
Guterres de Carvalho é vice-presidente do Conselho Municipal de
Juventude do município de Canoas – RS; militante da Pastoral da
Juventude do Rio Grande do Sul (Vicariato Episcopal de Canoas no
grupo de jovens JOCRE); graduando em bacharel em História na
Universidade Luterana do Brasil – Campus Canoas; militar da Força
Aérea Brasileira; colaborador da Coordenadoria Municipal de
Políticas de Diversidade do município de Canoas.
sexta-feira, 7 de setembro de 2012
Camiseta oficial do Movimento Espiritualidade Inclusiva
Por Espiritualidade Inclusiva
No dia 25 de setembro será lançada em nível nacional a camiseta oficial do Movimento Espiritualidade Inclusiva. Nas cores preta e branca e nos tamanhos M e G, a camiseta terá como preço de lançamento apenas R$ 30,00 (+ R$ 05,00 de correios para qualquer lugar do Brasil).
No dia 25 de setembro será lançada em nível nacional a camiseta oficial do Movimento Espiritualidade Inclusiva. Nas cores preta e branca e nos tamanhos M e G, a camiseta terá como preço de lançamento apenas R$ 30,00 (+ R$ 05,00 de correios para qualquer lugar do Brasil).
Você já pode fazer seu pedido antecipado solicitando maiores informações pelo email espiritualidadeinclusiva@gmail.com
domingo, 12 de agosto de 2012
Espiritualidade e Identidade Gay
Por Paulo Stekel
Vou confessar a vocês!
Tive a ideia deste artigo após consultar as estatísticas do blogue
Espiritualidade Inclusiva e constatar que alguém pesquisou
exatamente sobre isso. Tal indivíduo devia estar buscando alguma
relação entre sua identidade gay e a espiritualidade, esperando
encontrar algum alento para um conflito interno, talvez. Vamos
ajudá-lo!
A primeira coisa a
definir é “identidade gay” ou, como poderia ser mais amplamente
nomeada, “identidade LGBT”. Depois, precisamos observar se esta
identidade é em algo compatível ou incompatível com uma busca
espiritual.
Identidade gay tem a
ver, obviamente, com padrões de pensamento, formas do gay ver a si
mesmo, o tipo de significado que atribui às suas atrações
homossexuais e o que isso significa para ele.
A psicóloga Vivienne
Cass (Austrália) desenvolveu um modelo de formação de identidade
gay, o Model of Homosexuality Identity Formation, que pode
ajudar a definir como se processa a formação de tal identidade,
ainda que não explique em maiores detalhes como isso acontece.
Segundo esse modelo, a
formação da identidade gay passa por seis estágios que, uma vez
alcançados, o que não ocorre em todos os gays e nem é uma
necessidade imperativa, determinam uma certa prontidão para a
instalação de um repertório emocional/comportamental, tanto no
nível pessoal como no social.
Os estágios são (cfe.
http://www.rea.pt/forum/index.php?topic=2261.msg86900#msg86900):
1. Confusão de
identidade: nesse estágio o individuo começa a notar, a reconhecer
e a aceitar sua atração sexual por outros homens. Mas não se
imagina gay e identifica-se como heterossexual. Nem todos os
indivíduos que estão nesse estágio irão passar para o estágio
seguinte. Alguns aceitam suas fantasias homoeróticas, mas nem por
isso consideram a possibilidade de se tornarem gays.
2. Comparação de
identidade: durante esse estágio o indivíduo começa a considerar a
possibilidade de que talvez seja homossexual. Ele provavelmente não
emprega a palavra gay, uma vez que essa palavra está associada a um
estilo de vida muito particular, com o qual ele não se identifica. É
possível que aceite seu comportamento sexual, mas recuse a
identidade. Ou que aceite a identidade, mas decida reprimir seu
comportamento homossexual.
3. Tolerância de
identidade: aqui, o individuo já começa a identificar-se como gay,
embora ainda tenha dificuldades em se aproximar da cultura gay. Nesse
estágio as experiências (positivas ou negativas) são determinantes
para a continuidade (ou não) no processo de formação e para que
ele se mova (ou não) ao estágio seguinte.
4. Aceitação de
identidade: a passagem do estágio de tolerância para o de aceitação
se dá a partir de um sentimento de pertencimento e de identificação
com a comunidade gay. Nesse estágio o indivíduo tende a rejeitar os
segmentos antigays da sociedade e a se aproximar cada vez mais de
outros gays, adotando comportamentos, hábitos e linguagem própria
do grupo gay com o qual se identifica.
5. Orgulho de
identidade: nesse estágio o indivíduo identifica-se totalmente como
gay, reforçando, sempre que possível, as diferenças entre gays e
heteros. Podem surgir sentimentos de “nós contra eles” e uma
necessidade de se assumir completamente. Esse costuma ser o estágio
da maior parte dos ativistas.
6. Síntese de
identidade: no último estágio prevalece a integração entre gays e
heteros, e o indivíduo começa a compreender que nem todos os
heterossexuais são antigays. O indivíduo reconhece e luta contra a
homofobia e o preconceito, mas de uma forma mais tranqüila e sem
sentir-se ameaçado. Consegue integrar sua afetividade e sua
sexualidade a todas as áreas da vida.
O fato é que
provavelmente conhecemos pessoas LGBT em todos esses estágios.
Alguns gays se
consideram heterossexuais a vida toda, pois mesmo tendo “casos”
rápidos com pessoas do mesmo sexo, consideram que, sendo casados com
alguém do sexo oposto, não se consideram como tendo uma identidade
diversa da maioria. Outros gays até se consideram como tais, mas
evitam qualquer aproximação com a cultura gya, os assuntos
relacionados, ficando a parte de qualquer ativismo pró-direitos
LGBT.
No meio religioso, o
que impera é o desenvolvimento tardio da identidade gay. Gays
cristãos, por exemplo, só começam a desenvolver sua identidade
após chegar ao ensino superior, convivendo com outros gays em
estágio de desenvolvimento maior. Alguns padres cristãos gays
aceitam sua identidade, mas reprimem seu comportamento,
considerando-o pecaminoso.
Uma ressalva à
expressão “orgulho” usada no quinto estágio da psicóloga
autraliana. Ela diz que neste estágio o indivíduo reforça “sempre
que possível, as diferenças entre gays e héteros” e que esse
“costuma ser o estágio da maior parte dos ativistas”. Na
verdade, isso não tem nada a ver com o tão comentado (e polêmico)
Orgulho Gay, mote das Paradas Livres pelo mundo afora. O verdadeiro
Orgulho Gay tem mais a ver com uma sensação psicológica de
“normalidade, afinal!” causada pela percepção de que ser LGBT
não é uma aberração, mas está presente na natureza humana e até
na animal, do que com uma atitude de superioridade. O que as Paradas
Livres procuram enfatizar é essa “normalidade” e naturalidade da
diversidade sexual, e não uma divisão do mundo social em LGBTs e
Não-LGBTs.
Em A Identidade Gay:
Uma Construção Histórica (ver
http://www.pucsp.br/clinica/publicacoes/boletins/boletim10_07.htm),
Elcio Nogueira afirma:
“A homossexualidade
sofreu e ainda sofre, grandes preconceitos e estigmas, o sujeito
homoerótico, é bastante estigmatizado, e as religiões sejam elas
quais forem, ainda o colocam como o “porta-voz” do demônio, ou a
aberração que tem de voltar aos caminhos de Deus. O Lócus social
em que o indivíduo homoerótico foi obrigado a construir sua rede de
identificações, suas subjetividades, ou o que lhe foi permitido
desejar, e mesmo construir como relação possível com o outro,
influíram e tiveram preponderância, nas hoje chamadas relações
homoeróticas.”
Como hoje em dia alguns
grupos do movimento LGBT têm criticado a comercialização de uma
identidade gay e os auto-impostos guetos das culturas LGBT, nos
referimos a “identidade gay” como uma construção da pessoa LGBT
a partir de dentro e não de uma imposição ou pressão social. Tem
mais a ver com o próprio auto-conhecimento do indivíduo acerca de
sua sexualidade do que com uma construção midiática ou de
marketing segundo certas doutrinas ou ideologias.
Exatamente aqui pode
entrar o conceito de Espiritualidade, e é este conceito que pode
diferenciar umas identidade gay “pura” de uma identidade forjada
na mercadologia do momento.
No desenvolvimento da
identidade gay nos moldes não mercadológicos que definimos, a busca
da espiritualidade pode ser um auxiliar incrível. Mas, para isso, a
relação com a espiritualidade deve ser mais profunda e interior que
uma relação com alguma religião formal, embora esse segundo
aspecto não esteja descartado nem seja contraproducente. Afinal, não
há qualquer incompatibilidade entre busca espiritual e orientação
sexual. O que é contraproducente é a prática de uma religião
naturalmente homofóbica numa postura homofóbica. Então, se for
para praticar religiões formais, que se busque os grupos inclusivos
dentro delas.
Contudo, se estivermos
falando em Nova Espiritualidade, uma tendência crescente no
mundo e que se define por uma busca espiritual/religiosa
transcendendo a religião formal, então, tudo o que ajude no
autoconhecimento pode ser proveitoso.
Os aspectos de culto ao
feminismo de algumas espiritualidade pagãs podem ajudar gays e
lésbicas numa autocompreensão a partir da dualidade dentro de si
mesmos, levando a uma integração de polaridades sem a necessidade
de relações sexuais com o sexo oposto, por exemplo.
As práticas
espirituais “xamânicas” que enaltecem a integração do ser
humano com a natureza também podem ser úteis, pois mostram que a
diversidade é a tônica do cosmos. Assim, o LGBT se percebe como
parte natural do todo e não como um acidente de percurso.
Os grupos de meditação
(Budismo, Hinduísmo, etc.) geralmente são mais amigáveis aos gays,
o que pode ser uma boa forma de equilibrar mentes geralmente
bagunçadas pela pressão social, familiar, e pelo preconceito
homofóbico diário, sem contar um pouco de homofobia internalizada,
uma forma de auto-flagelação.
Nos Estados Unidos, há
comunidades de gays praticantes da “nova espiritualidade” que
trabalham com xamanismo, mediunidade, canalização e que até
“incorporam” o gender queer, um tipo de entidade espiritual gay.
O Candomblé brasileiro já conhece isso, pois existem Orixás com
aspectos masculinos e femininos, como Oxumaré.
A principal função da
prática espiritual de um indivíduo gay em processo de
desenvolvimento de sua identidade deve ser o equilibrar sua vida, sem
culpas ou rancores sobre a homossexualidade.
Deve entender que o ser
gay ou LGBT é uma condição espiritual pré-existente no seu ser.
Hoje em dia temos
observado que os adolescentes estão saindo mais cedo do armário que
trinta anos atrás. Isso se deve muito provavelmente à Internet, que
faz com que se sintam menos isolados, pois pesquisando e interagindo
em redes sociais estão vendo modelos positivos nos meios de
comunicação, bem como nos grupos e comunidades das quais
participam, inicialmente com perfis falsos (os “fakes”), depois
abertamente declarando-se gays. Entre estes modelos positivos se
encontram as Igrejas Inclusivas, os grupos inclusivos em religiões
formais mais antigas e as setoriais LGBT de partidos políticos.
De qualquer forma, o
conflito pessoal sobre os sentimentos homossexuais cria sempre uma
difícil luta interna. Depois de anos tentando encontrar respostas e
sem sucesso na tentativa de mudar seus sentimentos, muitos pessoas se
convenceram de que seus sentimentos homossexuais são inatos e
imutáveis, e agora aceitam uma identidade gay que finalmente termina
a luta interna que lhes causou tanta frustração e tanta dor.
Aceitar uma identidade gay tem implicações enormes, uma vez que ser
gay inclui não apenas sentimentos pessoais, mas também descreve uma
identidade social e política. Essa identidade social e política
está sempre em construção e sofre adaptações, já que a
construção social e política dos povos também muda. A formação
da identidade e do orgulho dos povos negros, seja na África ou na
Escravatura, passou por fases muito semelhantes às que passam os
LGBT na busca por aceitação na sociedade moderna.
Hoje, a formação não
apenas de grupos de apoio aos LGBT em processo de desenvolvimento da
própria identidade, mas também de grupos envolvendo espiritualidade
numa perspectiva LGBT (não para LGBTs) se mostra muito salutar na
medida em que se percebe que alguém que saiu do armário tem muita
necessidade de ser ouvido, acolhido e orientado.
Antes de sair do
armário, a maioria dos gays não sabe quem é, se desconhece por
completo, não consegue se ver no espelho sem um olhar de reprovação,
mesmo que não consiga especificar o motivo. O moralismo das
religiões formais tem muito a ver com isso, e esse moralismo
contamina as famílias dos gays, chegando, ao final, a causar a
pressão interna que vemos em quem demora a assumir-se. Este seria o
momento ideal para a Nova Espiritualidade agir, acolhendo o LGBT em
conflito sem fazer qualquer juízo moral, pois esta não é uma
função original da religião – sua função original é levar o
homem à felicidade, ao autoconhecimento e a uma vida de harmonia com
o todo.
Gays saindo ou já
completamente saídos do armário aderem ao “tribalismo”,
buscando seus iguais, para compartilhar vida social, amizades e
encontrar seu lugar num mundo que os exclui. Uma espiritualidade
inclusiva, onde achamos que deva se inserir a Nova Espiritualidade,
sempre orientará o indivídio LGBT a não afastar-se das pessoas,
mas a integrar-se a elas, em todos os ambientes da sociedade, para
não reforçar a “guetificação” LGBT. Se, antigamente, essa
“guetificação” foi positiva na organização do movimento LGBT,
hoje a ideia mais producente deve ser a integração, favorecendo a
conquista de direitos igualitários.
A relação óbvia
entre a Identidade Gay e a Espiritualidade está no autoconhecer-se.
Primeiro, nos autoconhecemos como seres diversos numa variedade de
orientações sexuais disponíveis na natureza. Percebemos nossa
orientação como algo comum em outros, ainda que manifestando-se de
modo muito peculiar – cada um vive sua sexualidade de modo próprio.
Depois, nos autoconhecemos como seres humanos iguais ao demais, com
os mesmos sofrimentos, anseios, momentos felizes e objetivos. Então,
buscamos a transcendência. Isso é espiritualidade! Se uma religião
formal – qualquer uma – não conduz o indivíduo (gay ou não) a
isso, não tem qualquer proveito. E, o que não existe, deve ser
criado, ou antes, percebido como natural e potencialmente
existente...
sábado, 11 de agosto de 2012
[Notícia] Taiwan celebra primeira cerimônia budista de casamento gay
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http://g1.globo.com/mundo/noticia/2012/08/taiwan-celebra-primeira-cerimonia-budista-de-casamento-gay.html
Lésbicas se casaram
depois de sete anos de namoro.
Elas esperam que
cerimônia simbólica ajude a legalizar esse tipo de união.
Taiwan celebrou neste
sábado (11) a primeira cerimônia budista de casamento gay. As
noivas You Ya-ting e Huang Mei-yu, de 30 anos, namoraram por sete
anos antes de decidirem se casar no templo em Taoyuan, no nordeste de
Taiwan.
O casal disse esperar
que essa cerimônia, simbólica, ajude a fazer de Taiwan o primeiro
local na Ásia a legalizar casamentos de pessoas do mesmo sexo.
Confiram o vídeo e as
fotos no link original:
http://g1.globo.com/mundo/noticia/2012/08/taiwan-celebra-primeira-cerimonia-budista-de-casamento-gay.html
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domingo, 15 de julho de 2012
Espiritualidade e Preconceito
Por Valéria Nagy
Conhecimento espiritual. Este recurso da capacidade humana está além da religião, afinal, antes de existirem as religiões, já existia a espiritualidade.
Conhecimento espiritual. Este recurso da capacidade humana está além da religião, afinal, antes de existirem as religiões, já existia a espiritualidade.
"O conhecimento espiritual é a análise das experiências ou das vivências que são estimuladas por forças que não podem ser percebidas pelos sentidos físicos comuns." (blog O Terceiro Testamento)
Concordo. E, isso não tem nada a ver com Deus e diabo, e nenhuma religião. A espiritualidade, em sua essência, simplesmente é. Doutrinas e dogmas são criações puramente humanas. E, como arranjos humanos, tudo o que nelas contêm são contaminadas pela razão humana. Porém, o espírito já encarna com a sabedoria que carrega. Acabam por ser pessoas com valores sólidos e opiniões fortes, sem deixar-se levar pelas imposições sociais e crenças passadas de geração em geração.
Portanto, aquele que detém o conhecimento
espiritual, livre de dogmas e doutrinas, e domina esse conhecimento, não pode
jamais ser portador de preconceitos quanto às relações humanas e a existência,
pois, este é obrigado a compreender a Lei Divina por completo, e o significado
real do Amor e da felicidade, sem misturar romantismo e ficção. Aquele que se
diz espiritualizado, mas tem preconceitos, de espiritualizado nada tem, pois
carrega em si as crenças sociais incutidas no seu âmago desde a tenra idade.
Ora, no muito, podemos considerar este como alguém que possui estudo sobre o
tema, mas não como detentor de conhecimento.
A espiritualidade tem que livre de preconceitos
e crenças sociais, pois o Amor de Deus ou da Criação não admite preconceito de
nenhuma espécie, mas sim a tolerância e o respeito.
Paz Profunda a todos!
Paz Profunda a todos!
quinta-feira, 28 de junho de 2012
A Bíblia é Homofóbica? (Um anti-contra-argumento)
Por Paulo Stekel
Sobre o autor
Este artigo, a despeito
de seu subtítulo, pretende ser um complemento e uma contribuição
ao debate mais do que algum tipo de contestação aos dois artigos
anteriores publicados neste blogue com o mesmo título (os quais
recomendamos que se leia antes do nosso):
O artigo de João
Marinho:
http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com.br/2012/06/biblia-e-homofobica.html
O artigo de Walter
Silva:
http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com.br/2012/06/biblia-e-homofobica-um-segundo.html
Um argumento pretende
defender uma ideia lançando mão de algumas premissas iniciais. No
caso em questão, consideramos como argumento a ideia de que a Bíblia
é homofóbica.
Um contra-argumento ou
retribuição é uma objeção a uma objeção, podendo ser usado
para rebater uma objeção a uma premissa. Ele pode pretender lançar
dúvida sobre a veracidade de uma ou mais premissas iniciais de um
argumento, ou mostrar que os argumentos iniciais não se seguem a
suas premissas de maneira válida, ou pode dar pouca atenção às
premissas e simplesmente tentar demonstrar a verdade de uma conclusão
incompatível com o que é estipulado no argumento inicial. No caso
em questão, o contra-argumento é a ideia de que apenas partes da
Bíblia são homofóbicas, enquanto outras parecem enaltecer a
homo-afetividade (casos Davi-Jônatas, Rute-Noemi).
Com o que chamamos de
anti-contra-argumento pretendemos lançar uma terceira ideia: a de
que a Bíblia não é um texto coeso, de que entre o Antigo e o Novo
Testamento há muitas contradições, de modo que querer defini-la no
seu todo como sendo homofóbica ou não-homofóbica é esquecer que a
homofobia depende mais da interpretação que se a dá HOJE.
Se se lhe dá uma
interpretação literalista, conectada de modo radical a um momento
histórico (o levítico-deuteronomista, por exemplo) e sem qualquer
recontextualização para com o nosso tempo atual, isso pode ser
entendido como uma interpretação homofóbica.
Por outro lado, se se
lhe dá uma interpretação contextualizadora e moderna, que
considera as mudanças históricas dentro do próprio texto bíblico
(as mudanças de costumes e aplicação de leis entre o Antigo e o
Novo Testamento, por exemplo) e as adaptações do homem ao longo do
tempo, bem como os novos conceitos biológicos, sociais e
tecnológicos, isso pode ser entendido como uma interpretação
não-homofóbica e naturalmente inclusiva.
João Marinho no texto
que abriu este debate deixou claro que mesmo após o surgimento da
Teologia Inclusiva a homofobia dentro do texto bíblico não pode ser
maquiada: “Mesmo com a teologia inclusiva e supostas passagens
pró-homossexualidade, não devemos maquiar a homofobia e demais
preconceitos de certos textos bíblicos. (…) Na verdade, a questão
do embate entre as diferentes formas de teologia inclusiva e as
vertentes mais conservadoras, para mim, é mais profunda do que
escolher um lado ou outro.”
Com certeza. E, ao
termos dividido acima a interpretação bíblica entre a literalista
e a contextualizadora, não estamos falando, no caso da segunda, em
Teologia Inclusiva. Estamos falando em uma interpretação
naturalmente inclusiva. Qual a diferença? No caso da Teologia
Inclusiva, frequentemente, sua consequência é a criação de
“igrejas” alcunhadas de “inclusivas” que nem sequer são
aceitas pela maioria dos grupos cristãos como sendo igrejas cristãs.
Já, uma interpretação naturalmente inclusiva deveria estar
disponível em todos os grupos cristãos, o que seria muito mais
producente para a inclusão da pessoa LGBT que escolheu para sua vida
religiosa o Cristianismo.
Provavelmente o
surgimento das Igrejas Inclusivas tenha se dado pela resistência dos
grupos cristãos existentes até então em se permitirem a uma
interpretação contextualizadora como descrita acima. Para alguns,
incluindo muitos gays cristãos, tais Igrejas Inclusivas são uma
aberração dentro do Cristianismo, já que este deveria acolher a
todos sem distinção, sem preconceito e sem demonização. Para
outros, elas são algo legitimamente cristão, embora o texto de que
se valem apresente dificuldades exegéticas consideráveis no caso do
tema homossexualidade e homo-afetividade. Em nosso
anti-contra-argumento dizemos que tais Igrejas são um mal necessário
enquanto a inclusão do indivíduo LGBT precisa ser algo “negociável”
com relação à maioria cristã.
Walter Silva, no
segundo artigo desta polêmica, escreveu algo aparentemente óbvio,
mas que não custa relembrar, dada a sua gravidade: “(…)
questionar se a bíblia é homofóbica pode parecer mesmo uma grande
ingenuidade, quando não uma pilhéria grotesca.”
É o que parece. E,
muitos comentários recebidos pelos dois artigos até aqui evidenciam
exatamente esta certeza: a de que a Bíblia é homofóbica.
Mas, João Marinho, ao
citar Davi e Jônatas, já havia argumentado: “Agora, porém,
assumamos que realmente tenha havido um relacionamento gay entre Davi
e Jônatas, que a história contada seja essa – uma homofilia
bíblica, em vez de seu oposto, a homofobia. Isso descartaria a
existência da mesma homofobia na Bíblia?
Não é porque os
livros de Samuel, Reis e Crônicas exaltam o relacionamento entre
Davi e Jônatas e ambos trocaram declarações carinhosas que o
Levítico e suas injunções a certas práticas homoeróticas deixam
de existir.”
Realmente, não.
Contudo, há uma polarização moderna evidente quando os teólogos
inclusivos tendem a argumentar (conforme o artigo de João Marinho)
que “a Bíblia não é, ou talvez não seja, toda homofóbica
classicamente falando, como os cristãos conservadores tanto gostam
de retratá-la” e os teólogos conservadores dizem que “a Bíblia
não é nada homofóbica”.
Para João Marinho “o
que é producente, portanto, é tomar a Bíblia pelo que ela é: um
livro histórico-religioso, com um sem-número de contradições,
inclusive com relação à homossexualidade”. Isso nos leva ao
terceiro argumento: a Bíblia está desconectada de nossa realidade
moderna exatamente por ser um livro histórico-religioso escrito ao
longo de milhares de anos. Isso explica as inúmeras contradições
que apresenta no tocante a vários assuntos.
Um dos argumentos mais
usados pelos defensores de Levítico para atacar os homossexuais é o
de que, segundo estes, não apenas o Antigo Testamento condena os
atos homossexuais, mas também o Novo Testamento. As demais leis
judaicas de Levítico e Deuteronômio que não aparecem no Novo
Testamento teriam sido “abrandadas” pelo Cristianismo, como as
proibições alimentares, por exemplo. Mas, como Coríntios ataca os
gays, nada feito. Será? A posição inferior da mulher diante do
marido, seu status de propriedade do homem, de que deve calar-se,
etc, aparece em ambos os Testamentos da mesma forma que as críticas
aos eunucos, efeminados e sodomitas. Contudo, qual cristão hoje
imagina dizer para sua mulher manter-se calada numa conversa porque
Deus assim manda na Bíblia? A misoginia foi “abrandada”, mas a
homofobia não? Conveniências? Talvez. Mas, que muitos cristãos
machistas gostariam de poder calar suas mulheres em público sob a
autoridade bíblica, ah, isso sim!
O que fazer então?
Continuar cristão gay em meio a homofóbicos, aderir a Igrejas
Inclusivas ou deixar de ser cristão? João Marinho: “(...) não
posso esperar que todos se tornem ateus apenas por serem LGBTs
(lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais), quando eu
mesmo, por sinal, não sou.”
Não há necessidade de
gays cristãos deixarem de ser cristãos. Por que? Porque todo e
qualquer trecho bíblico sobre homossexualidade está sujeito a
interpretações diversas. E, isso tem um motivo simples, mas
crucial: na época bíblica ninguém tinha consciência de orientação
sexual, de que uma delas é a homossexual, de que isso é natural e
de que não pode ser mudada. Se tivessem tal consciência, as
orientações LGBT estariam na conta do que foi criado por Deus e não
estariam sujeitas às leis mosaicas e deuteronomistas, que são mais
tentativas de regrar a vida privada dos israelitas e judeus que
preceitos divinos universais. Em suma, não são pecado, mas
interdições, a maioria delas, inclusive, dirigidas aos
heterossexuais. E, interdições, não levam ao Inferno. Apenas o
pecado não remido pelo arrependimento leva ao Inferno, segundo as
crenças cristãs.
Como bem pontuou Walter
Silva, na época bíblica nem sequer havia a consciência de existirem heterossexuais e homossexuais. Só se tratava do sexo como
entre macho e fêmea. Não havia a diferenciação entre sexo
biológico, gênero, identidade e orientação sexual. Para os
antigos semitas tudo se resumia no macho-fêmea, e pretendiam que era
assim também no reino animal. A Ciência moderna colapsou tal ideia
ao descobrir animais andróginos, hermafroditas, e espécies que
podem até mudar de sexo sob certas circunstâncias. Com que animais
estas espécies se alojaram na Arca de Noé???
O que quero deixar
claro com meu anti-contra-argumento é que, antes de alcunharmos o
livro inteiro chamado “Bíblia” como homofóbico, devemos
declarar que a Bíblia ignora tudo o que sabemos hoje sobre a
sexualidade humana. Então, a Bíblia é ignorante quanto à pessoa
LGBT e, por tal contraste com nossa realidade atual, figura como
homofóbica. Além disso, no momento em que fanáticos
preconceituosos desvirtuam os textos e traduzem termos antigos com
palavras modernas – como quando se traduz “sodomita” por
“homossexual” -, a ideia “mastigada” e falaciosa lançada
para a maioria é a de que a Bíblia condena os gays.
Mas, como pode um texto
que sequer concebe a existência de gays condená-los? Tudo no texto
bíblico é escrito numa ótica homem e mulher, macho fêmea. Ele
não concebe sexo entre homens além da noção de algo não-natural
que deve ser interdito; não concebe o amor entre pessoas do mesmo
sexo que não seja o amor paternal-filial-fraternal pois não
acredita que tal amor seja possível em sua visão normativa
homem-mulher; não concebe a união/casamento entre pessoas do mesmo
sexo porque não percebe uma pessoa que mantém relações com outra
do mesmo sexo como alguém que possa amar esta outra pessoa e desejar
viver toda a vida com ela de modo equivalente a um homem e uma
mulher.
Este argumento parece
simples, mas tem implicações importantes já apresentadas por
Walter Silva ao citar John Richard Boswell, autor do livro
“Cristianismo, tolerância social e homossexualidade’’: "(…)
Boswell foi celebrado ao expor uma interpretação revolucionária,
argumentando que a igreja no início da sua trajetória e ao longo de
uma parte do medievo, conviveu com a homossexualidade de forma pouco
conflituosa, possibilitando inclusive o emergir de uma subcultura
gay, expressando-se através de primorosos poemas e cartas eróticos
de amor e amizade do mesmo sexo, escritos por bispos e clérigos
cristãos.”
Isso demonstra o que
dissemos sobre a ignorância bíblica a respeito da pessoa
homossexual! Tal ignorância, na Idade Média, serviu para uma
evidente tolerância da Igreja Católica para com pessoas com
tendências ao amor pelo semelhante, o mesmo sexo, enquanto que a
mesma ignorância hoje tem servido aos setores fundamentalistas que
traduzem a seu gosto o texto bíblico para condenar os LGBTs. Se isso
não fosse verdade, não teríamos várias Igrejas Cristãs
protestantes que não se consideram “inclusivas” aceitando LGBTs
entre seus fieis, ordenando sacerdotes gays e celebrando casamentos
entre homossexuais. É o caso da Igreja Luterana nos EUA (no Brasil,
infelizmente, não é bem assim), da Igreja Presbiteriana (também
nos EUA), da Igreja Anglicana, da Igreja Episcopal dos Estados
Unidos, de setores minoritários da Igreja Batista e Metodista, entre
outras.
Walter Silva: “De
modo contraditório os literalistas afirmam que Deus não reconheceu
a categoria dos homossexuais (então qual o sentido de dizer que Deus
não condena a pessoa gay?), que Deus criou somente o “macho’’
e a “fêmea’’; indivíduos gays, portanto são machos e fêmeas
que se recusam a cumprir com os desígnios de sua natureza verdadeira
(heterossexual).”
A questão é mais
ampla: o Deus bíblico não cita “gays”, “homossexuais” ou
“LGBTs” simplesmente porque desconhece sua existência. Mas,
dirão os beatos, como pode Deus desconhecer o que hoje conhecemos?
E, dirão os teólogos beatos, como poderia Deus reconhecer o que não
existe e é uma doença, uma aberração e uma imoralidade? E, dirão
os 10% da humanidade que Deus “desconhece” ou que pensa não
existirem, se Deus nos desconhece ou se cala sobre nós porque não
existimos, por que seus adeptos colocam na boca do Criador uma
condenação que não faz sentido, dados os argumentos? Alguns
setores protestantes norte-americanos entenderam isso (anglicanos,
luteranos, etc.) e deixaram de adotar posturas anti-gays. Quando os
cristãos brasileiros vão acordar? Quando deixarão de ouvir o
vociferante e infernal discurso de Malafaia, Magno Malta, Marco
Feliciano e legião, e passarão a incluir os LGBTs em suas vidas sem
ódio, sem preconceito e sem demonização?
Quando dizemos que a
Bíblia é homofóbica, estamos alimentando um discurso falso de que
todo o cristão e de que todos os grupos cristãos são homofóbicos
e contra os direitos gays.
Quando dizemos que a
Bíblia não é homofóbica, pois ama o gay mas condena o ato
homossexual, estamos alimentando a hipocrisia violenta daqueles
cristãos que se aproveitam deste argumento para condenar os gays ao
Inferno e para tentar impedi-los de conquistar direitos básicos.
Porém, quando dizemos,
equilibrando as coisas:
1 – Que a Bíblia
desconhece as noções modernas de sexualidade, orientação sexual,
identidade de gênero, heterossexualidade, homossexualidade e
bissexualidade;
2 – Que a Bíblia
condena comportamentos sob a perspectiva de que sejam efetuados por
pessoas vistas dentro do padrão macho-fêmea, sem alternativa
diferente;
3 – Que, mesmo a
despeito de tais condenações, a Bíblia deve ser interpretada,
contextualizada e tornada “viva” na modernidade, sem os arcaísmos
embutidos;
Quando dizemos tudo
isso, fica claro que não é a Bíblia que é homofóbica – por uma
impossibilidade histórica de sê-la –, mas os que a adotam hoje
para fazer uma interpretação arcaica, desconectada da vida humana,
dos sentimentos humanos, da realidade interna do ser humano, trabalho
este que tem sido feito pela Psicologia, mas no qual a Teologia
moderna apenas engatinha.
Contudo, é certo que
se a Bíblia não é homofóbica por ser antes ignorante da pessoa
LGBT, também não é um livro inclusivo pelo mesmo motivo!
O Novo Testamento
apresenta uma noção um pouco menos ignorante da existência de uma
alternativa à visão do padrão macho-fêmea (baseado na imprecisa
observação dos animais pelos antigos) e homem-mulher (baseado
unicamente nos gêneros evidentes física e mentalmente) ao
referir-se aos “eunucos de nascimento”, como brilhantemente
esclareceu Walter Silva em seu artigo: “(…) a Bíblia repudia a
afeminação não natural nos homens heterossexuais, o sexo
homossexual com prostitutos sagrados e a disposição de alguns
heterossexuais para a luxúria ocasional com o mesmo sexo.”
A tendência “feminina”
em eunucos era conhecida e aceita, portanto. O que não era aceito –
ou conhecido, já que se desconhecia também a noção de orientação
sexual desconectada de tendências masculinas-femininas – era um
homem não-feminino que se desse ao mesmo sexo, como se “feminino”
fosse. Novamente, uma tentativa sutil de encaixar mesmo os eunucos no
padrão macho-fêmea, homem-mulher. Sem contar que a mulher no ato
sexual, na visão judaico-cristã, é considerada como “submetida”
ao homem, e não em caráter de igualdade, como hoje em dia. Então,
como se considerada o submetido como inferior, assim também eram
considerados, como as mulheres, os eunucos, os homens femininos e os
prostitutos sagrados. Nesta noção machista-patriarcal é
inadmissível um homem não-feminino deitar-se com outro
não-feminino...
Já naquela época
bíblica, portanto, se percebe uma tentativa de conter o fator gay
(ainda nem considerado existente como hoje) dentro de uma categoria
aceitável (o eunuco de nascimento), em oposição à não aceitável
(o prostituto sagrado).
Atualmente, quanto ao
tema, vemos radicalismos de ambos os lados: do lado fundamentalista,
uma tentativa de “eugenia social”; do lado de alguns LGBT que não
gostam de religião, uma tentativa de desqualificar todo e qualquer
valor da espiritualidade para a vida LGBT. Extremos nunca se
entendem. Podem se tocar, mas nunca se entendem.
O que desejam os
“patrulheiros da moral e dos bons costumes” de origem cristã?
Estes “patrulheiros” desejam que os gays voltem aos guetos, que
amem seus iguais às escondidas, sem postular direitos, casamento,
adoção, benefícios iguais aos dos heterossexuais... Querem, assim,
promover no Brasil uma verdadeira eugenia social dos homossexuais aos
moldes da proposta nazista? Jamais o permitiremos!
Quando uso o argumento
da eugenia social contra gays, muitos dizem que essa comparação é
um absurdo. Mas, não é. A eugenia (termo cunhado em 1883 por
Francis Galton), significa “bem nascido” e é o estudo dos
agentes sob o controle social que podem melhorar ou empobrecer as
qualidades raciais das futuras gerações seja física ou
mentalmente. Ou seja, melhoramento genético. Hitler se baseou nisso
ao imaginar que o arianos loiros heterossexuais eram mais puros e
superiores aos judeus, negros, ciganos, deficientes e homossexuais.
Aplicando isso à noção
de eugenia social contra gays, ela significaria a discriminação de
pessoas por categorias sexuais, por orientação sexual, levando
apenas a uma relativa aceitação dos gays mais “comportados”,
mais semelhantes aos padrões heterossexuais, que seriam melhor
aceitos na sociedade, mas nunca completamente integrados, incluídos.
Contudo, continuariam sendo considerados não-aptos para a
reprodução, como se, afinal, todos os gays e lésbicas fossem
estéreis!!! Segundo esta eugenia social, os melhores gays seriam os
do armário, os caladinhos, os que aceitam a ofensa, a demonização
e a violência, de modo a nem serem percebidos pela sociedade e não
constituírem qualquer ameaça a “família cristã”. Ledo engano!
Não se joga para debaixo do tapete cerca de 10% da humanidade (se
não for mais!) como Hitler tentou fazer com os que ele considerava
inferiores.
Para finalizar, a
Bíblia deve ser lida e interpretada como um livro antigo, escrito
por muitos autores ao longo de milhares de anos e que não trata de
todos os assuntos que interessam à vida dos fieis com a riqueza de
detalhes e nos termos modernos, como se gostaria. É um livro sagrado
– como todos os demais, aliás – para ser estudado, esmiuçado,
esquadrinhado, e não usado como arma contra outros seres humanos por
pessoas que, em geral, não entendem o que está ali escrito.
A propósito, tenho
visto pastores semi-analfabetos vomitando preconceitos como certezas
teológicas enquanto ouço dúvidas profundas e pertinentes de
teólogos com décadas de estudos. Para os primeiros, estes
analfabetos de Deus que se consideram Seus intérpretes, deixo alguns
trechos do Livro da Sabedoria, atribuído a Salomão:
“O Senhor de todos
não fará exceção para ninguém, e não se deixará impor pela
grandeza, porque, pequenos ou grandes, é ele que a todos criou, e de
todos cuida igualmente; mas para os poderosos o julgamento será
severo.
Resplandescente é a
Sabedoria, e sua beleza é inalterável: os que a amam, descobrem-na
facilmente.
Os que a procuram
encontram-na. Ela antecipa-se aos que a desejam.
Quem, para possuí-la,
levanta-se de madrugada, não terá trabalho, porque a encontrará
sentada à sua porta.
Fazê-la objeto de seus
pensamentos é a prudência perfeita, e quem por ela vigia, em breve
não terá mais cuidado.
Ela mesma vai à
procura dos que são dignos dela; ela lhes aparece nos caminhos cheia
de benevolência, e vai ao encontro deles em todos os seus
pensamentos, porque, verdadeiramente, desde o começo, seu desejo é
instruir, e desejar instruir-se é amá-la.
Mais ágil que todo o
movimento é a Sabedoria, ela atravessa e penetra tudo, graças à
sua pureza.
Embora única, tudo
pode; imutável em si mesma, renova todas as coisas. Ela se derrama
de geração em geração nas almas santas e forma os amigos e os
intérpretes de Deus, porque Deus somente ama quem vive com a
sabedoria!”
(Livro da Sabedoria,
VI. 7-8, 12-17; VII. 24, 27-28)
Sobre o autor
Paulo Stekel é jornalista, escritor, músico, poliglota, especialista em religiões, tradições espirituais e línguas sagradas. Ativista LGBT focado na relação entre homofobia e religião, é o criador do Movimento Espiritualidade Inclusiva e possui quase uma centena de artigos sobre espiritualidade, orientação sexual, homofobia religiosa e espiritualidade inclusiva. Contatos: espiritualidadeinclusiva@gmail.com
segunda-feira, 18 de junho de 2012
Entrevista polêmica com Paulo Stekel para o blogue Entrevistas & Debates
Por Espiritualidade Inclusiva (cfe. postado originalmente em http://blogentrevistas.blogspot.com.br/2012/06/paulo-stekel.html)
Nota de Espiritualidade Inclusiva: A entrevista foi concedida por Paulo Stekel à jornalista Sophia Sheimberg, do blogue "Entrevistas & Debates". Sua repercussão está valendo um debate entre Stekel e o autor do blogue "Críticas & Pensamentos", Hallison Liberato, que tem posicionamento oposto quanto aos LGBT. O debate irá ao ar nos próximos dias.
Paulo Stekel
Nome: Paulo Stekel
Blog: http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com
Religião: Budismo
Profissão: Músico, escritor, jornalista, prof. de línguas sagradas
Ideologia: Democrática
Introdução: Por Paulo Stekel
Paulo Stekel é escritor sobre espiritualidade, poliglota especializado em línguas antigas e sagradas, jornalista e músico. Paulo tem como principal atividade a música, sendo músico dos estilos new age/ambient/eletrônico. Nasceu em Santa Maria (Rio Grande de Sul - Brasil), em 1970. Filho de músico, começou a cantar aos 05 anos. De 1985 a 2005, Stekel voltou-se para outras áreas: literatura, jornalismo, línguas antigas.
Em 2005, ano em que morou em Brasília (DF), Stekel estudou canto tenor e sentiu que este era o momento de transformar tudo o que pesquisara por 20 anos em um trabalho "artístico-curativo" ou, então, de "entretenimento relaxante". Pensou em, aos poucos, aliar vários estilos da música eletrônica (New Age, Ambient, Trance, Progressive, Relax, etc.) a dois conceitos novos: o da música canalizada por inspiração e o da codificação de mantras hebraicos da Cabala e também de outras línguas sagradas (Latim, Sânscrito) em música. No caso dos mantras codificados, utilizaria as relações das letras sagradas com as notas musicais da escala cromática.
Em 2008, Stekel iniciou o projeto do primeiro álbum, "Qadosh". De lá para cá, produziu oito álbuns e mais de dezenas de singles, além de algumas trilhas sonoras para sites, blogues e web-séries.
Álbuns lançados: Qadosh (Música canalizada & Mantras codificados) – 2008; Galaktika (an internal space travel) – 2009; Fluindo Reiki... Natureza – 2010; Fluindo Reiki... Mantras – 2010; Stekel (remixes & new song 2010) – 2010; Sacred Voices – 2010; The Planets (for XXIst Century) – 2011; Indigo (Cosmic Sounds for Activation) – 2011.
Além do trabalho musical, Stekel também escreveu nove livros sobre Cabala, línguas sagradas e espiritualidade: Curso de Cabala (2 volumes); Curso de Sânscrito (2 volumes); Elohê Israel – Filosofia Esotérica na Bíblia; Projeto Aurora – retorno a linguagem da consciência; Santo e Profano – Estudo Etimológico das Línguas Sagradas; Deuses e Demônios – verdades inauditas e mentiras anunciadas sobre os anjos; A Alma da Palavra.
Stekel também é ativista LGBT, tendo escrito mais de 60 artigos sobre o tema, especialmente envolvendo espiritualidade, religião e homofobia religiosa. Foi o autor da coluna “Impressões da Diversidade” no blogue “Gay Expression”. Tem 41 anos, vive em união estável há dez anos e é residente da cidade Canoas – RS.
Os artigos escritos por Paulo Stekel giram em torno da sexualidade e da religião, aliando experiências de sua vida visando promover a desconstrução dos velhos “clichês gays” que fazem com que as pessoas vejam os homossexuais como seres estranhos e não como seres humanos normais. Seus textos, a partir de um olhar crítico, geram percepções sobre a liberdade de expressão sexual, a vida diversa dos gays e sua relação com religião, ciência, política, arte, vida social e direitos humanos.
Atualmente administra e escreve para o blogue “Espiritualidade Inclusiva” e é o proponente e coordenador geral do Movimento Espiritualidade Inclusiva, criado em 2011.
BLOG / SITE / IDEIAS / IDEOLOGIA
Só se forem religiosos para serem considerados fundamentalistas
Qual o objetivo do seu blog?
O blogue http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com é o principal canal de comunicação do Movimento Espiritualidade Inclusiva com o mundo. Visa apresentar artigos sobre visão inclusiva nas diversas formas de espiritualidade; denúncias de preconceito religioso e fundamentalista contra LGBTs; dicas de blogues, sites, filmes e documentários; tradução de artigos; divulgação de eventos LGBT e os inclusivos; notícias do mundo LGBT; decisões legislativas e debates políticos relativos aos direitos LGBT; temas culturais relevantes.
Os gays se tornaram fundamentalistas?
Não. Só se forem religiosos para serem considerados fundamentalistas, o que não é o caso. Afinal, como escrevi em um artigo, o termo “fundamentalismo” se refere a movimentos (religiosos, ideológicos, políticos, econômicos, étnicos, etc.) cujos adeptos aderem de modo muito estrito aos princípios fundamentais. De modo pejorativo, o termo muitas vezes se refere a grupos religiosos intransigentes quanto aos princípios de suas fés ou a movimentos étnicos extremistas com motivações ou inspirações apenas nominalmente religiosas. No caso, os gays podem pertencer a quaisquer religiões, ideologias, partidos políticos, visões econômicas, grupos étnicos, etc. O “ser gay” em si não tem a ver com “princípios fundamentais” porque não é uma ideologia ou crença. Se é gay, e pronto. Então, não podemos dizer que os gays tenham se tornado fundamentalistas no sentido de serem gays. Gays são seres humanos, e isto está acima de qualquer fundameno, fundamentalismo ou ideologia. Todos merecem o mesmo respeito.
Por que chamar quem não concorda com o comportamento homossexual de homofóbico?
Não se pode “concordar” com algo ou “discordar” de algo que não constitui uma crença ou ideologia, mas simplesmente o como alguém é em seu íntimo. Um ser humano é muito mais do que seu comportamento sexual, seja hétero, homo ou bissexual. Reduzi-lo a sua sexualidade para inferiorizá-lo é uma atitude igual ao que padeceram as mulheres e os negros no passado recente. Considerando que homofobia é uma aversão, um ódio e uma intolerância a LGBTs que vem a se manifestar através da violência moral ou física contra esta minoria (cerca de 10 a 20% da humanidade), quem manifesta tal aversão, ódio ou intolerância que extrapola um simples “pensar” e exterioriza-se em atos de inferiorização, deve muito corretamente ser considerado “homofóbico”.
O que caracteriza alguém como homofóbico?
Como disse antes, quando a coisa extrapola o simples “pensar sobre”. Comparemos: todos sabemos que a lei anti-racismo impede que qualquer pessoa manifeste racismo abertamente. É crime inafiançável. Contudo, a lei não legisla sobre o pensamento íntimo de cada um. Há pessoas racistas em seu íntimo que, por não manifestarem isso publicamente e de modo a atentar contra a dignidade dos negros, não podem ser enquadradas na lei. Ou seja, a lei anti-racismo não acabou com os pensamentos racistas, embora coíba ações racistas. Com a homofobia é a mesma coisa, com a diferença de que ainda não temos uma lei anti-homofobia. Um homofóbico é alguém que não apenas pensa de modo aversivo com relação a homossexuais, mas que leva essa aversão a atos contra homossexuais. Este é o parâmetro para definirmos um homofóbico.
Vivemos num país livre. Criticar o comportamento homossexual faz parte dessa liberdade no seu ponto de vista?
Se a lei permitir criticar o “comportamento” heterossexual na mesma base, sim. Haverá uma polarização, e aí é que reside o perigo. Não podemos pensar que se tem todo o direito de criticar “comportamentos” não heteronormativos, mas ao criticarmos a própria heteronormatividade sermos acusados ignorantemente de estarmos tentando impôr nossa condição a outros. A homossexualidade, muito mais que um “comportamento”, é uma orientação. Não é opção, decisão consciente nem algo que se possa “curar”. É tão natural quanto a heterossexualidade.
SOCIEDADE / EDUCAÇÃO / CULTURA
Não existiu um projeto denominado “kit gay”. Este nome foi alcunhado de forma cafajeste pelos opositores cristãos fundamentalistas, os covardes membros da bancada evangélica
Há pouco tempo houve um projeto denominado “kit gay” que colocava material de apologia gay dentro de sala de aula para o público infanto-juvenil. Qual a sua opinião sobre esse material?
Não existiu um projeto denominado “kit gay”. Este nome foi alcunhado de forma cafajeste pelos opositores cristãos fundamentalistas, os covardes membros da bancada evangélica, a mesma que chafurda na lama com denúncias de corrupção, já que dizem ser de Deus, mas aliam-se ao Diabo na política corrupta de nosso país. O objetivo original do projeto era o de incluir os LGBT no ambiente escolar, onde são frequentemente vítimas de homofobia e bullying, com a consequente evasão escolar. Para isso, os alunos e professores deveriam conhecer os “diferentes”, os diversos da heteronormatividade corrente. Sem conhecê-los, não há como sequer respeitá-los, quanto mais incluí-los com todos os direitos de qualquer cidadão heterossexual. Portanto, não houve apologia alguma. Esta interpretação errônea foi criada pelos opositores do projeto.
Há preconceito contra o homossexual hoje no Brasil? Explique.
Se não houvesse preconceito contra o homossexual e todos os membros da comunidade LGBT no Brasil, os 112 direitos básicos que lhes são negados já teriam sido corrigidos, entre eles: não podem casar no civil; não adotam sobrenome do parceiro; não somam renda para alugar imóvel; não participam de programas do Estado vinculados à família; não têm a impenhorabilidade do imóvel em que o casal reside; não têm garantia de pensão alimentícia em caso de separação; não têm garantia à metade dos bens em caso de separação; não adotam filhos em conjunto e não podem adotar o filho do parceiro; não podem ser inventariantes do parceiro falecido; não têm garantida a permanência no lar quando o parceiro morre; não acompanham a parceira no parto; não podem ser curadores do parceiro declarado judicialmente incapaz; não podem declarar parceiro como dependente do Imposto de Renda; não têm suas ações legais julgadas pelas varas de família; não têm direito de converter união estável em casamento; não têm direito a assistência alimentar; não têm direito a pedir o afastamento temporário do companheiro da moradia do casal; não têm direito de eximir-se da obrigação de depor como testemunha contra o companheiro; não tem direito a não produzir prova contra o companheiro militar; entre outros. Atualmente, alguns destes direitos vem sendo assegurados na justiça e não por lei!
Fora isso, se não houvesse preconceito contra o homossexual no Brasil, a quantidade de assassinatos cometidos contra LGBTs em nosso país não teriam o requinte de crueldade que vemos, frequentemente com referências à sexualidade da vítima. A cultura do preconceito contra gays está arraigada na sociedade brasileira de um modo tal que parece perfeitamente normal fazer chacota, malhar, fazer piadas, denegrir a imagem e rebaixar a dignidade dos mesmos sem nem se perceber. O mesmo se fazia com os negros desde o período colonial, só tendo sido relativamente coibido a partir da lei anti-racismo. O mesmo se fazia com as mulheres até bem pouco tempo. Os gays, agora, parecem sofrer um preconceito que é um misto de racismo e misoginia, pois são considerados inferiores (como os misóginos consideram as mulheres) e uma categoria abaixo dos “normais” heterossexuais (como os racistas consideram os negros do ponto de vista étnico-racial).
Um dos entrevistados do meu blog escreveu sobre o “ismo” no final de uma palavra demonstrando que a palavra terminada em “ismo” não se trata, necessariamente, de doença e eu concordei com ele. Em várias partes do seu blog encontrei a palavra “cristianismo”. Se homossexualismo é doença, dizer que os religiosos se encaixam no cristianismo não seria também uma forma de preconceito?
Isso é desconhecer a Língua Portuguesa, o que é deplorável num país em que a educação claudica e se definha cada vez mais. O sufixo nominal “-ismo” serve para denominar doutrina, escola, teoria, sistema, modo de proceder ou pensar, ação: socialismo, capitalismo, comunismo, romantismo, ostracismo, realismo, anarquismo, terrorismo, exorcismo, homossexualismo. Então, o termo “homossexualismo” refere-se a uma ação e, assim, foi considerado doença pela antiga Psiquiatria, pois se referia à ação de se fazer sexo com alguém igual, isto é, do mesmo sexo. Pela mesma lógica, “cristianismo” é a ação de se fazer parte de uma doutrina religiosa que tem Cristo como o centro. Simples!
A cultura brasileira expressa que o homossexual é promíscuo. As paradas gays que ocorrem no Brasil e que são o maior meio de visibilidade dos homossexuais confirmam essa visão do brasileiro, basta procurar no youtube e no google. No carnaval a libertinagem é geral, tanto com homossexuais como heterossexuais. Os mesmos setores que criticam a devassidão no carnaval criticam também a devassidão nas paradas gays. Por que tentar mudar essa visão de parte da sociedade se é essa visão que os homossexuais oferecem a eles?
Como você mesmo evidenciou, se no Carnaval a libertinagem é geral, tanto com homossexuais como heterossexuais, a quem se deve atribuir a promiscuidade? A todos os seres humanos, sejam gays ou héteros? Se for assim, afirmar que homossexuais são promíscuos é um sofisma terrível. Da mesma forma, quem se prostitui nas ruas? Alguns heterossexuais e alguns homossexuais. Seria certo, neste caso, dizer que os seres humanos se prostituem ou nos referimos a alguns deles? Assim, podemos dizer que no universo homossexual há um pouco de tudo o que existe no universo heterossexual, e que generalizar apenas para o universo homossexual demonstra, ou ignorância, ou má intenção.
Se uma parcela de homossexuais vai às paradas gays, uma parcela muuuito maior não vai, e não se encaixa na proposta delas. A despeito de divergências entre os dois grupos, o que fica evidente é que toda a generalização é burra. A tendência de todo o moralismo é generalizar burramente!
Então, os homossexuais não são promíscuos, assim como os heterossexuais não são promíscuos. Mas, alguns homossexuais são promíscuos tanto quanto alguns heterossexuais o são.
Jair Bolsonaro lutou muito contra a aprovação da PL122 expondo todos os aspectos desse projeto de lei. Por que os gays querem uma lei específica se já se beneficiam das leis existentes como todo cidadão brasileiro?
Se nos beneficiássemos das leis existentes os 112 direitos que nos são negados estariam à nossa disposição sem precisarmos entrar na justiça e rezarmos para o processo não cair num juiz preconceituoso e fundamentalista. O mesmo disseram para os negros antes da lei anti-racismo, que também é uma lei específica e, hoje, contestada por quase ninguém, salvo os racistas. Por isso, precisamos de uma lei específica como a lei anti-racismo, a lei Maria da Penha, entre outras leis específicas de nossa legislação.
O Estado brasileiro é laico, mas não é ateu. Você concorda com a presença de religiosos na política brasileira?
O Estado brasileiro ser laico significa não ser nem teísta nem ateu. Significa simplesmente que o Estado não interfere na religiosidade de seus cidadãos, mas também não permite que a religião interfira no Estado, que deve governar para TODOS os cidadãos, independente da religião deles, ou do fato de não terem religião alguma, como no caso dos ateus. Neste caso, a política brasileira pode ter pessoas de quaisquer religiões ou de nenhuma, mas o que deve pautar as decisões políticas é o laicismo de estado (governar para todos) e a declaração dos direitos humanos.
Você concorda que toda sociedade precisa de moralidade?
Concordo, desde que possamos dar a chance da sociedade escolher sua moral de modo equânime. Por que devemos escolher uma moral especificamente cristã num país com diversas religiões? Concordo, desde que cada cidadão possa escolher sua moral – e, o faz, na base da liberdade religiosa constitucional -, mas sem impô-la a um outro cidadão por quaisquer meios, principalmente quando este professa outra religião ou nenhuma (no caso dos ateus), pois isso acaba com o princípio da isonomia e esfacela o estado laico. Portanto, moralidade impositiva, jamais!
A AIDS, desde o seu início, tem maior percentual de infecção nos gays. No Brasil, há campanhas direcionadas exclusivamente aos homossexuais. Há inclusive teorias que afirmam que os gays foram os disseminadores da doença como a vemos. O meio homossexual é um grupo de risco, embora o governo tenha retirado essa nomeação de “grupo de risco”?
O governo é quem teria que responder a essa pergunta, já que a arcaica noção de “grupo de risco” continua sendo apresentada mesmo após ter ficado claro que o que existem são “comportamentos de risco”, abrangendo heterossexuais, bissexuais e homossexuais.
Uganda, na África, é o país mais bem sucedido no combate à AIDS adotando uma política contra o homossexualismo e pela monogamia. Qual a sua opinião a respeito?
A pergunta foi mal-formulada e pode ser entendida como tendendo a levar a um sofisma quase nazistoide. Não foi o ataque aos gays em Uganda que diminuiu a infecção pelo HIV em Uganda e isso não é reconhecido pela Organização Mundial de Saúde. Esta mentira vil e tem sido afirmada pelos missionários cristãos e pelo governo daquele país há tempos e foi comprada em sua totalidade pelos missionários fundamentalistas brasileiros. Não esqueçamos que este país pretendeu varrer os gays de seu território do mesmo modo que Hitler quis varrer os judeus da face da terra por julgá-los responsáveis por tudo de ruim que a Alemanha passava na sua época. Além disso, monogamia não é garantia de não infecção, e é um juízo moral. Por que a infecção não é maior em países onde se adota a poligamia, como em repúblicas islâmicas?
RELIGIÃO
Jesus não ataca homossexuais em momento algum
Silas Malafaia é um grande combatente do movimento homossexual e com isso adquiriu mais admiradores e pessoas que se juntaram à sua causa contra os LGBT’s. Segundo ele, não faz críticas a pessoas envolvidas com a prática, mas a prática que envolve os gays. Toni Reis, um dos líderes do movimento homossexual o processou por criticar o movimento homossexual, no entanto, vemos gays abusarem da imagem da Igreja Católica como no exemplo da parada gay em São Paulo. Por que os gays podem criticar a religião mas a religião não pode criticar o homossexualismo?
Se a religião não estivesse podendo nos criticar, Malafaia já estaria preso há muito tempo. Os fundamentalistas deitam e rolam na crítica aos gays e o judiciário brasileiro é conivente com isso. A prova de que estão, sim, podendo criticar os LGBT à vontade sem qualquer ação em contrário do judiciário é exatamente o uso de imagens católicas na parada gay de São Paulo. Como assim? Simples e pérfido: o judiciário faz vistas grossas aos ataques que as comunidade LGBT recebe todos os dias de parte de pessoas como Malafaia, Bolsonaro, etc. Os organizadores LGBT da parada de São Paulo (não são o todo da comunidade LGBT) resolveram dar o troco para ver o que o judiciário faria. O que o judiciário fez? Simples, não quis cair na armadilha. Pois, se o judiciário se pronunciasse contra o que ocorreu na parada de São Paulo, estaria reconhecendo o embate e a coisa ia ficar mais feia, mas também mais equânime, com os dois lados podendo agora lutar na justiça em pé de igualdade. Poucos perceberam este detalhe “sutil”.
Há pouco tempo os gays perderam uma grande batalha que travaram contra o Pastor Silas Malafaia quando ele disse que a Igreja Católica tinha que descer de pau em cima dos homossexuais que profanaram as imagens sacras. O juiz que assinou o arquivamento do processo fez, inclusive, diversas críticas ao movimento homossexual dizendo até que quem deveria ser processado era quem profanou tais imagens. Qual a sua opinião a respeito?
Isso é a prova do que disse na resposta anterior: o juiz preferiu arquivar o processo contra Malafaia do mesmo modo que nenhum juiz se pronunciou em sentença contra o episódio das imagens católicas na parada gay de São Paulo. Na verdade, o judiciário está percebendo a palhaçada de Malafaia e dos seus, e está evitando dar pareceres definitivos para um dos lados, pois quando isso ocorrer, a coisa vai ficar muito feia, inclusive fora do Brasil, pois a imagem do país vai ser influenciada pela decisão. Ou o judiciário finalmente se pronuncia, ou equívocos dos dois lados vão continuar existindo.
Por que tentar fazer parte de um setor social (o cristianismo) que historicamente não aceita gays em suas fileiras? Não é uma maneira de forjar uma perseguição, já que outros grupos como comunistas na Igreja Católica (por exemplo) que são excomungados ou até mesmo quem não se coadune às regras que são necessárias aquele grupo?
Num país laico as pessoas têm o direito constitucional de pertencer a qualquer religião ou a nenhuma. Também têm o direito de que não se lhes exija nenhuma condição a mais por ser homossexual do que as que são exigidas de um heterossexual. Gays que querem ser cristãos estão no seu direito e, geralmente, atribuem o preconceito cristão aos cristãos, não à doutrina em si, que julgam mal-interpretada. Eu, particularmente, sou budista, e não tenho problemas em ser budista e gay, porque o Budismo não é uma religião que exclui LGBTs de suas fileiras. Já, o Movimento Espiritualidade Inclusiva é um movimento social que não apoia uma religião em particular em detrimento das demais. Não é um movimento cristão. É um movimento social laico que busca a inclusividade de todos no meio religioso de acordo com as bases de um Estado Laico.
Você diz em seu blog que se o Levítico fosse seguido à risca muita coisa precisaria ser mudada. No entanto, não vi você comentar que após o Levítico vieram outros profetas que modificaram algumas leis aplicadas aos hebreus, aliviando umas e endurecendo outras. Na cultura judaica há também o ensinamento oral, ou seja, a tradição. O homossexual está em pecado em todas elas. Por que criar uma interpretação diferente de uma interpretação que vem sendo feita há milhares de anos? Será que todos os profetas e rabinos, desde os tempos primeiros do judaísmo (milhares de anos) estão errados e alguns homossexuais que interpretaram agora estão certos?
Pois é. Algumas leis foram modificadas e outras não. Qual o critério? Critério de Deus ou critério dos homens? O ponto pacífico é que as religiões mudam, as prescrições religiosas mudam, e nada é tão estanque quanto se quer fazer parecer. Jesus não ataca homossexuais em momento algum, mesmo porque o termo “homossexual” é moderno. Naquela época não havia a noção da existência de orientações sexuais. Se pensava de modo reto em apenas uma versão de sexualidade, que é a macho-fêmea, homem-mulher. Não podemos culpar os antigos pelo desconhecimento, mas não podemos continuar em ignorância quando passamos a conhecer a realidade e a diversidade da formação da identidade sexual, da orientação e do gênero, conforme se tem demonstrado por inúmeras pesquisas científicas. Não se trata de quem está certo e quem está errado. Certa é a ciência à medida que vai desvendando os mistérios da sexualidade que os antigos sequer sonharam, embora se dessem na antiguidade às mesmas variações sexuais que nos damos hoje...
O Papa fala para os católicos. Os pastores falam para os evangélicos. Os rabinos falam para os judeus. Nenhum deles diz: “Saiam na rua e espanquem os homossexuais”. Pelo contrário, pedem orações por todos. Por que provoca-los dizendo que Cristo era homossexual se não há um só relato sobre práticas homossexuais em Jesus?
A rigor, não há provas históricas incontestáveis da existência nem de Jesus, nem do Buda, nem de Maomé, nem de Krishna, nem de Moisés. O que leva as religiões adiante é a fé dos praticantes, não uma suposta realidade histórica. Aí está todo o poder da religião, e vemos isso positivamente. Então, falar da sexualidade de figuras sobre as quais nem temos dados históricos suficientes é, realmente, uma provocação. No Movimento Espiritualidade Inclusiva não vemos as coisas desta forma no caso de Jesus. Contudo, há indícios de homossexualidade na Bíblia, em especial no caso de Davi e Jônatas, o que já foi pesquisado por inúmeros teólogos pró e contra.
O cristão Julio Severo teve sua família ameaçada por militantes homossexuais e teve que se exilar do Brasil. Não é uma prova da intolerância homossexual?
Se fosse verdade, seria prova do poder homossexual! E, se tal poder existisse, a tal ponto, nossos 112 direitos básicos negados já teriam sido conquistados. Mas, não é o caso. Ademais, se Julio Severo é cristão de carteirinha (sendo ateu!), Madonna é uma vestal!
A teosofia que você defende no seu blog está historicamente ligada ao controle de natalidade. Os homossexuais não podem estar sendo usados como um meio para a disseminação dos ideais da teosofia?
Não defendemos a Teosofia em nosso blogue. Pelo contrário, em alguns textos nossos a Sociedade Teosófica, que divulga o conceito de “teosofia” (sabedoria divina), é duramente criticada por ser elitista e sutilmente homofóbica. Então, como a Sociedade Teosófica não encara a questão homossexual de frente, mas põe isso para debaixo do tapete, é insensato imaginar que os gays sejam usados como meio para disseminar a Teosofia. (Risos)
O primeiro mandamento que Deus deu ao homem foi o de se multiplicar e encher a Terra, mandamento defendido por Cristo Jesus. Como você, enquanto homossexual que pertence a uma religião inclusiva pode se multiplicar? (note que “multiplicar-se” não se refere à adoção)
Não pertenço a nenhuma Igreja ou religião inclusiva. Os membros do Movimento Espiritualidade Inclusiva em particular são de várias religiões: Cristianismo, Espiritismo, Budismo, Umbanda, Judaísmo, Wicca, Paganismo, etc. Há ateus humanistas também.
Quanto a como eu e os demais homossexuais podemos nos “multiplicar”, a resposta é muito simples: a não ser que um homossexual seja estéril, ele pode se “multiplicar” como bem entender. Em geral, gays e lésbicas possuem a mesma taxa de fertilidade que heterossexuais. Então, não vejo problemas com a reprodução. Conheço vários casos de homens gays que tiveram filhos com amigas lésbicas e cuidam muito bem dos mesmos, sem que isso seja um problema. Conheço lésbicas que tiveram filhos por inseminação artificial e, mais uma vez, isso não foi um problema. Enfim, com estes casos vemos que mesmo sendo gays continuamos “multiplicando” outros seres humanos. Seres humanos, aliás, que não são necessariamente gays também. As pesquisas mostram que a taxa de homossexualidade entre filhos gerados por gays ainda é de 10 a 20%, como no caso de crianças geradas por casais heterossexuais.
Se algum entrevistado aceitar um debate, você estaria disposto a defender seu ponto de vista?
Faço isso todos os dias por conta do blogue e do Movimento Espiritualidade Inclusiva. Debato sempre com argumentos e na base do respeito, sem termos chulos ou generalizações. A honestidade dos próprios argumentos residem em nunca perder a calma ou a oportunidade de esclarecer. Quando o outro debatedor descamba para as ofensas, significa que já jogou a toalha e acabaram-se os argumentos. Então, nestas bases, aceito debater com qualquer pessoa.
Deixe uma mensagem para as pessoas que você considera homofóbicas.
Caros homofóbicos. Se estamos de modo tão profundo sempre nas mentes de vocês, é porque não conseguem dormir sem resolver o que representamos para vocês. Se nossos direitos incomodam vocês, é porque, mesmo tendo todos os direitos que não temos, ainda não se sentem livres e felizes. Então, resolvam-se primeiro, e o resto se solucionará por conta. Amem-se, queiram-se, tenham coragem de ser homens e mulheres verdadeiramente religiosos (se for o caso) ou, pelo menos, cidadãos pró-equanimidade (no caso de ateus), que reconhecem que a felicidade vem de dentro e não de como os outros são ou como se comportam em suas intimidades. Boa sorte... Vão precisar!
Nota de Espiritualidade Inclusiva: A entrevista foi concedida por Paulo Stekel à jornalista Sophia Sheimberg, do blogue "Entrevistas & Debates". Sua repercussão está valendo um debate entre Stekel e o autor do blogue "Críticas & Pensamentos", Hallison Liberato, que tem posicionamento oposto quanto aos LGBT. O debate irá ao ar nos próximos dias.
Paulo Stekel
Nome: Paulo Stekel
Blog: http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com
Religião: Budismo
Profissão: Músico, escritor, jornalista, prof. de línguas sagradas
Ideologia: Democrática
Introdução: Por Paulo Stekel
Paulo Stekel é escritor sobre espiritualidade, poliglota especializado em línguas antigas e sagradas, jornalista e músico. Paulo tem como principal atividade a música, sendo músico dos estilos new age/ambient/eletrônico. Nasceu em Santa Maria (Rio Grande de Sul - Brasil), em 1970. Filho de músico, começou a cantar aos 05 anos. De 1985 a 2005, Stekel voltou-se para outras áreas: literatura, jornalismo, línguas antigas.
Em 2005, ano em que morou em Brasília (DF), Stekel estudou canto tenor e sentiu que este era o momento de transformar tudo o que pesquisara por 20 anos em um trabalho "artístico-curativo" ou, então, de "entretenimento relaxante". Pensou em, aos poucos, aliar vários estilos da música eletrônica (New Age, Ambient, Trance, Progressive, Relax, etc.) a dois conceitos novos: o da música canalizada por inspiração e o da codificação de mantras hebraicos da Cabala e também de outras línguas sagradas (Latim, Sânscrito) em música. No caso dos mantras codificados, utilizaria as relações das letras sagradas com as notas musicais da escala cromática.
Em 2008, Stekel iniciou o projeto do primeiro álbum, "Qadosh". De lá para cá, produziu oito álbuns e mais de dezenas de singles, além de algumas trilhas sonoras para sites, blogues e web-séries.
Álbuns lançados: Qadosh (Música canalizada & Mantras codificados) – 2008; Galaktika (an internal space travel) – 2009; Fluindo Reiki... Natureza – 2010; Fluindo Reiki... Mantras – 2010; Stekel (remixes & new song 2010) – 2010; Sacred Voices – 2010; The Planets (for XXIst Century) – 2011; Indigo (Cosmic Sounds for Activation) – 2011.
Além do trabalho musical, Stekel também escreveu nove livros sobre Cabala, línguas sagradas e espiritualidade: Curso de Cabala (2 volumes); Curso de Sânscrito (2 volumes); Elohê Israel – Filosofia Esotérica na Bíblia; Projeto Aurora – retorno a linguagem da consciência; Santo e Profano – Estudo Etimológico das Línguas Sagradas; Deuses e Demônios – verdades inauditas e mentiras anunciadas sobre os anjos; A Alma da Palavra.
Stekel também é ativista LGBT, tendo escrito mais de 60 artigos sobre o tema, especialmente envolvendo espiritualidade, religião e homofobia religiosa. Foi o autor da coluna “Impressões da Diversidade” no blogue “Gay Expression”. Tem 41 anos, vive em união estável há dez anos e é residente da cidade Canoas – RS.
Os artigos escritos por Paulo Stekel giram em torno da sexualidade e da religião, aliando experiências de sua vida visando promover a desconstrução dos velhos “clichês gays” que fazem com que as pessoas vejam os homossexuais como seres estranhos e não como seres humanos normais. Seus textos, a partir de um olhar crítico, geram percepções sobre a liberdade de expressão sexual, a vida diversa dos gays e sua relação com religião, ciência, política, arte, vida social e direitos humanos.
Atualmente administra e escreve para o blogue “Espiritualidade Inclusiva” e é o proponente e coordenador geral do Movimento Espiritualidade Inclusiva, criado em 2011.
BLOG / SITE / IDEIAS / IDEOLOGIA
Só se forem religiosos para serem considerados fundamentalistas
Qual o objetivo do seu blog?
O blogue http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com é o principal canal de comunicação do Movimento Espiritualidade Inclusiva com o mundo. Visa apresentar artigos sobre visão inclusiva nas diversas formas de espiritualidade; denúncias de preconceito religioso e fundamentalista contra LGBTs; dicas de blogues, sites, filmes e documentários; tradução de artigos; divulgação de eventos LGBT e os inclusivos; notícias do mundo LGBT; decisões legislativas e debates políticos relativos aos direitos LGBT; temas culturais relevantes.
Os gays se tornaram fundamentalistas?
Não. Só se forem religiosos para serem considerados fundamentalistas, o que não é o caso. Afinal, como escrevi em um artigo, o termo “fundamentalismo” se refere a movimentos (religiosos, ideológicos, políticos, econômicos, étnicos, etc.) cujos adeptos aderem de modo muito estrito aos princípios fundamentais. De modo pejorativo, o termo muitas vezes se refere a grupos religiosos intransigentes quanto aos princípios de suas fés ou a movimentos étnicos extremistas com motivações ou inspirações apenas nominalmente religiosas. No caso, os gays podem pertencer a quaisquer religiões, ideologias, partidos políticos, visões econômicas, grupos étnicos, etc. O “ser gay” em si não tem a ver com “princípios fundamentais” porque não é uma ideologia ou crença. Se é gay, e pronto. Então, não podemos dizer que os gays tenham se tornado fundamentalistas no sentido de serem gays. Gays são seres humanos, e isto está acima de qualquer fundameno, fundamentalismo ou ideologia. Todos merecem o mesmo respeito.
Por que chamar quem não concorda com o comportamento homossexual de homofóbico?
Não se pode “concordar” com algo ou “discordar” de algo que não constitui uma crença ou ideologia, mas simplesmente o como alguém é em seu íntimo. Um ser humano é muito mais do que seu comportamento sexual, seja hétero, homo ou bissexual. Reduzi-lo a sua sexualidade para inferiorizá-lo é uma atitude igual ao que padeceram as mulheres e os negros no passado recente. Considerando que homofobia é uma aversão, um ódio e uma intolerância a LGBTs que vem a se manifestar através da violência moral ou física contra esta minoria (cerca de 10 a 20% da humanidade), quem manifesta tal aversão, ódio ou intolerância que extrapola um simples “pensar” e exterioriza-se em atos de inferiorização, deve muito corretamente ser considerado “homofóbico”.
O que caracteriza alguém como homofóbico?
Como disse antes, quando a coisa extrapola o simples “pensar sobre”. Comparemos: todos sabemos que a lei anti-racismo impede que qualquer pessoa manifeste racismo abertamente. É crime inafiançável. Contudo, a lei não legisla sobre o pensamento íntimo de cada um. Há pessoas racistas em seu íntimo que, por não manifestarem isso publicamente e de modo a atentar contra a dignidade dos negros, não podem ser enquadradas na lei. Ou seja, a lei anti-racismo não acabou com os pensamentos racistas, embora coíba ações racistas. Com a homofobia é a mesma coisa, com a diferença de que ainda não temos uma lei anti-homofobia. Um homofóbico é alguém que não apenas pensa de modo aversivo com relação a homossexuais, mas que leva essa aversão a atos contra homossexuais. Este é o parâmetro para definirmos um homofóbico.
Vivemos num país livre. Criticar o comportamento homossexual faz parte dessa liberdade no seu ponto de vista?
Se a lei permitir criticar o “comportamento” heterossexual na mesma base, sim. Haverá uma polarização, e aí é que reside o perigo. Não podemos pensar que se tem todo o direito de criticar “comportamentos” não heteronormativos, mas ao criticarmos a própria heteronormatividade sermos acusados ignorantemente de estarmos tentando impôr nossa condição a outros. A homossexualidade, muito mais que um “comportamento”, é uma orientação. Não é opção, decisão consciente nem algo que se possa “curar”. É tão natural quanto a heterossexualidade.
SOCIEDADE / EDUCAÇÃO / CULTURA
Não existiu um projeto denominado “kit gay”. Este nome foi alcunhado de forma cafajeste pelos opositores cristãos fundamentalistas, os covardes membros da bancada evangélica
Há pouco tempo houve um projeto denominado “kit gay” que colocava material de apologia gay dentro de sala de aula para o público infanto-juvenil. Qual a sua opinião sobre esse material?
Não existiu um projeto denominado “kit gay”. Este nome foi alcunhado de forma cafajeste pelos opositores cristãos fundamentalistas, os covardes membros da bancada evangélica, a mesma que chafurda na lama com denúncias de corrupção, já que dizem ser de Deus, mas aliam-se ao Diabo na política corrupta de nosso país. O objetivo original do projeto era o de incluir os LGBT no ambiente escolar, onde são frequentemente vítimas de homofobia e bullying, com a consequente evasão escolar. Para isso, os alunos e professores deveriam conhecer os “diferentes”, os diversos da heteronormatividade corrente. Sem conhecê-los, não há como sequer respeitá-los, quanto mais incluí-los com todos os direitos de qualquer cidadão heterossexual. Portanto, não houve apologia alguma. Esta interpretação errônea foi criada pelos opositores do projeto.
Há preconceito contra o homossexual hoje no Brasil? Explique.
Se não houvesse preconceito contra o homossexual e todos os membros da comunidade LGBT no Brasil, os 112 direitos básicos que lhes são negados já teriam sido corrigidos, entre eles: não podem casar no civil; não adotam sobrenome do parceiro; não somam renda para alugar imóvel; não participam de programas do Estado vinculados à família; não têm a impenhorabilidade do imóvel em que o casal reside; não têm garantia de pensão alimentícia em caso de separação; não têm garantia à metade dos bens em caso de separação; não adotam filhos em conjunto e não podem adotar o filho do parceiro; não podem ser inventariantes do parceiro falecido; não têm garantida a permanência no lar quando o parceiro morre; não acompanham a parceira no parto; não podem ser curadores do parceiro declarado judicialmente incapaz; não podem declarar parceiro como dependente do Imposto de Renda; não têm suas ações legais julgadas pelas varas de família; não têm direito de converter união estável em casamento; não têm direito a assistência alimentar; não têm direito a pedir o afastamento temporário do companheiro da moradia do casal; não têm direito de eximir-se da obrigação de depor como testemunha contra o companheiro; não tem direito a não produzir prova contra o companheiro militar; entre outros. Atualmente, alguns destes direitos vem sendo assegurados na justiça e não por lei!
Fora isso, se não houvesse preconceito contra o homossexual no Brasil, a quantidade de assassinatos cometidos contra LGBTs em nosso país não teriam o requinte de crueldade que vemos, frequentemente com referências à sexualidade da vítima. A cultura do preconceito contra gays está arraigada na sociedade brasileira de um modo tal que parece perfeitamente normal fazer chacota, malhar, fazer piadas, denegrir a imagem e rebaixar a dignidade dos mesmos sem nem se perceber. O mesmo se fazia com os negros desde o período colonial, só tendo sido relativamente coibido a partir da lei anti-racismo. O mesmo se fazia com as mulheres até bem pouco tempo. Os gays, agora, parecem sofrer um preconceito que é um misto de racismo e misoginia, pois são considerados inferiores (como os misóginos consideram as mulheres) e uma categoria abaixo dos “normais” heterossexuais (como os racistas consideram os negros do ponto de vista étnico-racial).
Um dos entrevistados do meu blog escreveu sobre o “ismo” no final de uma palavra demonstrando que a palavra terminada em “ismo” não se trata, necessariamente, de doença e eu concordei com ele. Em várias partes do seu blog encontrei a palavra “cristianismo”. Se homossexualismo é doença, dizer que os religiosos se encaixam no cristianismo não seria também uma forma de preconceito?
Isso é desconhecer a Língua Portuguesa, o que é deplorável num país em que a educação claudica e se definha cada vez mais. O sufixo nominal “-ismo” serve para denominar doutrina, escola, teoria, sistema, modo de proceder ou pensar, ação: socialismo, capitalismo, comunismo, romantismo, ostracismo, realismo, anarquismo, terrorismo, exorcismo, homossexualismo. Então, o termo “homossexualismo” refere-se a uma ação e, assim, foi considerado doença pela antiga Psiquiatria, pois se referia à ação de se fazer sexo com alguém igual, isto é, do mesmo sexo. Pela mesma lógica, “cristianismo” é a ação de se fazer parte de uma doutrina religiosa que tem Cristo como o centro. Simples!
A cultura brasileira expressa que o homossexual é promíscuo. As paradas gays que ocorrem no Brasil e que são o maior meio de visibilidade dos homossexuais confirmam essa visão do brasileiro, basta procurar no youtube e no google. No carnaval a libertinagem é geral, tanto com homossexuais como heterossexuais. Os mesmos setores que criticam a devassidão no carnaval criticam também a devassidão nas paradas gays. Por que tentar mudar essa visão de parte da sociedade se é essa visão que os homossexuais oferecem a eles?
Como você mesmo evidenciou, se no Carnaval a libertinagem é geral, tanto com homossexuais como heterossexuais, a quem se deve atribuir a promiscuidade? A todos os seres humanos, sejam gays ou héteros? Se for assim, afirmar que homossexuais são promíscuos é um sofisma terrível. Da mesma forma, quem se prostitui nas ruas? Alguns heterossexuais e alguns homossexuais. Seria certo, neste caso, dizer que os seres humanos se prostituem ou nos referimos a alguns deles? Assim, podemos dizer que no universo homossexual há um pouco de tudo o que existe no universo heterossexual, e que generalizar apenas para o universo homossexual demonstra, ou ignorância, ou má intenção.
Se uma parcela de homossexuais vai às paradas gays, uma parcela muuuito maior não vai, e não se encaixa na proposta delas. A despeito de divergências entre os dois grupos, o que fica evidente é que toda a generalização é burra. A tendência de todo o moralismo é generalizar burramente!
Então, os homossexuais não são promíscuos, assim como os heterossexuais não são promíscuos. Mas, alguns homossexuais são promíscuos tanto quanto alguns heterossexuais o são.
Jair Bolsonaro lutou muito contra a aprovação da PL122 expondo todos os aspectos desse projeto de lei. Por que os gays querem uma lei específica se já se beneficiam das leis existentes como todo cidadão brasileiro?
Se nos beneficiássemos das leis existentes os 112 direitos que nos são negados estariam à nossa disposição sem precisarmos entrar na justiça e rezarmos para o processo não cair num juiz preconceituoso e fundamentalista. O mesmo disseram para os negros antes da lei anti-racismo, que também é uma lei específica e, hoje, contestada por quase ninguém, salvo os racistas. Por isso, precisamos de uma lei específica como a lei anti-racismo, a lei Maria da Penha, entre outras leis específicas de nossa legislação.
O Estado brasileiro é laico, mas não é ateu. Você concorda com a presença de religiosos na política brasileira?
O Estado brasileiro ser laico significa não ser nem teísta nem ateu. Significa simplesmente que o Estado não interfere na religiosidade de seus cidadãos, mas também não permite que a religião interfira no Estado, que deve governar para TODOS os cidadãos, independente da religião deles, ou do fato de não terem religião alguma, como no caso dos ateus. Neste caso, a política brasileira pode ter pessoas de quaisquer religiões ou de nenhuma, mas o que deve pautar as decisões políticas é o laicismo de estado (governar para todos) e a declaração dos direitos humanos.
Você concorda que toda sociedade precisa de moralidade?
Concordo, desde que possamos dar a chance da sociedade escolher sua moral de modo equânime. Por que devemos escolher uma moral especificamente cristã num país com diversas religiões? Concordo, desde que cada cidadão possa escolher sua moral – e, o faz, na base da liberdade religiosa constitucional -, mas sem impô-la a um outro cidadão por quaisquer meios, principalmente quando este professa outra religião ou nenhuma (no caso dos ateus), pois isso acaba com o princípio da isonomia e esfacela o estado laico. Portanto, moralidade impositiva, jamais!
A AIDS, desde o seu início, tem maior percentual de infecção nos gays. No Brasil, há campanhas direcionadas exclusivamente aos homossexuais. Há inclusive teorias que afirmam que os gays foram os disseminadores da doença como a vemos. O meio homossexual é um grupo de risco, embora o governo tenha retirado essa nomeação de “grupo de risco”?
O governo é quem teria que responder a essa pergunta, já que a arcaica noção de “grupo de risco” continua sendo apresentada mesmo após ter ficado claro que o que existem são “comportamentos de risco”, abrangendo heterossexuais, bissexuais e homossexuais.
Uganda, na África, é o país mais bem sucedido no combate à AIDS adotando uma política contra o homossexualismo e pela monogamia. Qual a sua opinião a respeito?
A pergunta foi mal-formulada e pode ser entendida como tendendo a levar a um sofisma quase nazistoide. Não foi o ataque aos gays em Uganda que diminuiu a infecção pelo HIV em Uganda e isso não é reconhecido pela Organização Mundial de Saúde. Esta mentira vil e tem sido afirmada pelos missionários cristãos e pelo governo daquele país há tempos e foi comprada em sua totalidade pelos missionários fundamentalistas brasileiros. Não esqueçamos que este país pretendeu varrer os gays de seu território do mesmo modo que Hitler quis varrer os judeus da face da terra por julgá-los responsáveis por tudo de ruim que a Alemanha passava na sua época. Além disso, monogamia não é garantia de não infecção, e é um juízo moral. Por que a infecção não é maior em países onde se adota a poligamia, como em repúblicas islâmicas?
RELIGIÃO
Jesus não ataca homossexuais em momento algum
Silas Malafaia é um grande combatente do movimento homossexual e com isso adquiriu mais admiradores e pessoas que se juntaram à sua causa contra os LGBT’s. Segundo ele, não faz críticas a pessoas envolvidas com a prática, mas a prática que envolve os gays. Toni Reis, um dos líderes do movimento homossexual o processou por criticar o movimento homossexual, no entanto, vemos gays abusarem da imagem da Igreja Católica como no exemplo da parada gay em São Paulo. Por que os gays podem criticar a religião mas a religião não pode criticar o homossexualismo?
Se a religião não estivesse podendo nos criticar, Malafaia já estaria preso há muito tempo. Os fundamentalistas deitam e rolam na crítica aos gays e o judiciário brasileiro é conivente com isso. A prova de que estão, sim, podendo criticar os LGBT à vontade sem qualquer ação em contrário do judiciário é exatamente o uso de imagens católicas na parada gay de São Paulo. Como assim? Simples e pérfido: o judiciário faz vistas grossas aos ataques que as comunidade LGBT recebe todos os dias de parte de pessoas como Malafaia, Bolsonaro, etc. Os organizadores LGBT da parada de São Paulo (não são o todo da comunidade LGBT) resolveram dar o troco para ver o que o judiciário faria. O que o judiciário fez? Simples, não quis cair na armadilha. Pois, se o judiciário se pronunciasse contra o que ocorreu na parada de São Paulo, estaria reconhecendo o embate e a coisa ia ficar mais feia, mas também mais equânime, com os dois lados podendo agora lutar na justiça em pé de igualdade. Poucos perceberam este detalhe “sutil”.
Há pouco tempo os gays perderam uma grande batalha que travaram contra o Pastor Silas Malafaia quando ele disse que a Igreja Católica tinha que descer de pau em cima dos homossexuais que profanaram as imagens sacras. O juiz que assinou o arquivamento do processo fez, inclusive, diversas críticas ao movimento homossexual dizendo até que quem deveria ser processado era quem profanou tais imagens. Qual a sua opinião a respeito?
Isso é a prova do que disse na resposta anterior: o juiz preferiu arquivar o processo contra Malafaia do mesmo modo que nenhum juiz se pronunciou em sentença contra o episódio das imagens católicas na parada gay de São Paulo. Na verdade, o judiciário está percebendo a palhaçada de Malafaia e dos seus, e está evitando dar pareceres definitivos para um dos lados, pois quando isso ocorrer, a coisa vai ficar muito feia, inclusive fora do Brasil, pois a imagem do país vai ser influenciada pela decisão. Ou o judiciário finalmente se pronuncia, ou equívocos dos dois lados vão continuar existindo.
Por que tentar fazer parte de um setor social (o cristianismo) que historicamente não aceita gays em suas fileiras? Não é uma maneira de forjar uma perseguição, já que outros grupos como comunistas na Igreja Católica (por exemplo) que são excomungados ou até mesmo quem não se coadune às regras que são necessárias aquele grupo?
Num país laico as pessoas têm o direito constitucional de pertencer a qualquer religião ou a nenhuma. Também têm o direito de que não se lhes exija nenhuma condição a mais por ser homossexual do que as que são exigidas de um heterossexual. Gays que querem ser cristãos estão no seu direito e, geralmente, atribuem o preconceito cristão aos cristãos, não à doutrina em si, que julgam mal-interpretada. Eu, particularmente, sou budista, e não tenho problemas em ser budista e gay, porque o Budismo não é uma religião que exclui LGBTs de suas fileiras. Já, o Movimento Espiritualidade Inclusiva é um movimento social que não apoia uma religião em particular em detrimento das demais. Não é um movimento cristão. É um movimento social laico que busca a inclusividade de todos no meio religioso de acordo com as bases de um Estado Laico.
Você diz em seu blog que se o Levítico fosse seguido à risca muita coisa precisaria ser mudada. No entanto, não vi você comentar que após o Levítico vieram outros profetas que modificaram algumas leis aplicadas aos hebreus, aliviando umas e endurecendo outras. Na cultura judaica há também o ensinamento oral, ou seja, a tradição. O homossexual está em pecado em todas elas. Por que criar uma interpretação diferente de uma interpretação que vem sendo feita há milhares de anos? Será que todos os profetas e rabinos, desde os tempos primeiros do judaísmo (milhares de anos) estão errados e alguns homossexuais que interpretaram agora estão certos?
Pois é. Algumas leis foram modificadas e outras não. Qual o critério? Critério de Deus ou critério dos homens? O ponto pacífico é que as religiões mudam, as prescrições religiosas mudam, e nada é tão estanque quanto se quer fazer parecer. Jesus não ataca homossexuais em momento algum, mesmo porque o termo “homossexual” é moderno. Naquela época não havia a noção da existência de orientações sexuais. Se pensava de modo reto em apenas uma versão de sexualidade, que é a macho-fêmea, homem-mulher. Não podemos culpar os antigos pelo desconhecimento, mas não podemos continuar em ignorância quando passamos a conhecer a realidade e a diversidade da formação da identidade sexual, da orientação e do gênero, conforme se tem demonstrado por inúmeras pesquisas científicas. Não se trata de quem está certo e quem está errado. Certa é a ciência à medida que vai desvendando os mistérios da sexualidade que os antigos sequer sonharam, embora se dessem na antiguidade às mesmas variações sexuais que nos damos hoje...
O Papa fala para os católicos. Os pastores falam para os evangélicos. Os rabinos falam para os judeus. Nenhum deles diz: “Saiam na rua e espanquem os homossexuais”. Pelo contrário, pedem orações por todos. Por que provoca-los dizendo que Cristo era homossexual se não há um só relato sobre práticas homossexuais em Jesus?
A rigor, não há provas históricas incontestáveis da existência nem de Jesus, nem do Buda, nem de Maomé, nem de Krishna, nem de Moisés. O que leva as religiões adiante é a fé dos praticantes, não uma suposta realidade histórica. Aí está todo o poder da religião, e vemos isso positivamente. Então, falar da sexualidade de figuras sobre as quais nem temos dados históricos suficientes é, realmente, uma provocação. No Movimento Espiritualidade Inclusiva não vemos as coisas desta forma no caso de Jesus. Contudo, há indícios de homossexualidade na Bíblia, em especial no caso de Davi e Jônatas, o que já foi pesquisado por inúmeros teólogos pró e contra.
O cristão Julio Severo teve sua família ameaçada por militantes homossexuais e teve que se exilar do Brasil. Não é uma prova da intolerância homossexual?
Se fosse verdade, seria prova do poder homossexual! E, se tal poder existisse, a tal ponto, nossos 112 direitos básicos negados já teriam sido conquistados. Mas, não é o caso. Ademais, se Julio Severo é cristão de carteirinha (sendo ateu!), Madonna é uma vestal!
A teosofia que você defende no seu blog está historicamente ligada ao controle de natalidade. Os homossexuais não podem estar sendo usados como um meio para a disseminação dos ideais da teosofia?
Não defendemos a Teosofia em nosso blogue. Pelo contrário, em alguns textos nossos a Sociedade Teosófica, que divulga o conceito de “teosofia” (sabedoria divina), é duramente criticada por ser elitista e sutilmente homofóbica. Então, como a Sociedade Teosófica não encara a questão homossexual de frente, mas põe isso para debaixo do tapete, é insensato imaginar que os gays sejam usados como meio para disseminar a Teosofia. (Risos)
O primeiro mandamento que Deus deu ao homem foi o de se multiplicar e encher a Terra, mandamento defendido por Cristo Jesus. Como você, enquanto homossexual que pertence a uma religião inclusiva pode se multiplicar? (note que “multiplicar-se” não se refere à adoção)
Não pertenço a nenhuma Igreja ou religião inclusiva. Os membros do Movimento Espiritualidade Inclusiva em particular são de várias religiões: Cristianismo, Espiritismo, Budismo, Umbanda, Judaísmo, Wicca, Paganismo, etc. Há ateus humanistas também.
Quanto a como eu e os demais homossexuais podemos nos “multiplicar”, a resposta é muito simples: a não ser que um homossexual seja estéril, ele pode se “multiplicar” como bem entender. Em geral, gays e lésbicas possuem a mesma taxa de fertilidade que heterossexuais. Então, não vejo problemas com a reprodução. Conheço vários casos de homens gays que tiveram filhos com amigas lésbicas e cuidam muito bem dos mesmos, sem que isso seja um problema. Conheço lésbicas que tiveram filhos por inseminação artificial e, mais uma vez, isso não foi um problema. Enfim, com estes casos vemos que mesmo sendo gays continuamos “multiplicando” outros seres humanos. Seres humanos, aliás, que não são necessariamente gays também. As pesquisas mostram que a taxa de homossexualidade entre filhos gerados por gays ainda é de 10 a 20%, como no caso de crianças geradas por casais heterossexuais.
Se algum entrevistado aceitar um debate, você estaria disposto a defender seu ponto de vista?
Faço isso todos os dias por conta do blogue e do Movimento Espiritualidade Inclusiva. Debato sempre com argumentos e na base do respeito, sem termos chulos ou generalizações. A honestidade dos próprios argumentos residem em nunca perder a calma ou a oportunidade de esclarecer. Quando o outro debatedor descamba para as ofensas, significa que já jogou a toalha e acabaram-se os argumentos. Então, nestas bases, aceito debater com qualquer pessoa.
Deixe uma mensagem para as pessoas que você considera homofóbicas.
Caros homofóbicos. Se estamos de modo tão profundo sempre nas mentes de vocês, é porque não conseguem dormir sem resolver o que representamos para vocês. Se nossos direitos incomodam vocês, é porque, mesmo tendo todos os direitos que não temos, ainda não se sentem livres e felizes. Então, resolvam-se primeiro, e o resto se solucionará por conta. Amem-se, queiram-se, tenham coragem de ser homens e mulheres verdadeiramente religiosos (se for o caso) ou, pelo menos, cidadãos pró-equanimidade (no caso de ateus), que reconhecem que a felicidade vem de dentro e não de como os outros são ou como se comportam em suas intimidades. Boa sorte... Vão precisar!
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