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segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Opinião sobre Silas Malafaia no “De Frente com Gabi”


Por Rômulo Neiva


Achei por bem escrever sobre o assunto colocando meu ponto de vista, visto que todos nós gozamos das nossas faculdades mentais e temos o mínimo de instrução para, nos despindo de qualquer preconceito, poder examinar ambos os lados e tirarmos nossas próprias conclusões. Não com soberba, ódio e muito menos pregando a intolerância, mas com a plena certeza de que Deus nos deu um cérebro e inteligência o suficiente para usarmos, principalmente em casos como este, onde alguém se levanta para pregar a intolerância e o ódio, ao invés do evangelho de salvação e do amor de Cristo.

Vamos lá...

Eis o vídeo:



O vídeo por si só já mostra muita coisa, basta observar a expressão de ódio e intolerância quando o Sr. Silas Malafaia entra no assunto da homossexualidade, mas ainda assim gera perguntas e dúvidas de pessoas simples que querem viver uma vida de acordo com a vontade de Deus e estão cansadas de gente julgando e apontando o dedo devido à sua orientação sexual (orientação, não escolha como diz Silas, porque é irracional acreditar que uma pessoa escolha viver debaixo de preconceito e intolerância da sociedade e fanáticos religiosos).

Em primeiro lugar é necessário entender que a Bíblia começou a ser escrita há milênios e foi concluída ainda no primeiro século da Era Cristã. Não foi escrita em Português, foi escrita em hebraico com alguns trechos em aramaico (Antigo Testamento) e grego (Novo Testamento). O grego usado era o grego popular (grego coiné) e não o grego clássico, ou seja, possui trechos de difícil interpretação devido ao desuso de muitas palavras. A partir daí surgiram as traduções em diversas línguas, incluindo o nosso Português.

Em segundo lugar, vale também lembrar que o Sr. Silas Malafaia é envolvido com política e, segundo a Revista Forbes, o terceiro pastor mais rico do Brasil. Segundo a Forbes, a fortuna é avaliada em R$ 300.000.000,00 e segundo o próprio Silas, que disse ser inverídica essa informação, a sua fortuna seria de R$ 4.000.000,00. Independente de fortuna e envolvimento com a política, o que mais chama a atenção é sua veemência em acusar e condenar os homossexuais.

A pior mentira que existe é aquela que está embutida em uma verdade. Sim, muita coisa que ele diz é verdade e não queremos julgar a sua sinceridade em querer servir a Deus. O que estamos buscando aqui é, através da própria Bíblia, enxergar o quanto ele está sendo desonesto em interpretar determinados versículos a bel prazer e simplesmente ignorando outros tantos que sabemos que nenhuma igreja cristã hoje em dia segue.

Diz o Sr. Silas que ninguém nasce gay e que homossexualidade é um comportamento aprendido ou imposto. Diz também que 45% dos homossexuais foram abusados quando crianças e que os outros 54% escolheram ser. Diz também que não existe ordem cromossômica ou genética gay e somente ordem cromossômica de macho e fêmea.

Ora, quem é homossexual sabe muito bem que isso não é opção e muito menos uma escolha, visto que é difícil acreditar que alguém escolha sofrer agressões, preconceito e intolerância. Sabemos também através de nós mesmos e de amigos, quantas vezes passamos por situações ou uma fase da vida em que tentamos seguir por outro caminho, tentamos um relacionamento heterossexual e o quanto isso nos custou, justamente por ser perda de tempo.

Sabemos também que esses dados que ele passou são furados, porque milhares de crianças são abusadas diariamente e nem por isso se tornam homossexuais, muito pelo contrário, deram a volta por cima e seguem a sexualidade que sempre tiveram.

E, quanto à ordem cromossômica e gene, ninguém precisa avisá-lo que um homem não deixa de ser homem só porque é homossexual e nem uma mulher deixa de ser mulher porque é lésbica, apenas sente atração por pessoas do mesmo sexo, algo involuntário, não uma escolha, e a ciência até agora não tem nenhuma prova concreta sobre o assunto, nem dizendo que se nasce gay e nem dizendo o contrário.

Em vários momentos ele equipara homossexuais a bandidos e assassinos. É clara a desonestidade dele em relação a isso. A tentativa dele é levar a opinião pública em seu favor, pois Jesus mesmo disse que todo mandamento se resume em dois: Amar ao próximo como a si mesmo e amar a Deus sobre todas as coisas. Tudo se resume nisso. Um homossexual não está prejudicando ninguém por amar uma pessoa do mesmo sexo, mas sabemos muito bem que pedofilia, adultério, assassinato, etc., prejudica uma outra pessoa, e isso sim está fora dos propósitos de Deus.

O Sr. Silas Malafaia também disse que, na visão dele, é muito clara a condenação da Bíblia em relação à homossexualidade e que a Bíblia é para quem quiser crer e, que quem não quiser crer tem todo o direito.

Fica aqui uma pergunta então: se não somos obrigados a crer na bíblia, por que querem impor isso à sociedade impedindo que homossexuais tenham direito ao casamento e proteção?

Outra pergunta: que textos bíblicos são esses que ele tanto fala?

Já sabemos que não podemos interpretar a bíblia sem levar em consideração a língua em que foi escrita, época, autor, cultura da sociedade da época e pra quem aquele texto foi escrito.

Em Levítico, no Antigo Testamento, lemos: “Não te deitarás com homem como se fosse mulher, é abominação”, mas também diz no mesmo livro que é “abominação” comer animais do mar ou do rio sem barbatanas ou escamas. Por que a Igreja condena a homossexualidade mas não a ingestão de mariscos?

No Antigo Testamento também diz para apedrejar até a morte as crianças malcriadas, diz para a mulher no período de menstruação ficar separada do marido, diz para não comer carne de porco, etc... Porque eles usam um texto e simplesmente ignoram e não praticam outros?

Naquela época, quando a Bíblia diz para um homem não se deitar com outro como se fosse mulher, é bem claro que quando uma mulher estava em seu período de menstruação, alguns homens heterossexuais buscavam saciar seu prazer com outros homens que eram homossexuais, não porque eles também eram homossexuais, mas porque queriam se deitar com eles como se eles fossem mulheres para satisfazerem seus desejos. A condenação não está na homossexualidade e sim na promiscuidade e praticar algo que não era de sua natureza.

Quanto a Sodoma e Gomorra, não foram destruídas por causa da homossexualidade como costumam pregar. A Bíblia diz que o povo daquelas cidades abusava dos viajantes, independente de serem homens ou mulheres, simplesmente por prazer também. Não há condenação da homossexualidade e sim da inospitalidade (a hospitalidade era algo muito sagrado para os judeus) e por causa da promiscuidade.

Bom, vimos aqui que usam muito textos do Antigo Testamento para acusar os homossexuais, mas simplesmente ignoram outros textos que eles mesmos acreditam não valer para os nossos dias.

Vamos então ao Novo Testamento.

Trecho do livro de Romanos na versão da Bíblia Almeida Corrigida e Revisada, onde é usada uma linguagem culta e que causa más interpretações (usada pelos evangélicos):

“Porque do céu se manifesta a ira de Deus sobre toda a impiedade e injustiça dos homens, que detêm a verdade em injustiça. Porquanto o que de Deus se pode conhecer neles se manifesta, porque Deus lho manifestou. Porque as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem, e claramente se vêem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem inescusáveis; Porquanto, tendo conhecido a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças, antes em seus discursos se desvaneceram, e o seu coração insensato se obscureceu. Dizendo-se sábios, tornaram-se loucos. E mudaram a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, e de aves, e de quadrúpedes, e de répteis. Por isso também Deus os entregou às concupiscências de seus corações, à imundícia, para desonrarem seus corpos entre si; Pois mudaram a verdade de Deus em mentira, e honraram e serviram mais a criatura do que o Criador, que é bendito eternamente. Amém. Por isso Deus os abandonou às paixões infames. Porque até as suas mulheres mudaram o uso natural, no contrário à natureza. E, semelhantemente, também os homens, deixando o uso natural da mulher, se inflamaram em sua sensualidade uns para com os outros, homens com homens, cometendo torpeza e recebendo em si mesmos a recompensa que convinha ao seu erro. E, como eles não se importaram de ter conhecimento de Deus, assim Deus os entregou a um sentimento perverso, para fazerem coisas que não convêm; Estando cheios de toda a iniqüidade, prostituição, malícia, avareza, maldade; cheios de inveja, homicídio, contenda, engano, malignidade; Sendo murmuradores, detratores, aborrecedores de Deus, injuriadores, soberbos, presunçosos, inventores de males, desobedientes aos pais e às mães; Néscios, infiéis nos contratos, sem afeição natural, irreconciliáveis, sem misericórdia; Os quais, conhecendo a justiça de Deus (que são dignos de morte os que tais coisas praticam), não somente as fazem, mas também consentem aos que as fazem.” Romanos 1:18-32 (Versão Almeida Corrigida e Revisada)

Agora vamos ver o mesmo trecho do livro de Romanos, só que na versão da Bíblia A Mensagem, onde é usada uma linguagem contemporânea e mais usual para os nossos dias. Diz as mesmas coisas, mas com outras palavras (também usada pelos evangélicos):

“Mas o furor divino é despertado pela falta de confiança do ser humano em Deus, pelos erros repetidos, pela mentiras acumuladas e pela manipulação da verdade. Mas a verdade essencial sobre Deus é muito clara. Abram os olhos e poderão vê-la! Se analisarem com cuidado o que Deus criou, serão capazes de ver o que os olhos deles não enxergam: o poder eterno, por exemplo, e o mistério do ser divino. Portanto, ninguém tem desculpa. Vejam o que aconteceu: a humanidade conhecia Deus perfeitamente, mas deixou de tratá-lo como Deus, recusando-se a adorá-lo, e foi reduzida a um tão terrível estado de insensatez e confusão que a vida humana perdeu o sentido. Eles fingem saber tudo, mas são ignorantes sobre a vida. Trocaram a glória de Deus, que sustenta o mundo, por imagens baratas vendidas na feira. Então Deus se pronunciou: “Se é isso que vocês querem, é o que terão”. Não demorou muito para que fossem viver num chiqueiro, enlameados, sujos por dentro e por fora. Tudo porque trocaram o Deus verdadeiro por um deus falso e passaram a adorar o deus que fizeram no lugar do Deus que os fez - o Deus a quem bendizemos e que nos abençoa. Loucura total! Então aconteceu o pior. Como se recusaram conhecer Deus, logo perderam a noção do que significa ser humano: mulheres não sabiam mais ser mulheres, homens não sabiam mais ser homens. Sexualmente confusos, abusaram um do outro e se degradaram, mulheres com mulheres, homens com homens - pura libertinagem, pois de modo algum isso pode ser amor. Mas eles pagaram caro por isso, e como pagaram: são vazios de Deus e do amor divino, perversos infelizes e sem amor humano. Uma vez que eles não se importaram em reconhecer Deus, Deus desistiu deles e os deixou por conta própria. A vida deles agora é uma confusão só, um mal que desce ladeira abaixo. Eles tomam à força o que é alheio, são ambiciosos e caluniadores. Cheios de inveja, violência, brigas e trapaças, fizeram da vida um inferno. Olhem para eles: são maliciosos, venenosos, críticos ferozes de Deus, brigões, arrogantes, gente vazia e insuportável! Mestres em criar meios de destruir vidas e revoltados contra os pais. Não passam de seres tolos, asquerosos, cruéis e intransigentes. Até parece que eles não sabem o que fazem, mas têm plena consciência de que estão cuspindo no rosto de Deus - e não se importam! Pior ainda, premiam quem faz as piores coisas com eficiência.” Romanos 1:18-32 (Versão A Mensagem)

Ambas as traduções acima são aceitas e usadas pelos evangélicos, mas há uma nítida clareza no segundo texto (versão A Mensagem), onde a tradução e linguagem é muito mais fiel ao original e mostra a verdadeira condenação do texto.

A condenação está na prática da idolatria, trocar a adoração a Deus pela adoração de criaturas. Qualquer pessoa que concluiu o primeiro grau sabe que naquela época, no império romano, as pessoas adoravam vários deuses e praticavam cultos que envolviam a prostituição. Eram pessoas heterossexuais que iam contra a natureza e praticavam a homossexualidade por adoração a outros deuses, essa prática é conhecida como prostituição ritualística e era comum e considerada normal naquela época. Não existe nenhuma condenação aos homossexuais e sim condenação à idolatria e à prática do sexo descontrolado, sem envolvimento de amor, a troca da natureza sexual por outra que não lhe condiz. Está muito claro isso, tanto é que logo em seguida há uma descrição de como são essas pessoas, e isso vale tanto para heterossexuais quanto para homossexuais.

Por isso não devemos interpretar a Bíblia ao pé da letra. Temos que levar em consideração época, língua, cultura e para quem foi escrita (Neste caso em particular, obviamente a carta foi escrita aos romanos).

Outro texto usado no Novo Testamento é o seguinte:

Trecho do livro de I Coríntios na versão da Bíblia Almeida Corrigida e Revisada, onde é usada uma linguagem culta e que causa más interpretações (usada pelos evangélicos):

“Não sabeis que os injustos não hão de herdar o reino de Deus? Não erreis: nem os devassos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os sodomitas, nem os ladrões, nem os avarentos, nem os bêbados, nem os maldizentes, nem os roubadores herdarão o reino de Deus.” 1Coríntios 6:9-10 (Versão Almeida Corrigida e Revisada)

Agora vamos ver o mesmo trecho do livro de I Coríntios só que na versão da Bíblia A Mensagem, onde é usada uma linguagem contemporânea e mais usual para os nossos dias. Diz as mesmas coisas, mas com outras palavras (também usada pelos evangélicos):

“Não percebem que esse não é o caminho de se viver? Os injustos, que não se preocupam com Deus, não farão parte de seu Reino. Quem usa e abusa das pessoas, do sexo, da terra e de tudo que nela existe não se qualifica como cidadão do Reino de Deus. Estou falando de libertinagem heterossexual, devassidão homossexual, idolatria, ganância e vícios destruidores.” 1Coríntios 6:9-10 (Versão A Mensagem)

Novamente a segunda tradução deixa muito mais claro o que se refere o texto. Não há condenação aos homossexuais e sim à promiscuidade e devassidão heterossexual e homossexual.

As palavras no original são "Malakoi" e "Arsenokoitai", ficando assim: “Não vos enganeis: nem impuros, nem idólatras, nem adúlteros, nem “malakoi”, nem “arsenokoitai”, nem ladrões, nem avarentos, nem bêbados, nem maldizentes, nem roubadores herdarão o reino de Deus.”

Porém, como disse anteriormente, são palavras no grego coiné, grego popular, onde muitas palavras perderam seu sentido com o passar do tempo, significando respectivamente: mole ou “pele macia” e homem-cama.

Difícil entender né? Por isso usamos o contexto para usarmos uma palavra mais adequada em nossa língua. Mole ou “pele macia” naquela época eram homens covardes que agiam como mulheres para fugirem das responsabilidades, e não efeminados como alguns preferiram traduzir, e Homem-cama é relacionado a homens que se prostituíam e eram promíscuos, nada intimamente relacionado com a homossexualidade. Enfim, está relacionado com pessoas covardes e promíscuas (prostituição, pedofilia, pederastas, etc).

Muitos teólogos e igrejas hoje em dia reconhecem essa má interpretação dos textos originais e estão usando versões contemporâneas da Bíblia, justamente para não caírem nesse erro grotesco de condenarem os homossexuais onde a Bíblia não condena. Resultado disso tudo é a aceitação de homossexuais por partes da Igreja Anglicana, Luterana, Presbiteriana, Igrejas Inclusivas, entre outras...

Vimos acima que os evangélicos fanáticos usam versos do Novo Testamento para condenar os homossexuais, mas novamente vem aquela pergunta: por que eles usam uns versos para condenar os homossexuais e esquecem de outros versos com mandamentos claros referentes à igreja e que nenhuma delas praticam hoje em dia?

Exemplo:

“Conservem-se as mulheres caladas nas igrejas, porque não lhes é permitido falar; mas estejam submissas como também a lei o determina”. I Cor. 14:34.

“Que a mulher aprenda em silêncio, com total submissão. A mulher não poderá ensinar nem dominar o homem.” I Timóteo 2:11-12

Ora, sabemos muito bem que existem pastoras em quase todas as igrejas, e nas igrejas que não tem pastoras tem diaconisas e líderes mulhres que pregam e ensinam.

“Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, e segue-me.” Mateus 19:21

Opaaaaa, como assim? Tenho R$ 4.000.000,00 em dinheiro e bens, venderei tudo e darei aos pobres??? Ahhh não, melhor pular esse trecho da Bíblia. (Imagino que o Sr. Silas ao ler este trecho deve pensar assim).

Óbvio que determinados conceitos no Novo Testamento não servem para nossos dias. Devemos levar em consideração que as coisas mudam e que permanece apenas o respeito a Deus e ao próximo que devemos ter. Tudo na Bíblia é inspirador e digno de total confiança, o que não se pode é confundir algo que foi escrito para determinada época e cultura e querer viver isso hoje.

Enfim, seria necessário várias páginas para abordar o assunto mais a fundo, mas acredito que as coisas ditas acima são o suficiente para abrir nossas mentes e entendermos mais honestamente o assunto. Existe muito material disponível na internet e que são muito mais esclarecedores.

Espero com isso ter ajudado algumas pessoas e incentivado outras a pesquisarem melhor sobre o assunto e não somente ouvir de um pastor qualquer absurdo grotesco e sair por aí divulgando preconceito e intolerância sem ao menos pesquisar. Existem, sim, muitas pessoas inteligentes pregando o contrário, mas o fato é que a inteligência pode ser usada para o bem e para o mal, cabe a nós escolher um dos caminhos.

Não há erro nenhum em ser homossexual e ser cristão. O erro e ignorância está na cabeça de quem quer acobertar os próprios pecados acusando os outros. Não revide esses tipos de ofensas, a melhor resposta é ignorar e demonstrar amor.

"Com efeito: Não adulterarás, não matarás, não furtarás, não darás falso testemunho, não cobiçarás; e se há algum outro mandamento, tudo nesta palavra se resume: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. O amor não faz mal ao próximo. De sorte que o cumprimento da lei é o amor." Romanos 13:9-10


Sobre o autor


Rômulo Neiva tem 30 anos e nasceu em Santo André – SP. Aos 17 anos converteu-se à Igreja Batista, a qual ainda frequenta, mas sem envolvimento em liderança. Cursou Teologia por 4 anos na Faculdade Teológica Batista e hoje defende e crê na Teologia Inclusiva. Se considera apenas um cristão que ama Teologia, mas que dispensa o título de teólogo.

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Desconstruindo as ideias do livro de cabeceira dos fundamentalistas religiosos


Por Leandro Colling (cfe. publicado originalmente em http://www.ibahia.com/a/blogs/sexualidade/2012/08/30/desconstruindo-as-ideias-do-livro-de-cabeceira-dos-fundamentalistas-religiosos/)


Depois de uns dias de férias, retomaremos o nosso blog. Meu texto de hoje é longo e irá tratar sobre o livro A estratégia – o plano dos homossexuais para transformar a sociedade, recentemente publicado no Brasil pela editora Central Gospel Ltda, de autoria do reverendo norte-americano Louis P. Sheldon.

Tive que ler o livro a pedido do Conselho Nacional LGBT, do qual faço parte. Para quem não sabe, o Conselho foi criado no final do governo Lula e implantado no início do governo Dilma para elaborar e acompanhar as políticas públicas para a população LGBT. Elaborei um parecer do livro para o Conselho, que será enviado para que a Procuradoria Geral da República avalie se a obra viola a legislação brasileira em vigor e, com base nisso, tome as providências cabíveis.

O texto que posto aqui não é igual ao que o Conselho irá publicar em breve, pois foi adaptado para o nosso blog. O conteúdo, basicamente, é o mesmo. O livro A estratégia revela porque estamos vendo hoje no Brasil uma grande articulação de determinados fundamentalistas religiosos para tentar barrar o avanço de direitos e cidadania plena para a população LGBT. Você verá aqui como este livro tem servido para fomentar o ódio, a discriminação, a intolerância para com qualquer pessoa que não viva dentro de um conjunto bem rígido de normas.

O reverendo Louis P. Sheldon, autor do livro A estratégia – o plano dos homossexuais para transformar a sociedade, tem o explícito objetivo de convocar os religiosos do mundo para lutarem contra os direitos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais ou qualquer outra pessoa que não viva dentro de um modelo muito restrito de heterossexualidade, que pressupõe, por exemplo, o sexo apenas depois do casamento;

Para tentar atingir o seu objetivo, Sheldon recorre a algumas controversas ideias religiosas, distorce uma série de dados e, principalmente, mente sobre outra série de evidências históricas, amplamente estudadas e conhecidas pela sociedade. Tudo isso é feito para atingir o seu grande objetivo, explícito já na página 6 do texto. Diz ele: “(…) não são apenas os terroristas estrangeiros que devemos temer hoje. Os radicais mais perigosos que ameaçam nosso estilo de vida são aqueles que vivem entre nós (…) e você pode ter certeza de que eles nos destruirão se não tomarmos medidas para derrotar o movimento radical deles agora”;

Sheldon, em vários momentos, defende que a homossexualidade não é “natural e normal”. Cita, inclusive, alguns estudos acadêmicos que tentaram descobrir o “gene gay”. Para Sheldon, uma vez que ainda não se descobriu uma causa genética para a homossexualidade, os LGBT não são normais e, por isso, devem ser curados e não devem ter direitos. Ele defende, inclusive, na página 28, que a homossexualidade volte a ser considerada uma doença. Na página 251 defende que a homossexualidade seja tratada e na página 114 revela que ele próprio já realizou “terapias recuperadoras” em sua igreja nos Estados Unidos.

Como todos sabem, no dia 17 de maio de 1990, a Organização Mundial de Saúde (OMS) retirou o “homossexualismo” da lista internacional de doenças. No Brasil, o Conselho Federal de Psicologia emitiu a resolução 01/1999, que proíbe qualquer psicólogo realizar algum tratamento para reverter a homossexualidade de algum paciente[1].

Realmente, os estudiosos da sexualidade ainda não chegaram a um consenso sobre se existe ou não algum componente genético que interfira ou gere a orientação sexual homossexual. Mas isso jamais pode ser uma razão para defender a patologização, a violência e o ódio para com os LGBT. Os/as estudiosos/as não possuem respostas “genéticas” para a homossexualidade, mas oferecem muitas outras respostas sobre como as pessoas, ao longo de suas vidas, passam a ter determinada orientação sexual e determinada identidade de gênero.

Os estudos[2] apontam que existem diversas orientações sexuais e identidades de gênero com as quais uma pessoa pode vir a se identificar. Nesse processo de identificação não existe apenas um fator ou ator social que influencia as pessoas. Trata-se de um complexo processo de identificação. Portanto, qualquer orientação ou identidade é legítima. A heterossexualidade é tão legítima quanto a homossexualidade, a bissexualidade ou a travestilidade. Todas são formas de vivenciar as múltiplas sexualidades e os gêneros.

Por isso, se a pergunta é qual a causa da homossexualidade, deveríamos também nos perguntar, como já fazia Freud, quais as causas da heterossexualidade. Assim como não existe consenso sobre a existência de um “gene gay”, também não existe um “gene heterossexual” e nem por isso os heterossexuais devem deixar de ser respeitados. Ou seja, o que efetivamente sabemos, e o livro de Sheldon é mais uma prova empírica disso, é que determinados setores da sociedade exigem que todas as pessoas devem ser heterossexuais. Por isso, a heterossexualidade é que se torna uma norma que todos devem seguir, que todos são obrigados a seguir;

Para Sheldon, os LGBT são um risco à sociedade porque desejam “destruir a família”. Ao acionar o ideal de família nuclear burguesa (pai, mãe, filhos), Sheldon novamente distorce evidências históricas amplamente estudadas por pesquisadores/as do mundo inteiro[3]. O que dizem esses estudos?

1. A família, tal qual concebe Sheldon, é também fruto de um longo processo histórico. Nem sempre existiu essa configuração familiar defendida por Sheldon. Basta lembrar da existência dos clãs, que são anteriores às famílias de hoje, e dos casamentos arranjados, nos quais as noivas eram escolhidas pelos pais do noivo.

2. As pessoas pobres, em especial as brasileiras, sabem muito bem que esse ideal de família defendido por Sheldon é tipicamente burguês. Nossas famílias são construídas em uma ampla diversidade de combinações, com filhos/as sendo criados/as por avós, tios, vizinhos, amigos, ou com apenas a presença da mãe[4].

Ou seja, ao defender apenas um tipo de constituição familiar, Sheldon, na verdade, atenta contra boa parte das constituições familiares que existem em nossa sociedade, disseminando o seu ódio para além da população LGBT;

3) Sheldon diz: “desde a época de Adão e Eva, as sociedades civilizadas entendem que a família consiste em uma mãe, um pai e os filhos”. Ora, além de exigir que todos acreditem na existência de Adão e Eva, Sheldon ignora que nem sempre o homem viveu em chamadas “sociedades civilizadas” tais como as conhecemos hoje. Trata-se de um pensamento tipicamente criacionista, que mente sobre dados e evidências históricas amplamente estudadas por pesquisadores do mundo, que demonstram que, ao longo da sua história, a humanidade passou por momentos de “barbárie” e com vários tipos de arranjos familiares;

4) Muitos LGBT, ao contrário do que diz Sheldon, gostam tanto dessa constituição familiar que desejam constituir uma, mas dentro de uma perspectiva ampliada, um pouco diferente. Tanto isso é verdade que o Supremo Tribunal Federal reconheceu, em 5 de maio 2011, a união estável entre pessoas do mesmo sexo. O STF entendeu que o artigo 3º, inciso IV, da Constituição Federal, veda qualquer discriminação em virtude de sexo, raça, cor e que ninguém pode ser diminuído ou discriminado em função de sua orientação sexual.

Ou seja, ao contrário do que apregoa Sheldon, a civilização nunca teve como base apenas um tipo de configuração familiar, mas uma ampla variedade de configurações familiares e de conjugalidades. Novamente fica explícito o quanto o pensamento de Sheldon se configura em um atentado à diversidade da sociedade como um todo, e não apenas contra a população LGBT;

Para provocar o ódio para com a população LGBT, Sheldon defende que os homossexuais disseminam o que ele chama de uma “cultura de morte” ou “estilo de morte” e não “estilo de vida”. Para ele, a Aids, as demais doenças sexualmente transmissíveis, a depressão e até o número de suicídios de jovens homossexuais comprovariam a sua “tese”. Para isso, ele usa de uma série de dados estatísticos que informam que o vírus HIV e os suicídios atingem mais os LGBT do que os heterossexuais, em especial os monogâmicos.

Para Sheldon, os homossexuais é que são culpados por serem vítimas da Aids e por cometerem suicídios. Trata-se de mais uma leitura absurdamente equivocada, intencionalmente distorcida para pregar o ódio. O que os movimentos sociais e os estudos mais respeitados informam é que a Aids vitimou e ainda vitima mais a população LGBT porque, entre várias outras razões, governos conservadores como o de Ronald Reagan, que Sheldon tanto elogia, não realizaram rapidamente ações de combate à disseminação do vírus HIV porque, inicialmente, ele estava atingindo mais os homossexuais.

Esse dado histórico, motivado pela homofobia institucional de um governo, é solenemente ignorado por Sheldon. Foi por causa disso que um movimento social como o ACTUP, que Sheldon desonestamente critica, precisou realizar ações de desobediência civil para chamar a atenção da sociedade americana sobre o que estava acontecendo naquele momento nos EUA[5]. Até os cientistas políticos mais liberais defendem a legitimidade da desobediência civil em determinados momentos dentro de uma democracia[6]. Além disso, em nenhum momento Sheldon considera que os suicídios dos LGBT são motivados pelo fato dos heterossexuais radicais não aceitarem a diversidade sexual e de gênero existente em nossa sociedade. Ou seja, dentro da perspectiva de Sheldon, os LGBT se contaminam e se matam porque querem.

Em determinado momento, ele inclusive cita que alguns gays transam sem o uso do preservativo, o que seria prova de que os homossexuais desejam se contaminar. Ainda que existam alguns gays que resistem ao uso de preservativos, o que falta dizer é que não são apenas determinados LGBT que não usam preservativos, mas também milhares de heterossexuais fazem o mesmo e não são considerados, por causa disso, disseminadores de uma “cultura de morte”.

Além disso, Sheldon liga sempre a pedofilia com a homossexualidade, como se essa prática, considerada criminosa, não fosse encontrada entre a população heterossexual.

Outra ideia recorrente no livro ataca toda e qualquer ação nas escolas e universidades que vise o respeito à diversidade sexual e de gênero. Sheldon diz que estas ações teriam o objetivo de ensinar os estudantes a serem homossexuais (página 12) e de promover a homossexualidade. Diz que as universidades “estão tomadas por uma epidemia da diversidade” (página 176).

Trata-se de mais uma leitura equivocada, com a evidente intenção de disseminar o ódio homofóbico. O que os movimentos sociais e educadores defendem é que a escola seja um local onde se ensine o respeito à diversidade[7]. Os estudos acadêmicos, já desenvolvidos em vários lugares do mundo e que, nos últimos anos, têm crescido muito nas universidades brasileiras, mesmo com perspectivas metodológicas e teóricas distintas, são enfáticos ao defender que todas as orientações sexuais e todos os gêneros são legítimos e construídos também culturalmente.

Muitos desses estudos[8] desmentem outra ideia de Sheldon, a de que o comportamento homossexual foi proibido em toda a história da humanidade (página 251). Há dezenas de reconhecidos estudos, todos solenemente ignorados por Sheldon, que relatam que o sexo entre pessoas do mesmo sexo nem sempre foi considerado algo problemático em outros períodos históricos e sociedades. O que estes estudos apontam é que a partir do século 19 é que a homossexualidade passa a ser patologizada e criminalizada, através de uma impressionante sintonia entre igreja, Estado e cientistas.

O simples fato de promover estudos como esses e incentivar o debate para o respeito à diversidade é entendido por Sheldon como proselitismo gay. Historicamente, o que ocorreu e ainda ocorre é que as famílias, as escolas e a sociedade em geral ensinam, de forma coercitiva e autoritária, que todos sejam heterossexuais. Se existe alguma promoção em curso, há séculos, é em relação à heterossexualidade e não em relação à homossexualidade.

Em vários trechos, Sheldon ataca o Estado Laico. Na página 89, defende explicitamente um Estado com religião. Diz que “a separação entre Igreja e Estado é uma mentira”, mas defende que o Estado não interfira na religião e que os professores deveriam ter liberdade de ensinar religião aos seus estudantes.

No final do livro, ele conclama as pessoas a se unirem contra o Estado Laico (página 222). Trata-se, portanto, de uma ideia que atenta para um princípio base do sistema democrático. A separação entre a religião e o Estado permitiu que a diversidade religiosa fosse respeitada, o que possibilitou o fim de muitos e sangrentos conflitos. Portanto, a ideia de Sheldon representa um atentado ao Estado Democrático de Direito e a todas as denominações religiosas que não compactuam com as suas leituras fundamentalistas.

Portanto, suas ideias, como podemos ver, tentam acabar com outras expressões da diversidade existentes em nossa sociedade. Sheldon, por exemplo, além de atacar todas as pessoas que vivem em famílias diferentes da nuclear burguesa, vincula a decadência da sociedade com as conquistas das mulheres (página 39), ataca os adeptos do “amor livre” (página 69) e, ao tratar de promiscuidade, diz que as jovens usam roupas muito curtas e estimulam os homens (página 190). Por fim, ainda critica duramente os negros “de esquerda” (página 224) que defendem os direitos de LGBT.

Em vários momentos Sheldon diz que o livro que mais inspira os homossexuais é Minha luta, de Hitler. Como é de conhecimento público, um dos principais objetivos dos nazistas era o de aniquilar todas as pessoas diferentes, que não fossem brancas, tidas como saudáveis, fortes e heterossexuais. Centenas de homossexuais foram assassinados pelos nazistas. Ou seja, como poderiam os LGBT ter como fonte de inspiração um livro de Hitler? Por sinal, um livro proibido de circular por incitar o ódio antissemita. É exatamente a produção do ódio o que Sheldon faz em relação aos milhares de LGBTs existentes no mundo.

Sobre o autor



Leandro Colling, gaúcho atualmente residindo em Salvador (BA), é Professor da UFBA, coordenador do grupo de pesquisa Cultura e Sexualidade (CUS) e Presidente da Associação Brasileira de Estudos da Homocultura (Abeh - gestão 2011 - 2012).



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[1] Ver em  http://pol.org.br/legislacao/pdf/resolucao1999_1.pdf

[2] Ver, por exemplo: BUTLER, Judith. Problemas de gênero – feminismo e subversão da identidade. Trad. Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008; LOURO, Guacira Lopes. (org.). O corpo educado – Pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2010.

[3] Ver, por exemplo, os clássicos ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do estado. 15ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002, e LEVI-STRAUSS, CLAUDE, As estruturas elementares do parentesco. Rio de Janeiro: Vozes.

[4] Ver dados do IBGE em http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=774

[5] Sobre esse tema, ler MISKOLCI, Richard.  “A Teoria Queer e a Sociologia”, em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-45222009000100008

[6] Ler, por exemplo, RAWLS, John. O liberalismo político. São Paulo: Editora Ática, 2000.

[7] Ler, por exemplo, LOURO, Guacira Lopes et al. (orgs). Corpo, Gênero e Sexualidade: um debate contemporâneo na educação. Petrópolis: Vozes, 2003

[8] Ver, por exemplo, FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade I: a vontade de saber. São Paulo: Graal, 2005.

terça-feira, 31 de julho de 2012

As eleições 2012 e a ofensiva do Fundamentalismo


Por Julian Rodrigues


Estamos no início da temporada eleitoral. Daqui a pouco as campanhas invadem as TVs. No próximo dia 7 de outubro o Brasil vai às urnas para escolher seus novos vereadores e vereadoras - e seus novos prefeitos e prefeitas. Nas cidades com mais de 200 mil eleitores pode ocorrer segundo turno, que realizar-se-á no dia 28 de outubro.

O cenário no qual se acontecem essas eleições - no que se refere ao avanço da agenda da cidadania LGBT - não é dos melhores. Pelo contrário. Embora tenha aumentado o número de pessoas assumidamente LGBT a se candidatar - a ABGLT está organizando uma lista, inclusive com candidatos e candidatas aliadas (http://www.abglt.org.br/port/eleicoes2012.php) – há vários sinais de que crescerá a influência política e a representatividade do fundamentalismo religioso nessas eleições. Sobretudo nas casas legislativas.

Os reacionários querem reeditar o cenário de 2010, quando uma aliança “santa” entre evangélicos pentecostais/neopentecostais e bispos católicos conseguiu colocar no centro da campanha presidencial o debate relacionado aos direitos reprodutivos das mulheres (aborto legal) e sobre reconhecimento dos direitos da população LGBT.

Foi nesse momento que um dos ícones da homofobia militante no Brasil, Silas Malafaia, apoiou Serra (que surfou no conservadorismo mais rasteiro). Dilma, por outro lado, fez uma “carta aos cristãos” e se comprometeu a congelar a agenda feminista em seu governo (e, agora percebemos, também a do movimento LGBT). Enquanto isso, Marina (quase pastora) pregava contra o casamento homossexual – coisinha trivial para quem já defendeu o criacionismo.

As consequências desse movimento regressivo e anti-laico foram sentidas demais da conta. Governos municipais, estaduais – e o governo federal – recuaram na execução de políticas afirmativas dos direitos LGBT. E a homofobia cresceu a olhos vistos, em todo o Brasil.

Em 2012 não é diferente. O obscurantismo quer avançar mais. A Assembleia de Deus , por exemplo, se prepara para eleger um vereador em cada cidade do Brasil.

Em São Paulo e no Rio de Janeiro, essa igreja (a do Malafaia) apoia quem está na frente das pesquisas para prefeito. Serra e Paes, respectivamente. No Rio é mais preocupante ainda, porque o prefeito Eduardo Paes foi um aliado. Criou a coordenadoria LGBT (dirigida pelo Carlos Tufvesson, personalidade de destaque, estilista talentoso e militante comprometido) e fez várias ações. Depois da aliança com o homofóbico pastor o que sobreviverá da nossa pauta em um eventual próximo governo carioca ?

Essa desenvoltura com que as igrejas cristãs atuam no espaço público e partidário com sua pauta moral -teológica (que é política, na verdade), intimida candidatos e candidatas de todos partidos. Embora geralmente se abriguem nas agremiações de direita e centro-direita, os fundamentalistas religiosos são flexíveis, pragmáticos. Incidem (ou chantageiam) candidaturas de todo o espectro ideológico. Fazem o que for melhor, em cada cidade, para seus interesses imediatos.

Os princípios fundamentais dos direitos humanos, da democracia, do pluralismo e da laicidade do Estado não fazem parte do repertório dos líderes cristão fundamentalistas. Anuncia-se uma onda conservadora de grandes proporções.

Como o Brasil não é os Estados Unidos há espaço, condições e tempo para uma reação progressista. Antes que as trevas avancem demais.


Sobre o autor

Julian Rodrigues, é membro do grupo Corsa, ativista da Aliança Paulista LGBT e consultor da ABGLT.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Eu, Mulher, Hétero, Brasileira, Mãe, Crente em Nossa Senhora…

Por Maju Giorgi (cfe. Consta no link original em http://www.eleicoeshoje.com.br/eu-mae-mulher-hetero-brasileira-crente-em-nossa-senhora)


Resposta de uma mãe as acusações de um pastor


Relembremos alguns fatos:

“AFRICANOS DESCENDEM DE ANCESTRAL AMALDIÇOADO POR NOÉ. ISSO É FATO.”

(Pastor e Deputado Federal MARCO FELICIANO)

“O caso envolvendo o deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP), que afirmou nessa quarta-feira (30/03/2011), no Twitter, que os “africanos descendem de um ancestral amaldiçoado”, deverá será analisado pela Corregedoria da Câmara dos Deputados. A presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, deputada Manuela d’Avila (PCdoB-RS), disse que irá encaminhar as mensagens do parlamentar para o órgão.” (Esta informação está disponível na internet para todos que queiram ver)

“Sem dúvida, avançamos muito na luta contra o racismo, mas não o extirpamos totalmente. Hoje, pelo menos, sabemos que não se deve discriminar ninguém e é de mau gosto alguém se proclamar racista. Mas nada disso existe no que se refere a gays, lésbicas e transexuais. Quanto a eles, podemos desprezar e maltratar impunemente. Eles são a demonstração mais reveladora de quão distante boa parte do mundo ainda está da verdadeira civilização.” (Mario Vargas Llosa)

As polêmicas ainda atuais envolvem outro pastor, o Malafaia.

Pastor Silas Malafaia, DISCURSO DE ÓDIO NÃO É LIBERDADE DE EXPRESSÃO… É CRIME OU, PELO MENOS, DEVERIA SER!

O Pastor quer fazer crer que LGBTs, afrontam o povo negro quando pedem a aprovação do PCL122.

A alegação do Pastor Malafaia é que ser negro não é comportamento, ser gay é. E que querem equiparar o PCL 122 a lei do racismo. Desta forma acho que estamos afrontando a todo ser humano protegido por lei especial. Pastor, caso o senhor não acredite na palavra de milhões de mães e pais heterossexuais, de famílias heterossexuais, presentes, dedicados, livres da promiscuidade que o senhor tanto condena, muitas vezes religiosos praticantes e fervorosos que tiveram filhos gays pelo mundo afora, MAS que não teriam a suficiente credibilidade para o senhor, incontáveis, estudos científicos tem saído todos os dias para provar que homossexualidade NÃO é comportamento, é CONDIÇÃO.

Eu gostaria que o senhor me provasse a sua teoria. Vou fazer uma pergunta: Ser judeu é comportamento ou condição ou a que categoria pertence, para que eu possa entender melhor?

A grande diferença, Pastor, é que ser negro, mulher, pessoa com deficiência, criança ou idoso, É CONDIÇÃO VISTA A OLHO NU, ser gay, não. Mas vamos aos estudos.

Cito alguns recentes:

I - Dr. Jerome Goldstein, diretor do San Francisco Clinical Research Center (EUA) enfatizou que “A orientação sexual NÃO É UMA QUESTÃO DE ESCOLHA, é principalmente questão neurobiológica pré natal. Existem vínculos inegáveis. Nós queremos torná-los visíveis”.” Confira aqui: http://www.medicalnewstoday.com/releases/226963.php

II - A neurocientista sueca Ivanka Savic, do Instituto Karolinska de Estocolmo e os estudos com gêmeos homossexuais. Confira aqui: http://www.pnas.org/content/105/27/9403.abstract?sid=319b7033-3b4e-48bc-a3db-e8dba26b1260

III - O trabalho Anglo-Sueco da Queen Mary University of London. Leia aqui: http://www.qmul.ac.uk/qmul/news/newsrelease.php?news_id=1075

Então, muito rapidamente e só pra começar, podemos pelo menos colocar uma dúvida nessa sua VERDADE que LGBTS afrontam os negros por quererem uma lei que os proteja. Aliás, me parece que não são os gays que perseguem os seguidores das religiões Afro incansável, sistemática e dedicadamente.

O senhor acha dentro desse seu total entendimento de que uma atitude isolada de uma pessoa ou algumas pessoas em uma Parada que reúne milhões de pessoas pertencentes a um grupo que só no Brasil soma muito mais de 10 milhões de pessoas, lhe dá o direito de conclamar os católicos a “baixar o porrete” nos gays ou algo parecido? (fato pelo qual o senhor foi chamado ao ministério público)

Será que gays poderiam usar desta mesma artimanha, quando um pastor evangélico quebra a marteladas um dos símbolos mais amados da Igreja Católica?

Poderiam homossexuais conclamar os católicos a “baixar o porrete” nos evangélicos?

Ou neste específico caso seria uma atitude isolada?? “É” uma atitude isolada, Pastor. Julgar todo um povo por atitudes de um, não é arma justa nem legítima.

É neste tipo de mundo que o senhor quer viver Pastor Malafaia, uma guerra declarada entre tudo e todos??? Ou o que o senhor realmente quer é que todos abaixem a cabeça ao senhor, ao que o senhor ACHA, ao que o senhor SUPÕE, ao que o senhor IMAGINA, ao que o senhor ACREDITA?

De que forma o senhor ama os gays???

Desde que eles não sejam gays??? Desde que se limitem ao lugar de cidadão de segunda categoria reservado a eles, onde se tem muitos deveres, poucos direitos e as vozes caladas???

AH…A Mãe de Jesus Cristo, A Nossa Senhora, A Virgem Maria tão amada. Foi a ela que entreguei meus filhos quando nasceram. E é a ela que peço TODOS os dias que cubra com seu manto sagrado, MEU FILHO GAY, quando ele sai as ruas do país CAMPEÃO MUNDIAL EM CRIMES HOMOFÓBICOS, sem LEI que o proteja, sendo alvo certo e constante do ÓDIO incessantemente propagado. Porque Pastor, eu sei que NESTE caso o amor realmente é inconteste e incondicional. Foi ela A NOSSA SENHORA, a protetora dos MEUS filhos que eu vi ser quebrada a marteladas e pontapés, mas em nome dela, eu peço a PAZ, porque ela é AMOR.

O alento a meu coração de mãe, é que existem bons cristãos no mundo, vide o Padre Jesuíta Luís Corrêa Lima e o Pastor Ricardo Gondim que assopram vida e luz em almas torturadas por pessoas como o senhor! Isso é ser cristão, amar, compreender, evoluir, aceitar. Isso é ser HUMANO, isso é viver no AMOR. Ser gay não se escolhe, não se ensina, homossexualidade não se transmite por contágio.

Quando o senhor se refere a “ditadura gay”, o senhor se refere a que exatamente? Alguém já ouviu falar em Bancada Gay? Televisão Gay? Rádio Gay? Ministro Gay? Tem certeza que é gay a ditadura que esta sendo instaurada??

VIVA E DEIXE VIVER, PASTOR.

Gays são uma minoria e contam apenas com suas vozes nessa luta tão injusta.

Por isso eu peço a TODO O POVO LGBT, seus pais, suas famílias e seus amigos que se assumam num ato político por um Brasil e um mundo melhor.

Vamos lutar para que TODAS as brasileiras e brasileiros tenham seus direitos assegurados pela Constituição. Mesmo que para isso se criem leis especiais.

ATÉ O DIA 6 DO MÊS DE ABRIL DESTE ANO DE 2012, 106 JOVENS HOMOSSEXUAIS FORAM TORTURADOS CRUELMENTE COM TODO TIPO DE REQUINTE, OLHOS PERFURADOS, DEDOS ARRANCADOS, CRÂNIOS ESMAGADOS E FINALMENTE MORTOS. E ESSE NÚMERO NÃO PARA DE CRESCER. POR TUDO ISSO…

EU, MULHER, HETEROSSEXUAL, CASADA, BRASILEIRA, MÃE, CRENTE EM NOSSA SENHORA, CIDADÃ DE UM PAÍS LAICO E DEMOCRÁTICO, PEÇO A APROVAÇÃO DA PCL 122!!!

Eu dedico a minha luta às “MÃES PELA IGUALDADE”, algumas das quais já tiveram seus filhos levados pela homofobia e mesmo assim se levantam TODOS os dias para defender e proteger TODOS os filhos gays.


Sobre a autora

Maju Giorgi, uma das “Mães pela Igualdade”, um grupo de mães de todos os lugares do Brasil que estão unindo suas forças para dar um recado claro contra a discriminação, a violência e a homofobia crescentes, que estão saindo do controle no país.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

A estratégia de Malafaia ou quando mentir é um bom negócio

Por Walter Silva

Nota de Espiritualidade InclusivaEste texto foi postado pelo amigo Walter Silva no Facebook nesta tarde e imediatamente percebemos a importância de repostá-lo aqui, dados os ótimos argumentos e informações úteis para confrontar o descalabro do tão noticiado livro do Reverendo Louis Sheldon (EUA), traduzido e publicado pelo Pastor Silas Malafaia como forma de tocar o horror homofóbico, aumentando a violência contra a comunidade LGBT e instabilizando a paz corrente em nosso país entre setores laicos, de defesa dos Direitos Humanos, movimento LGBT e religiosos em geral.

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Em resposta às acusações de ativistas gays junto ao Ministério Público Federal por conduta discriminatória e incitação à violência o pastor Silas Malafaia da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, da Penha, no Rio de Janeiro, lançou o livro “A estratégia: o plano dos homossexuais para transformar a sociedade’’.

O lançamento do livro, naturalmente, é uma cortina de fumaça e também vai de encontro às ambições de Malafaia na construção de uma ditadura de crentes e derrocada do secularismo. Com efeito, enquanto o pastor se ocupa de atacar o movimento gay e processar os ativistas LGBT, inexplicavelmente faz silêncio a respeito da bizarra associação das Assembleias de Deus com a seita do Reverendo Moon, envolvido nos escândalos mais burlescos, tais como prisão por sonegação fiscal e o aliciamento de menores.

O livro “A estratégia’’ foi escrito pelo reverendo Louis Sheldon, conhecido nos EUA como “Lou Sheldon’’, fundador da Traditional Values Coalition, uma organização categorizada pela Southern Poverty Law Center (entidade de defesa dos direitos civis) como grupo de ódio.

A Traditional values Coalition é um grupo pequeno, mas influente entre os conservadores, basicamente formada pelo Reverendo Lou Sheldon e sua filha, Andrea Sheldon Lafferty, tão maluca quanto o pai; certa ocasião ela afirmou ter enfrentado uma bruxa que jogou feitiços sobre o Senado.

Sheldon foi bastante longe no seu extremismo anti-gay, o suficiente até mesmo para o comentarista conservador Tucker Carlson que o entrevistava ficar chocado com o seu nível de ignorância. Carlson mencionou que Sheldon havia dito que o maior problema que os bairros negros enfrentam atualmente é a homossexualidade.

"A homossexualidade é o maior problema nos bairros de periferia e cidades do interior? Maior que o desemprego? Maior que a violência? Maior que a pobreza? O que o reverendo Lou tinha dito era bizarro e assustador também", reagiu Carlson posteriormente.

Ele também disse que Sheldon era um “esquisitão’’ e “charlatão’’, por pregar que os gays são imorais enquanto embolsava dinheiro corrupto de Abramoff. A fundação de Sheldon foi acusada de receber propina de um cliente do Lobista de cassinos Jack Abramoff como parte de um dinheiro empregado para derrubar uma lei que criminalizava a jogatina. Segundo o Washington Post, Abramoff chamava Sheldon de “Louie sortudo’’.

A Traditional Values Coalition há muito proclamava sua hostilidade contra o jogo, e envolveu-se também em uma cruzada contra ele. Então, enquanto Sheldon admoestava os americanos declarando que a agenda homossexual estava a destruir a fibra moral da América, ele secretamente tomava o partido dos interesses que publicamente rejeitava.

Essa hipocrisia descarada escandalizou a direita conservadora dos EUA, mas não parece deter os paladinos da moral e dos bons costumes em terras brasileiras, que continuam a apoiar-se em mentiras e apostando na difamação para negar os direitos civis de pessoas LGBT.

A imprensa gospel recebeu o lançamento do livro “A estratégia’’ com bastante animação, e geralmente em dando um tom de revelação “bombástica’’; e a imprensa gay? Marcelo Cia, do site MixBrasil, disse estar “louco’’ para ler o livro. Revelou que a sinopse era bastante sedutora, talvez gracejando. Afirmou que estava bastante ansioso para saber a respeito da estratégia que o autor do livro descobriu. Sobre a estratégia dos gays para dominar o mundo é mesmo aceitável que ele não saiba nada, posto que não há estratégia nenhuma.

A respeito da estratégia dos grupos de ódio para impor uma ditadura religiosa e deter o avanço dos direitos civis das minorias, porém, é lamentável e uma desgraça que os ativistas LGBT não consigam ser capazes de escrever uma única linha decente.

Sobre o autor


Walter silva é ativista LGBT (assim o reconhecemos, dada a qualidade do material acima) e mora em mora em Belém (Paraíba).

segunda-feira, 9 de abril de 2012

[Notícia] Chile aprova lei anti-homofobia. E o Brasil?

Por Marcelo Cia (diretamente de MIXBRASIL - http://mixbrasil.uol.com.br/blogs/cia/2012/04/05/chile-aprova-lei-anti-homofobia-e-o-brasil.html)


Bastou UM assassinato de homossexual para os deputados chilenos aprovarem lei que criminaliza a homofobia no país. No Brasil são mais de 200 por ano, e nada acontece. Por que? Vamos aos fatos.

Vizinhos

A Câmara dos Deputados do Chile aprovou nesta quarta-feira, dia 4 de abril, a maioria dos artigos de uma lei que pune a discriminação por orientação sexual ou religiosa. O texto é tipo o do PLC 122, que tramita no Brasil há quase uma década. A aprovação da lei pelos deputados chilenos foi uma resposta à morte, na semana passada, de um jovem homossexual atacado por neonazistas. Daniel Zamudio, de 24 anos, era o nome do moço. Ele morreu depois de agonizar por três semanas no hospital. O crime abalou o país todo, não só a comunidade gay.

O texto aprovado diz que "se entende por discriminação arbitrária toda distinção, exclusão ou restrição sem justificativa razoável efetuada por agentes do Estado ou particulares que cause privação, perturbação ou ameaça ao exercício legítimo dos direitos fundamentais" por "motivos de raça ou etnia, nacionalidade, situação socioeconômica, idioma, ideologia ou orientação política, religião ou credo, participação em organizações gremiais, sexo, orientação sexual, identidade de gênero, estado civil, idade, filiação, aparência pessoal e doença ou incapacidade".

E aqui?

Você lembra do moço assassinado durante a Parada gay de 2009 por neonazistas? Lembra do Edson Neris, também assassinado em São Paulo no ano de 2000 por neonazistas? Enquanto agressões como essas acontecem na Paulista e no Rio de Janeiro, tantos outros crimes subnotificados acontecem pelo Brasil e nenhum deles conseguiu sensibilizar os deputados nem a opinião pública a respeito dessa violência toda. O Brasil é, tradicionalmente, um país que pouco protesta. É um povo resignado. E isso inclui a população gay. Fazemos pouco, protestamos pouco. Adoramos uma festa mas detestamos política. Não conseguimos eleger políticos, ficamos calados quando vemos uma discriminação. O "antes ele do que eu" impera. Somos todos um pouco calados. Somos todos um pouco culpados. Até quando?


Nota de Espiritualidade Inclusiva


Para entender quem foi Daniel Zamudio e como foi brutalmente agredido, morrendo em consequência dos ferimentos, leia nossa postagem:

http://espiritualidadeinclusiva.blogspot.com.br/2012/03/noticia-luto-morreu-daniel-zamudio-o.html
Ao aprovar a lei anti-discriminação, o Chile deu um exemplo que o Brasil deveria dar há muito tempo. Contudo, aqui esbarramos em obstáculos muito mais sérios que os do Chile. E, não estamos falando da patrulha fundamentalista católico-protestante, não! Esta, existe em todo o mundo Ocidental! Estamos falando do grau de corrupção política, da filosofia do "toma-lá-dá-cá", da barganha, do desvio, do leilão de votos e de apoios para aprovações legislativas, atitudes estas, sim, as verdadeiras responsáveis pelo atraso e indas e vindas na aprovação do PLC 122. Não fosse a ganância de nossos políticos pelos desvios de milhões, muitos deles inclusive realizados por políticos da chamada bancada evangélica, cuja maioria enfrenta processos por corrupção, os direitos humanos da comunidade LGBT brasileira já estariam garantidos e não seriam objeto de uma discussão diabólica incitada por dementes como Silas Malafaia, Magno Malta e o bobo da côrte, Jair Bolsonaro!

Quantos "Zamudios" brasileiros teremos que ter para que algo semelhante ao que se fez no Chile em tempo recorde venha a ser aprovado por aqui? E, como diz Luiz Mott (e não nos cansamos de repetir), o homocausto continua, sem qualquer barreira ou atitude do Estado. A quem podemos recorrer, então? A Deus não mais podemos, porque os que se autodeclaram seus portavozes dizem que não nos é franqueado reclamar-Lhe direitos que são impedidos por versículos bíblicos... Só nos resta reclamar em instâncias internacionais, o que será uma vergonha para o Brasil, que será visto como uma Uganda latina, em escala menor (ou não!)...

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

[Editorial] Sexta-feira 13 e a bruxa do preconceito

Por Paulo Stekel


Hoje, dia 13 de janeiro de 2012, é sexta-feira 13. Também é o dia em que nosso blogue Espiritualidade Inclusiva completa um mês muito bem-sucedido. As estatísticas que vejo neste momento não me deixam mentir: 31 postagens de diversos autores, mais de 2100 visitantes, mais de 2700 visualizações de página e diversos comentários, sem contar uma tentativa de tirar-nos do ar já nos primeiros dias!

Até o momento, a postagem mais lida é o artigo “Quero ser um yorkshire”, que caiu no gosto da comunidade LGBT por motivos óbvios – a relação com o fato noticiado pela mídia da morte do cãozinho por uma desequilibrada e a posterior comoção nacional pelo animal, algo que nunca se vê nos assassinatos homofóbicos mais cruéis.

O segundo artigo mais lido até agora é “Wicca e polaridade”, publicado ontem, e de autoria de Claudiney Prieto, especialista em paganismo no Brasil. O motivo do sucesso, além da capacidade do autor, é algo que já vinha percebendo: muitos gays jovens estão se voltando para as práticas wiccanas, especialmente aquelas relacionadas ao Paganismo Queer, que aceita e valoriza a presença de homossexuais. Podemos dizer que o Paganismo Queer é a ala inclusiva do Paganismo Wicca.

O terceiro artigo mais lido até o momento é “A demonização dos gays nas Igrejas Neo-Pentecostais – o exemplo da IURD”. O feedback mais intenso aqui nos veio dos membros LGBT das Igrejas Evangélicas Inclusivas e de alguns movimentos inclusivos nascidos do Catolicismo – como o Diversidade Católica. Os gays cristãos concordam que é necessário contrapor os pseudo-argumentos de fundamentalistas como os da IURD, Assembleia de Deus e símiles com uma força proporcional à enviada contra nós, mas sem a agressividade e a baixaria que se vê em programas de TV destas Igrejas. Aliás, a baixaria de um Malafaia em seu programa de TV contrasta com a linguagem de amor pregada pelo Evangelho. Quando vemos um pastor vociferando clichês preconceituosos de modo chulo e minimizando a pessoa humana em nome de Deus, passamos a ter certeza de que este homem não tem autoridade alguma, seja na terra ou no céu!

A bruxa do preconceito anda à solta nas ruas, na mídia e nos templos religiosos do Brasil. Nas ruas, pessoas continuam sendo agredidas – moral e fisicamente – por conta de sua orientação sexual. Centenas são assassinadas anualmente unicamente por causa disso! E, exatamente aqueles que deveriam defender a vida dos cidadãos brasileiros – pastores e deputados – ainda culpam os mortos pelo ocorrido, quase chegando a inocentar criminalmente os assassinos. Isso é inadmissível num estado laico cuja Constituição deixa clara que todos são iguais perante a lei!

Após este primeiro mês, o Espiritualidade Inclusiva entra em uma nova fase, para dar mais um passo em direção à conscientização de que a espiritualidade não pode ser excludente. Deve incluir todos os cidadãos em pé de igualdade: homens, mulheres, brancos, negros, índios, heterossexuais, homossexuais, bissexuais, etc.

Como uma de nossas primeiras ações de movimento fora da Internet, propomos uma atividade autogestionária no Fórum Social Temático, em Porto Alegre - RS. Realizaremos uma palestra interativa para explicar o que é Espiritualidade Inclusiva no dia 25 de janeiro. Então, as pessoas que virão ao Fórum Social Temático (24 a 29 de janeiro) já podem ficar antenadas na programação.

Continuamos abertos a críticas, sugestões, artigos e notícias de colaboração, dicas e depoimentos de quem queira passar aos leitores do blogue suas experiências com a religião e a espiritualidade. O formato do blogue não é fechado e podemos melhorá-lo ou modificá-lo sempre que for útil e necessário.

Então, uma ótima sexta-feira 13 para todos os nossos leitores, e que a única bruxa à solta seja a da alegria, do encontro com os amigos, do convívio em família (sem preconceito) e da luta pelos direitos igualitários!

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Gays: cidadãos de segunda classe num Estado laico?

Por Paulo Stekel (artigo postado originalmente em http://gayexpression.wordpress.com/2010/10/24/gays-cidadaos-de-segunda-classe-num-estado-laico/)

Vivemos num Estado laico? Então, por que a Constituição da República Federativa do Brasil (1988), em seu Preâmbulo diz “Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, (…) e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, (…) promulgamos, SOB A PROTEÇÃO DE DEUS, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL”?

Ora, se o Estado é laico, significa que não há uma “religião do Estado”. Então, qual o motivo de se invocar a proteção de Deus? Por que não invocar também a proteção de Buda, de Alá, de Krishna ou Oxalá?
O Estado laico ou secular tem como uma de suas principais características a separação entre Igreja e Estado, mantendo-se este último completamente neutro no que tange a temas religiosos de qualquer religião, é bom frisar. Mesmo assim, o Estado laico tende a promover, através de leis e programas, a convivência pacífica entre os credos, fomentando atividades em prol da tolerância e combatendo a discriminação religiosa. Mas deve, também, sob pena de comprometer sua laicidade, combater ações de grupos religiosos que venham a interferir na vida de todos cidadãos por conta de suas crenças. Não é o que temos visto neste período de eleições no Brasil, especialmente no segundo turno das eleições presidenciais.
Grupos religiosos fundamentalistas, vulgarmente chamados de “evangélicos”, há muito tentam interferir nas decisões políticas e na aprovação de leis em nosso país sempre que estas estejam em desacordo com suas crenças. Não vamos nem entrar no mérito destas crenças, se estão alinhadas com os tempos ou se são ainda resquícios de um pensamento medieval e atrasado. Cada um crê no que quiser! O problema reside no fato de tais crenças serem defendidas a ferro e fogo e praticamente impostas de forma sutil a todos os cidadãos através de um “lobby fundamentalista” crescente. Assim, o debate de leis em favor da liberdade de decisão das mulheres quanto ao aborto e aquelas em favor dos direitos de minorias como o “povo de santo” (praticantes de religiões afrobrasileiras) e os homossexuais acabam virando mote para batalhas apocalípticas na mídia, regadas a sórdidos argumentos de “ameaça à família”, “permissão de práticas diabólicas”, “institucionalização da pedofilia” e “conversão à iniqüidade”, propagados principalmente por pastores pentecostais “podres de ricos” (não há como definir melhor!) – e não falo em riqueza espiritual – objetivando unir os evangélicos nesta “cruzada contra o Diabo”, bem como confundir os brasileiros de outras religiões.

O pior de tudo, misto de lástima, vergonha e constrangimento para todos os cidadãos brasileiros, é termos que assistir os argumentos patéticos dos dois candidatos a presidente no segundo turno: nenhum comprometimento real e explícito com a laicidade do estado, com os direitos dos homossexuais, com o combate à homofobia que vem especialmente de DENTRO das Igrejas fundamentalistas e, pelo contrário, termos que ver às claras todos os tipos de conchavos com pastores demagogos, visitas a eventos cristãos (incluindo católicos) com uma “devoção” de cortar o coração (eu prefiro chamar isso de “curtir com a cara de Deus”) saída sabe-se lá de onde… A vergonha é tanta e tão explícita que nem as ONGs LGBT, geralmente “cabresteadas” por suas ligações partidárias (quase) veladas (pois, só não as percebe quem não quer), tiveram como evitar de se pronunciar em cartas abertas, condenando o ataque aos direitos LGBT e ao laicismo do Estado.

Alguém que aceite o argumento de que a aprovação da união civil gay e a aprovação da lei contra a homofobia vá “acabar com a família” e colocar na cadeia qualquer um que pense diferente da comunidade gay é um sinal de ignorância ou de má fé. Pior, isso pode acabar mal e incitar ações violentas em algum grau nos momentos cruciais das aprovações de ambas as leis, por parte dos dois lados. Se argumentos como “fim da família” e “onda de prisões perpetradas por uma patrulha gay” (argumentos patéticos não têm limites neste Brasil) fossem verdadeiros, isso já teria ocorrido em todos os países que aprovaram a união civil gay e leis contra a homofobia. Todos sabemos que nada disso ocorreu na Suécia, na Holanda, nem em nenhum outro. A Argentina, décadas à frente do Brasil nestas questões, também não corre esse risco.
É interessante ambos os candidatos fecharem “convênios” com líderes religiosos homofóbicos, quando o artigo 19 da Constituição diz: “É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (…) estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou MANTER COM ELES OU SEUS REPRESENTANTES RELAÇÕES DE DEPENDÊNCIA OU ALIANÇA, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse PÚBLICO.” Interesse público, não eleitoreiro!!! Este artigo constitucional é o que define nosso Estado como laico.

A grande verdade é que os fundamentalistas religiosos em todo o mundo, sejam no Brasil, EUA ou nas repúblicas islâmicas, cada um com um grau maior ou menor de violência, consideram os gays como cidadãos de segunda classe, aberrações da natureza (Deus não os teria criado?) e não merecedores de quaisquer direitos de expressão. Para eles, os gays não podem se reunir, se organizar, se casar entre si, ter direito a herança, adotar crianças, emprego digno em casas e empresas de cristãos e sequer reclamar quando são xingados por quem não lhes aceite como nasceram. Os mais radicais querem eliminar os gays “à moda Hitler” (aliás, muitos gays morreram nos campos de concentração e foram hostilizados por nazistas e judeus!), enquanto os que se consideram mais “amorosos” querem “curar” os gays de algo que não é uma doença. Ou seja, querem uma lavagem cerebral para manter as aparências. Esse é o pensamento (já não mais velado) de Malafaia, Macedo, Dadeus Grings e muitos outros fundamentalistas por aí. Estamos nos aproximando de um conflito fora de época com as forças fundamentalistas e homofóbicas neste país? Será um “stonewall” atrasado? Esperamos que não se chegue a tanto, mas uma coisa podemos “profetizar”: a comunidade gay brasileira conquistou muito mais visibilidade e vários direitos civis nestes últimos vinte anos para assistir calada a uma eventual política de retrocesso propagada por religiosos medievos aliados a políticos inescrupulosos e sem apreço pela vida humana. Contra uma “bancada evangélica” temos já uma nascente “bancada gay”, que foi muito reforçada nestas recentes eleições pela aprovação no pleito de vários candidatos homossexuais e muitos outros que podemos chamar de “simpatizantes”, geralmente deputados ligados aos direitos humanos.

Os últimos cidadãos considerados de segunda classe que tivemos no Brasil foram os escravos negros, que conseguiram o reconhecimento legal de sua igualdade em 1888, cem anos antes de nossa atual Constituição. Antes disso, a Igreja apoiava o escravagismo e os Jesuítas se calavam sobre o assunto para não abalar o delicado status político do Século XIX. Afinal, o própria Bíblia cita os escravos e em nenhum momento condena o escravagismo. Por que os pastores não revelam isso a seus fiéis? Se, hoje não existem mais escravos não será porque a consciência da humanidade se transformou? Os religiosos não se adaptaram a isso também? Por que com os gays isso será diferente quando o preconceito acabar? Contudo, reflita-se, com o fim da escravidão acabou o preconceito contra os negros?…

Não somos cidadãos de segunda classe e não precisamos de uma Isabel para nossa alforria porque os tempos são outros. Podemos nos organizar e exigir que a lei seja igual para todos. Podemos exigir respeito e segurança. Podemos exigir tratamento digno e humano. Podemos, devemos e vamos exigir todos os direitos facultados aos seres humanos, cidadãos e contribuintes de uma nação livre, laica e soberana. Guardem estas palavras todos aqueles que estão acostumados a demonizar os gays para esconder a sua própria hipocrisia religiosa que não tem escrúpulos na hora de colocar na boca de Deus todos os impropérios contra a vida humana e a liberdade. Guardem estas palavras também aqueles acostumados a usar os gays como massa de manobra eleitoral, prometendo muito mais do que realmente estão dispostos a fazer por uma comunidade que, ainda que minoria, é sabidamente culta, politicamente decidida, com boa escolaridade, tem suas próprias opiniões e não se vende por ninharias ou “bolsas”, nem por sorrisos marqueteiros no horário eleitoral. Se isso é ser cidadão de segunda classe… não é à toa que países como Suécia e Holanda têm tão elevada qualidade de vida…