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segunda-feira, 9 de abril de 2012

[Notícia] Chile aprova lei anti-homofobia. E o Brasil?

Por Marcelo Cia (diretamente de MIXBRASIL - http://mixbrasil.uol.com.br/blogs/cia/2012/04/05/chile-aprova-lei-anti-homofobia-e-o-brasil.html)


Bastou UM assassinato de homossexual para os deputados chilenos aprovarem lei que criminaliza a homofobia no país. No Brasil são mais de 200 por ano, e nada acontece. Por que? Vamos aos fatos.

Vizinhos

A Câmara dos Deputados do Chile aprovou nesta quarta-feira, dia 4 de abril, a maioria dos artigos de uma lei que pune a discriminação por orientação sexual ou religiosa. O texto é tipo o do PLC 122, que tramita no Brasil há quase uma década. A aprovação da lei pelos deputados chilenos foi uma resposta à morte, na semana passada, de um jovem homossexual atacado por neonazistas. Daniel Zamudio, de 24 anos, era o nome do moço. Ele morreu depois de agonizar por três semanas no hospital. O crime abalou o país todo, não só a comunidade gay.

O texto aprovado diz que "se entende por discriminação arbitrária toda distinção, exclusão ou restrição sem justificativa razoável efetuada por agentes do Estado ou particulares que cause privação, perturbação ou ameaça ao exercício legítimo dos direitos fundamentais" por "motivos de raça ou etnia, nacionalidade, situação socioeconômica, idioma, ideologia ou orientação política, religião ou credo, participação em organizações gremiais, sexo, orientação sexual, identidade de gênero, estado civil, idade, filiação, aparência pessoal e doença ou incapacidade".

E aqui?

Você lembra do moço assassinado durante a Parada gay de 2009 por neonazistas? Lembra do Edson Neris, também assassinado em São Paulo no ano de 2000 por neonazistas? Enquanto agressões como essas acontecem na Paulista e no Rio de Janeiro, tantos outros crimes subnotificados acontecem pelo Brasil e nenhum deles conseguiu sensibilizar os deputados nem a opinião pública a respeito dessa violência toda. O Brasil é, tradicionalmente, um país que pouco protesta. É um povo resignado. E isso inclui a população gay. Fazemos pouco, protestamos pouco. Adoramos uma festa mas detestamos política. Não conseguimos eleger políticos, ficamos calados quando vemos uma discriminação. O "antes ele do que eu" impera. Somos todos um pouco calados. Somos todos um pouco culpados. Até quando?


Nota de Espiritualidade Inclusiva


Para entender quem foi Daniel Zamudio e como foi brutalmente agredido, morrendo em consequência dos ferimentos, leia nossa postagem:

http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com.br/2012/03/noticia-luto-morreu-daniel-zamudio-o.html
Ao aprovar a lei anti-discriminação, o Chile deu um exemplo que o Brasil deveria dar há muito tempo. Contudo, aqui esbarramos em obstáculos muito mais sérios que os do Chile. E, não estamos falando da patrulha fundamentalista católico-protestante, não! Esta, existe em todo o mundo Ocidental! Estamos falando do grau de corrupção política, da filosofia do "toma-lá-dá-cá", da barganha, do desvio, do leilão de votos e de apoios para aprovações legislativas, atitudes estas, sim, as verdadeiras responsáveis pelo atraso e indas e vindas na aprovação do PLC 122. Não fosse a ganância de nossos políticos pelos desvios de milhões, muitos deles inclusive realizados por políticos da chamada bancada evangélica, cuja maioria enfrenta processos por corrupção, os direitos humanos da comunidade LGBT brasileira já estariam garantidos e não seriam objeto de uma discussão diabólica incitada por dementes como Silas Malafaia, Magno Malta e o bobo da côrte, Jair Bolsonaro!

Quantos "Zamudios" brasileiros teremos que ter para que algo semelhante ao que se fez no Chile em tempo recorde venha a ser aprovado por aqui? E, como diz Luiz Mott (e não nos cansamos de repetir), o homocausto continua, sem qualquer barreira ou atitude do Estado. A quem podemos recorrer, então? A Deus não mais podemos, porque os que se autodeclaram seus portavozes dizem que não nos é franqueado reclamar-Lhe direitos que são impedidos por versículos bíblicos... Só nos resta reclamar em instâncias internacionais, o que será uma vergonha para o Brasil, que será visto como uma Uganda latina, em escala menor (ou não!)...

segunda-feira, 5 de março de 2012

Refletindo sobre o movimento LGBT...

Por Paulo Stekel


A intenção deste texto não é a de ser um estudo completo sobre o ativismo LGBT no Brasil. Pretende ser apenas uma rápida reflexão, já que o artigo devidamente aprofundando é um projeto para mais adiante. Contudo, por força do status do ativismo em nosso país atualmente, não posso furtar-me a algumas considerações pertinentes e necessárias.

Durante muitos anos o ativismo LGBT ficou baseado em ONGs utilizando verba pública para promover ações geralmente centradas em campanhas de conscientização, anti-homofobia, de prevenção a DST/AIDS e de afirmação da identidade gay. Inicialmente não parecia haver qualquer viés político-partidário no trabalho destas ONGs. Elas pareciam soberanas, legítimas representantes da comunidade LGBT e realmente engajadas em defender nossos direitos sem qualquer atrelamento obscuro. Atualmente, há vários ativistas que contestam a lisura de muitas ONGs neste quesito. Contudo, se há um fundo de verdade nisso, tenho certeza de que não corresponde a todas as ONGs e nem mesmo nas supostamente envolvidas, isso corresponda ao pensamento de todos os seus líderes.

Agora, além desta desconfiança, soma-se uma espécie de apatia com cheiro de atrelamento político-partidário exatamente quando os LGBTs estão sendo atacados diariamente por pastores e políticos fundamentalistas evangélicos, numa crescente demonização da pessoa LGBT, num rebaixamento anti-constitucional evidente da nossa dignidade. Alguns pedem calma, mas a calma tem sido, neste caso, sempre uma vantagem para os homofóbicos fundamentalistas, que aproveitam a passividade LGBT para intensificar um “lobby diabólico anti-gay” em Brasília!

Ao mesmo tempo, evita-se falar no já anunciado “combate ideológico contra os evangélicos” na questão da orientação sexual. É uma “guerra” anunciada, e trará consequências sérias para o processo de consolidação da cidadania plena para LGBTs e das (geralmente tímidas e pouco eficazes) políticas de direitos humanos em nosso país.

Questões como a aprovação de uma lei anti-homofobia, o uso de material de prevenção à homofobia em escolas e mesmo a escolha de fundamentalistas para setores do governo federal são, entre outras de menor importância, o mote de muitas contradições, embates, rachas e críticas dentro do próprio movimento LGBT. Mas, quando falamos em “movimento LGBT”, do que estamos falando? De algo coeso ou plural? Talvez plural, mas não coeso. E, ambas as palavras, neste caso, nem são opostas entre si, já que um movimento pode ser coeso, mas não permitir a pluralidade de ideias; pode ser plural quanto às ideias, mas não ter coesão; pode ser coeso e plural; pode ser nem coeso, nem plural. Qual é o caso, então? Acho que se trata de um movimento não-coeso e com pluralidade de pensamentos e ideologias (partidárias, apartidárias, laicas, religiosas). O fato de algumas organizações (como a ABGLT, por exemplo) de certa forma serem consideradas “representantes” da comunidade LGBT não significa coesão, já que para isso, todos os setores da comunidade LGBT deveriam não apenas estar ali representados, mas “ouvidos” quanto a suas ideias. E, convenhamos, a comunidade LGBT é tão plural quanto a heterossexual. Há, então, um misto de orientação sexual com ideologias... Estopim para muitas divergências e munição para o inimigo...

O “inimigo” a que nos referimos, não de modo odioso, mas “ideal” (no plano das ideias), é o fundamentalismo (neo)pentecostal que se utiliza não apenas dos templos, mas da mídia e da política para tentar criminalizar os “diferentes” através de um pensamento medieval.

Quando analisamos as pré-candidaturas às eleições municipais deste ano em todo o Brasil, vemos que pouco mais de uma centena de “militantes” gays pretende contribuir com a luta por nossos direitos. E, pasmem!, estão sendo aceitos por vários partidos, até aqueles historicamente envolvidos com o preconceito e a homofobia. O PR do senador ultra-homofóbico Magno Malta é um deles (ver a notícia: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,gay-candidato-tem-espaco-ate-no-pr-,843759,0.htm). Mas, como bem desconfiava Carlos Tufvesson ainda hoje pela manhã em uma rede social: “Cheiro de mais erro aí. Gente, pensem bem, no que isso vai ajudar aos nossos candidatos? Só vai dizer é que o PR é bonzinho e nos é que somos intolerantes, pois eles nos aceitam tanto que até nos dão legenda!!!!” É a velha tática do “unir-se ao inimigo para vencê-lo”. Claro que estou falando dos partidos eivados de fundamentalistas unindo-se a candidatos gays para, de certa forma, jogarem conosco e não o contrário! Se bem que o contrário pode ser uma boa tática (reflexão não definitiva...)!

É claro que é importante (e ideal!) que todos os partidos possuam frentes de defesa dos direitos LGBT e abram espaço para candidatos gays, mas isto deve vir de um anseio legítimo de seus filiados, e não de interesses obscuros de seus líderes fundamentalistas com vistas a obstruir as ações do movimento LGBT como um todo. Isso contrasta com a pressão que temos visto por parte de lideranças evangélicas junto ao governo federal para a não aprovação da lei anti-homofobia (PLC 122) e a retirada do (assim denominado por eles, não por nós) “kit gay”. Até quando esta pressão surtirá efeito? Até quando permitirmos!

Neste sentido, concordo com Toni Reis (ABGLT), quando diz que é o momento de incentivarmos as candidaturas LGBT (somente candidatos com histórico e propostas, claro!) e de apoiarmos aliados (políticos sabidamente pró-LGBT). Sem isso, não temos como aumentar nossa força em Brasília e ficaremos à mercê de teocratas mal-intencionados loucos para transformar o Brasil no “Irã Fundamentalista Evangélico” tão sonhado por insanos como Malafaia et catrefa...

Não querendo ser profético, mas talvez já o sendo, o divisor de águas nesta confusão toda deverá ser a 3ª Marcha Nacional Contra a Homofobia (organizada pela ABGLT), que ocorrerá em 17 de maio, em Brasília (ver notícia: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,movimento-social-poe-fim-a-tregua-e-vai-as-ruas-,843800,0.htm?p=1).

A intenção da Marcha este ano é a de fazer um repúdio ao que está sendo chamado de “homofobia institucional”, algo que, a meu ver, não está muito claro, e por um motivo muito simples: as ações até aqui observadas não constituem “homofobia declarada” por parte do governo, mas caracterizam, sim, uma atitude morna e tímida na hora de implantar políticas pró-LGBT, que acabam retrocedendo sob um fortíssimo “lobby do capeta”! E, onde está o “lobby arco-íris”? É fraco, ainda. Só será mais intenso com mais gays na política, em todas as esferas. Ora, se somos de 6 a 10% da população, não se admite que tenhamos menos que esses percentuais de representação no Congresso, no Senado, etc. Quem não entende como funciona o jogo de forças na política não terá condições de propor uma ação eficaz em prol dos direitos LGBT. Sem neutralizar a ação “demoníaca anti-laicista” dos fundamentalistas da Frente Parlamentar Evangélica não conseguiremos avançar mais. Podemos, sim, cobrar que o governo federal faça a sua parte, mas também temos que fazer a nossa: aumentar nossa representatividade política em 100% do território nacional!

A ABGLT de Toni Reis, que reúne entidades de todo o país, diz que o governo federal se recusa a receber o movimento, apesar de já ter recebido os fundamentalistas evangélicos. Mas, a qual movimento ele se refere? A ABGLT representa uma parte da comunidade LGBT através das organizações filiadas, mas isso não corresponde ao todo do pensamento LGBT brasileiro. Pretender, assim, ir à luta como se estivesse representando todos os gays do Brasil é um quixotismo dos mais românticos e ineficazes, a meu ver. Como o foi, aliás, no momento em que o texto do PLC 122 foi redigido e reformulado por pressão, em que se consultou apenas a ABGLT, uns tantos teocratas evangélicos e se pretendeu que todos os gays do Brasil concordassem com um acordo às escuras que continuava permitindo a pastores de boca suja a demonização de seres humanos em seus templos por conta de sua orientação sexual. Isso é o movimento LGBT brasileiro? Que cada um reflita e responda por si!

Tenho observado que o movimento LGBT amplo, aquele que escapa ao controle de qualquer associação que pretenda abarcá-lo no todo, pode ser classificado de dois modos que se entremeiam e se confundem:

Quanto a visão política:

a) Movimento LGBT partidário: constituído de pessoas, grupos e/ou ONGs que, ainda que não abertamente, nasceram em partidos políticos ou estão atrelados a eles por força de vários motivos. São ligados a ideologias políticas diversas, desde as mais esquerdistas às mais direitistas. Incluem-se aqui também os grupos de diversidade LGBT dentro dos partidos políticos.

b) Movimento LGBT apartidário: constituído de pessoas, grupos e/ou ONGs que não mantêm qualquer vinculação ideológica com partidos políticos, partindo geralmente de uma visão internacionalmente estabelecida de direitos humanos LGBT. Os grupos de cultura gay (homo-cultura) e arte gay geralmente são apartidários.

Quanto a religiosidade/espiritualidade:

a) Movimento LGBT laico: Partidário ou apartidário, é constituído de pessoas, grupos e/ou ONGs que defendem o Estado Laico, mas não se opõem aos direitos constitucionais das religiões/crenças nem à liberdade religiosa ou de expressão. Neste caso, não esposam quaisquer ideologias religiosas, agnósticas ou ateias, mas tão somente a defesa do laicismo em relação com os direitos humanos LGBT. Laicismo é um conceito que denota a ausência de envolvimento religioso em assuntos governamentais, bem como ausência de envolvimento do governo nos assuntos religiosos. Não se trata, portanto, da negação da religião, mas da separação entre esta e o Estado. A maior parte das ONGs LGBT se encaixa neste grupo.

b) Movimento LGBT ateu: Partidário ou apartidário, é constituído de pessoas, grupos e/ou ONGs que defendem a ideologia do ateísmo abertamente. Não confundir ateísmo com laicismo. Ateísmo num sentido amplo, é a rejeição ou ausência da crença na existência de divindades e outros seres sobrenaturais. Mesmo sendo ateu, um grupo LGBT pode defender claramente o laicismo de Estado, onde, por consequência, ficam assegurados os direitos de crença.

c) Movimento LGBT religioso/espiritual: Partidário ou apartidário, é constituído de pessoas, grupos e/ou ONGs que possuem relação com crenças, religiões e visões de mundo consideradas “espirituais”. Os grupos de afro-descendentes LGBT geralmente defendem a cultura e a espiritualidade de matriz africana e o legado de suas religiões. Há ainda grupos LGBT ligados a religiões como Umbanda, Cristianismo e Espiritismo. Isso não impede que estes grupos também defendam o laicismo de Estado.

Estas classificações não são engessadas. São, na verdade, fluidas, móveis, e constituem apenas o esboço de um estudo mais aprofundado que venho fazendo dentro do Movimento Espiritualidade Inclusiva. Contribuições a este estudo não só são muito bem-vindas, como altamente necessárias para sabermos do que realmente se constitui o tão falado movimento LGBT brasileiro...


quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

O beijo proibido do “amor que não ousa dizer o nome”

Por Paulo Stekel (artigo originalmente publicado em http://gayexpression.wordpress.com/2011/03/01/o-beijo-proibido-do-%E2%80%9Camor-que-nao-ousa-dizer-o-nome%E2%80%9D/)

Quem não conhece a famosa frase do polêmico escritor irlandês Oscar Wilde (1854-1900) que define o amor entre pessoas do mesmo sexo como “o amor que não ousa dizer o nome”? Em Wilde, quase tudo é audacioso, desde suas comédias, textos para crianças (sim, ele fez isso!) até seu autobiográfico “De Profundis”, publicado em versão completa mais de 70 anos após sua morte. Para muitos, um dos primeiros ícones homossexuais a inspirar os modernos movimentos LGBTs, ainda que tenha travado uma luta muito particular contra o preconceito, não uma luta articulada, como a que travamos hoje. Wilde viveu sua homossexualidade intensamente numa época em que isso era crime, e teve que arcar com as consequências de “amar o igual” em plena era das trevas da Londres de 1895. Ficou preso por dois anos e, por conta disso, teve sua saúde, vida financeira e até produção intelectual prejudicadas.


Wilde vinha de família protestante, o que, com certeza, lhe aumentou a pressão por causa de sua orientação sexual. Os protestantes, em geral, são muito mais radicais que os católicos no que tange ao sexo não-reprodutivo e, em especial, à homossexualidade. Ainda hoje é assim, e, se pudessem, todos nós estaríamos presos como Oscar Wilde, privados de nossos direitos fundamentais. Aliás, é o que intentam na surdina os pastores evangélicos fanáticos e mesmo alguns setores fundamentalistas do catolicismo.

Esses fanáticos querem negar-nos o direito mais consensual do amor entre dois seres: o beijo apaixonado em público. Todos sabemos que na televisão brasileira o beijo gay é um tabu absurdamente hipócrita. Novelas em horário nobre apresentam a um público indiscriminado as maiores baixarias sexuais, extra-conjugais e violência sado-masoquista sem o mínimo murmúrio dos que se auto-intitulam “baluartes da moral e dos bons costumes”, mas sequer apresentam um “selinho gay”, pois isso acabaria com a “demonização” das relações homoafetivas perante a sociedade brasileira, derrubando o cavalo de batalha caquético das “frentes cristãs” abertamente anti-gays. Na verdade, o beijo proibido, o beijo gay, se tornado frequente na televisão, e do modo correto, acabaria com o bicho-de-sete-cabeças na cabeça dos brasileiros, que possuem uma visão equivocada do universo homoafetivo. É um medo inconsciente de sabe-se lá o que a atormentar a mente de quem foi educado dentro de uma norma imposta por um costume que não é de todos. Se não é de todos, há de se dar voz ao diverso.
Recordo a primeira vez que dei o “beijo proibido” em plena rua, em Santa Maria, no interior do RS, lá pelos idos de 1995, ao sair de uma festa. Não esqueço da reação de um popular que passava e ia proferindo impropérios ladeira abaixo. Se fosse na Avenida Paulista, a coisa seria mais séria…

Dez anos depois, em 2005, repeti a cena em um shopping de Brasília, e a reação foi mais amistosa. Mereci até um ok e um sorriso de um atendente de empresa de celulares que assistia a tudo de um quiosque no centro do shopping. (Não, não sei se ele era gay ou apenas “simpatizante”. Rsrs.)

O fato é que, por mais que uma boa parcela da sociedade pareça hoje mais “tolerante” ao beijo gay em público, sempre se encontra aqueles “machões carentes de auto-afirmação” que só conseguem sentir virilidade batendo em quem pensam ser menos viris que eles, o que, me permitam esclarecer, nem sempre é a verdade dos fatos…

A grosso modo, eu divido os homofóbicos masculinos em três classes: os enrustidos (engaiolados em uma orientação sexual que não quer se revelar por conta da pressão do meio social em que vivem, o que os leva a “exorcizar” seus demônios sexuais através da violência contra quem demonstra claramente sua orientação), os fanáticos religiosos (que seguem de modo cego e medieval uma interpretação bíblica não conectada à realidade do mundo moderno, propagada por sacerdotes hipócritas que chegam ao cúmulo de associar homossexualidade com pedofilia) e os misóginos (sim, os misóginos, aqueles homens que, mesmo sendo heterossexuais, tem “nojo” das mulheres, as consideram seres inferiores ao homem e sua propriedade meramente reprodutiva; então, associando a homossexualidade ao feminino, o asco contra gays é duplicado).

Quanto às mulheres, a homofobia é bem menor por conta do preconceito que elas mesmo sofreram por milênios (e, ainda sofrem) sob a tutela de seus “senhores”. Vejo aí a explicação para gays masculinos possuírem muito mais amigas que amigos. As mulheres entendem melhor quem sofre preconceito porque elas mesmas o sofrem em muitas circunstâncias e lugares, por mais que nossa sociedade tenha evoluído no tocante aos direitos femininos. Podemos, então, concluir que gays masculinos não são misóginos, não consideram a mulher como inferior a eles, mas como uma referência de beleza, força, coragem e devoção, ou um misto de tudo isso. Não há qualquer relação de submissão, de superioridade ou de inferioridade, entre um gay masculino e uma amiga mulher, seja ela heterossexual ou lésbica. Tanto que Oscar Wilde escreveu: “As mulheres existem para que as amemos, e não para que as compreendamos.” Amar é a suprema aceitação…, pois, para Wilde, “amar é ultrapassarmo-nos”.

Ao elencar esses tipos masculinos de homofóbicos, pessoas que conseguem em público até sorrir para gays, mas que em circunstâncias outras lhes desferem tapas, socos e pontapés, me recordo das palavras de Oscar Wilde em “De Profundis”: “Por detrás da alegria e do riso, pode haver um temperamento vulgar, duro e insensível. Mas, por detrás do sofrimento, há sempre sofrimento. Ao contrário do prazer, a dor não usa máscara.”
E, não usa mesmo! A dor é evidente, é feroz, se instala e não apresenta opções: ou você a enfrenta, ou a enfrenta. Não cabem máscaras nessa luta. Então, em geral, gays falam o que pensam sem dó nem piedade. A dor lhes ensinou a “encurtar o caminho para a salvação” (desculpem, mas não resisti!): a verdade, o discurso direto sem hipocrisia, o saber “se virar” para sobreviver, a coragem para dar a cara a tapa… Afinal, não dizem que “A Verdade vos libertará”? Se existe um Deus, Ele deve se agradar dessa autenticidade, não da hipocrisia dos religiosos que se consideram salvos e que se utilizam da mentira o tempo todo para impedir que tenhamos direitos reconhecidos.

O que pensar, por exemplo, de um senador (diga-se, Magno Malta – PR/ES, pastor evangélico) que maldosamente tenta vincular a homossexualidade à pedofilia? As estatísticas não mentem: a maior parte dos pedófilos são homens heterossexuais! Nada mais lógico, uma vez que os gays são só cerca de 10% das pessoas. Ao dizer que, se aprovado o Projeto de Lei 122 (PLC/122) que criminaliza a homofobia, um pedófilo poderia alegar que “sua orientação sexual é transar com crianças”, o senador demonstra total desconhecimento do Direito e despreparo ao lidar com direitos civis. Na verdade, o que existe é má intenção pura de natureza religiosa!

E, nós, como podemos fazer frente a noções bizarras e mal-intencionadas como a deste pastor-senador e símiles malafaias que se locupletam em seus templos não taxados pelo Brasil afora? Dentro da lei podemos protestar, e o “beijaço” é uma das formas mais interessantes. Usar o “beijo proibido” para tornar evidente “o amor que não ousa dizer o nome” é uma forma pacífica e eficaz de preencher a lacuna que a mídia insiste em deixar vazia.
Pessoas que confundem o beijo gay com promiscuidade demonstram uma ignorância tal que não merece resposta. A promiscuidade existe nas relações humanas, sejam heterossexuais, homossexuais ou bissexuais. Aliás, a quantidade de maridos heterossexuais com suas amantes, algo que está presente em 100% das novelas e séries brasileiras, é a prova de que a promiscuidade é um evento, por dizer assim, democratizado em nossa sociedade, uma espécie de vício social aceitável, qual o “beber moderadamente” ou “socialmente”.

As relações afetivas gays não duram menos que as heterossexuais, e já há pesquisas demonstrando isso. O problema é que a mídia só mostra dos gays a “banda podre” ou o “circo de micos amestrados”. Me refiro à prostituição, aos excessos e aos gays caricatos em programas de humor. Contudo, a prostituição é uma instituição heterossexual praticamente universal! Não foram os gays que a inventaram! E, nos gays caricatos, há um “realce” do comportamento efeminado e do humor que agrada a uns e desagrada a outros. Sem problemas, há espaço para todas as tribos! Mas, querer definir todo o universo gay por uma parcela, com vistas a denegrir o todo, é uma tática “que não é de Deus” (desculpem, não resisti novamente)!

Está chegando a hora do “amor que não ousa dizer o nome” dizê-lo em voz alta, com todas as letras e exigir seus direitos até a última linha da Declaração Universal dos Direitos do Homem e da Constituição Federal. Não seremos encarcerados como o foi Oscar Wilde, a não ser que moremos em algum país islâmico, onde até assassinados sumariamente podemos ser. Então, saiamos às ruas e vamos exigir nossos direitos sociais todos, sem exceção. Temos que evidenciar todo o nosso descontentamento à sociedade. Lembremos do que escreveu Wilde:

O descontentamento é o primeiro passo na evolução de um homem ou de uma nação.”