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domingo, 26 de fevereiro de 2012

[Tradução] O que é homossexualidade? O Uno e o Múltiplo

Por Toby Johnson (Fonte: http://tobyjohnson.com/theoneandthemany.html)


A Homossexualidade, é claro, é uma orientação psicológica para a vida. Foi apenas a partir do desenvolvimento da sofisticada consciência psicológica do "inconsciente" (datada da época de Sigmund Freud) que pudemos pensar em termos de algo como uma orientação psico-sexual da personalidade. Nesse sentido, a homossexualidade é algo relativamente novo. Sempre houve pessoas que fizeram sexo homossexual, mas antes dos tempos modernos, elas não tiveram um sentido de si mesmas como homossexuais.

A homossexualidade é uma categoria de consciência e uma manifestação da consciência ciente de si mesma. Tanto praticamente quanto metaforicamente a homossexualidade é auto-reflexiva. Trata-se da unidade do cosmos, ao invés da dualidade. A heterossexualidade manifesta a dualidade. (heterossexuais são muitas vezes "inconscientes" de ser heterossexuais, porque experimentam seus sentimentos sexuais como normais, automáticos e invariáveis.)

Sendo uma "orientação psicológica" a homossexualidade é uma dinâmica neurológica – como ser canhoto, por exemplo. Com efeito, a incidência de canhotismo e homossexualidade é aproximadamente a mesma, entre 3% e 10% da população geral. Similar também à orientação sexual, a categoria da lateralidade inclui indivíduos ambidestros, assim como a categoria sexual inclui bissexuais. É possível a pessoas ambidestras evitar o uso de sua mão esquerda como dominante, assim como é possível a bissexuais evitar suas atrações homossexuais. Pessoas ambidestras que tenha renunciado ao lado canhoto e bissexuais que renunciaram à homossexualidade parecem ter mudado sua orientação. Canhotos que não são ambidestros e  homossexuais que não são bissexuais não mudam sua orientação.

Há um maravilhoso artigo na web de Chandler Burr sobre os paralelos entre orientação sexual e lateralidade intitulado: “The Only Question That Matters: Do People Choose Their Sexual Orientation?” (A única questão que importa: as pessoas escolhem sua orientação sexual?)

Como a orientação homossexual existe em tudo, isso nos diz algo sobre a metafísica do universo e a natureza da consciência. A Filosofia Hermética e o pensamento metafísico considera o universo em termos de "o Uno e o Múltiplo". "De um vêm dois, e de dois vêm muitos" é uma fórmula tradicional.
Aqui está uma explicação simples aforística de orientação sexual no estilo da antiga terminologia hermética:

O Um se divide em Muitos
a fim de experimentar os muitos como o Uno.

A atração heterossexual manifesta o prazer,
a experiência múltipla em sua variedade.
A União heterossexual propaga o múltiplo,
do Dois fazendo muitos mais.

A atração homossexual manifesta o prazer,
nisso o Uno experimenta a Unidade.
O amor homossexual testemunha o desejo do Um de retornar a si mesmo e
de experimentar a multiplicidade de Muitos
como um reflexo do Self do Uno.

Complemento: O que Jesus disse sobre os Direitos Gays (Fonte: http://tobyjohnson.com/jesusongayrights.html)

O que Jesus disse sobre os direitos dos homossexuais é bastante simples:

"Faça aos outros o que gostaria que fizessem para você."

E, novamente, "Tudo o que fizerdes ao menor dos meus irmãos e irmãs, é a mim que fazeis."

Não há dúvidas de que Jesus teria estado ao "nosso lado" no debate dos direitos dos homossexuais e não do lado daqueles que afirmam ser seus seguidores e proclamar os seus "valores morais", clamando por leis contra a dignidade e os direitos civis dos gays.

Eles não querem que isso seja feito a eles. Na verdade, eles estão frequentemente gritando que há uma perseguição sutil dos cristãos nos EUA. Eles não gostam disso.

Seguindo as instruções de Jesus, então, eles não deveriam querer qualquer tipo de perseguição a quaisquer pessoas, incluindo gays e lésbicas, porque eles não querem se perseguidos.


Sobre o autor

Toby Johnson, PhD, é autor de oito livros: três livros de não-ficção que aplicam a sabedoria de seu professor e "velho sábio", Joseph Campbell aos modernos problemas sociais e religiosos cotidianos, três romances do gênero gay que dramatizam temas espirituais no âmago da identidade gay, e dois livros sobre a espiritualidade de homens gay e a experiência mística da homossexualidade.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

[Tradução] A Noite Escura da Alma

Por Toby Johnson – acesse o site do autor: http://tobyjohnson.com

A noite escura da alma refere-se a uma espécie de estado afetivo, também chamado de aridez, que se diz preceder a experiência mística direta. Refere-se à noção de que você tem que passar por uma certa quantidade de sofrimento antes que você possa perceber a alegria e o prazer.

A noite escura é caracterizada pela insatisfação e tédio com relação à maneira como as pessoas “normais” vivem suas vidas “normais”. Subjacente a essa insatisfação existe uma "fome espiritual" de algo além do que o mundo oferece. Isso é interpretado como a experiência de união com Deus. Enquanto esta imagem se aplica a todas as pessoas, tem aplicação particularmente apropriada para a experiência de homens gays, especialmente gays espiritualmente conscientes.

Há uma certa sabedoria implícita no ser gay, um sentido de compreender uma dimensão oculta da realidade que a maioria das pessoas não parece perceber onde está. Aprendemos isso no início da vida. No começo, é apenas em referência a si mesmo. Ou seja, sentimos, muitas vezes incipiente, que há algo sobre nós mesmos que temos que manter em segredo, algo que só nós (e Deus) podemos saber. Podemos desenvolver uma visão mágica ou religiosa do mundo a partir deste sentido de secretude ou sacralidade.

Como homens gays mais velhos, podemos vir a compreender que o que tínhamos entendido como a "dimensão secreta" era, de fato, a dimensão homossexual, e que tem havido outros antes de nós que já viveram uma vida em segredo e "escuridão" como companheiros homossexuais. Tornamo-nos fascinados com a inclinação homossexual que nós - e nossos semelhantes - podemos ver ao longo da história e cultura. Queremos saber quem era gay no passado, quais estrelas de cinema, quais políticos e celebridades, quais instrutores espirituais compartilharam nosso segredo (muitas vezes em sua própria "escuridão").

As pessoas homossexuais – talvez de modo demasiado arrogante – que chamam de “corretas” (inglês straight, referindo-se a heterossexuais) as pessoas ditas “normais”, podem não perceber esta dimensão escondida em tudo. Não há, afinal, nenhuma razão para estes virem a desconfiar que  são ensinados por seus pais, professores, padres, etc, que alguns podem chamar de: "as autoridades" - pelo menos, nenhuma razão sentida em sua carne. Claro que, como eles desenvolvem e aprofundam as suas próprias vidas psicológicas e espirituais, são suscetíveis de perceber que há uma dimensão secreta. Isto é, afinal, a descoberta de todos os chamados "místicos". Uma parte importante da contribuição gay pode ser justamente a revelação da dimensão oculta da vida.

A noite escura é um passo comum ao alguém se apresentar como gay. Ou seja, os gays muitas vezes experimentam confusão, depressão e perda de identidade social assim que percebem sua orientação homossexual.

Primeiro, talvez, sintamos que algo está faltando na heterossexualidade; ansiamos por algo mais. Então, quando percebemos o que é que desejamos, podemos nos sentir humilhados ou traídos, ou pelo menos podemos sentir que isso é algo que devemos manter em segredo.

Mais tarde, muitas vezes através de um momento de mudança de vida intensamente emocional, chegamos a compreender o que a homossexualidade realmente é. Então, a culpa e os equívocos são transformados, e sentimos alívio e alegria. Passamos pela noite escura através da forma de purgação, e descobrimos um mundo novo e um novo auto-conceito.

A noite escura é uma imagem de um poema de São João da Cruz, um místico espanhol do século XVI. Para quem vê pelo prisma gay, este poema é um relato de um encontro sexual anônimo que resulta em uma experiência mística.

Ele conta como João foge à noite disfarçado e vai para um lugar ermo, fora dos muros da cidade e lá conhece um homem, faz amor com ele, então, percebe que este é o Cristo fazendo amor com ele e ele acaba por desmaiar. Ele acorda e encontra a si mesmo e seu Amado deitado em um campo de lírios, uma alusão a um dos mais bonitos ditos de Jesus: Olhai para os lírios do campo, eles não labutam nem fiam, mas até mesmo o Rei Salomão, em toda a sua glória, não era adornado como uma deles.

Nós, os gays, passamos por essa escuridão como uma parte necessária de ser quem somos. E, assim, potencialmente vemos a mensagem mística por trás da religião. Nós potencialmente descobrimos do que São João da Cruz estava falando: em cada homem que encontramos, especialmente aqueles com quem fazemos sexo ou por quem nos apaixonamos, podemos ver Cristo. Na verdade, isto é o que "Cristo" significa: a divindade real da vida encarnada humana, aqui e agora. Como Jesus disse: "O que fizerdes ao menor dos meus irmãos, a mim farás." E também: "O Reino de Deus está espalhado por toda a face da Terra, e os homens não o vêem." O segredo é abrirmos nossos olhos.

Esta não é a sabedoria dos valores familiares que está compreensivelmente preocupada com a manutenção do status quo, segurando a certeza, protegendo o ninho para o bem das crianças. Mas, precisamente porque, como gays, não nos encaixamos no status quo, não experimentamos a certeza e a justiça, é que, potencialmente, temos à nossa disposição a visão mística da noite escura. Podemos abrir nossos olhos e ver na escuridão.

A Noite Escura*
Por São João da Cruz (1542-1591)

(1578)

1. Em uma noite escura,
De amor em vivas ânsias inflamada,
Oh, ditosa ventura!
Saí sem ser notada,
Já minha casa estando sossegada.

2. Na escuridão, segura,
Pela secreta escada, disfarçada,
Oh, ditosa ventura!
Na escuridão, velada,
Já minha casa estando sossegada.

3. Em noite tão ditosa,
E num segredo em que ninguém me via,
Nem eu olhava coisa,
Sem outra luz nem guia
Além da que no coração me ardia.

4. Essa luz me guiava,
Com mais clareza que a do meio-dia,
Aonde me esperava
Quem eu bem conhecia,
Em sítio onde ninguém aparecia.

5. Oh, noite que me guiaste!
Oh, noite mais amável que a alvorada!
Oh, noite que juntaste
Amado com amada,
Amada já no Amado transformada!

6. Em meu peito florido
Que, inteiro para ele só guardava,
Quedou-se adormecido,
E eu, terna, o regalava,
E dos cedros o leque o refrescava.

7. Da ameia a brisa amena,
Quando eu os seus cabelos afagava,
Com sua mão serena
Em meu colo soprava,
E meus sentidos todos transportava.

8. Esquecida, quedei-me,
O rosto reclinado sobre o Amado;
Tudo cessou. Deixei-me,
Largando meu cuidado
Por entre as açucenas olvidado.

* A partir de As Obras Completas de São João da Cruz, trad. Kieran Kavanaugh, OCD, e Otilio Rodriguez, TOC, rev. ed., Washington, DC: ICS Publicações, 1991.


Sobre Toby Johnson

Toby Johnson, PhD, é autor de oito livros: três livros de não-ficção que aplicam a sabedoria de seu professor e "velho sábio", Joseph Campbell aos modernos problemas sociais e religiosos cotidianos, três romances do gênero gay que dramatizam temas espirituais no âmago da identidade gay, e dois livros sobre a espiritualidade de homens gay e a experiência mística da homossexualidade.

sábado, 14 de janeiro de 2012

[Tradução] Uma religião muito “queer”*

(Por Toby Johnson** – acesse o site do autor: http://tobyjohnson.com)

* Nota do Tradutor - Em Inglês, o termo “queer” é usado para referir-se aos gays. Significa “estranho” ou “esquisito”. Apesar de seu uso pejorativo – a ponto de ser por vezes traduzido por “bicha” – Toby Johnson não o usa com conotação pejorativa, mas inclusiva.
** Tradução de Paulo Stekel

Uma religião queer não pode significar algo como fazer as bichas serem religiosas, ou seja, fazer-nos voltar para a igreja/sinagoga/templo/mesquita, etc, para acreditarmos nos mitos populares e aceitarmos a autoridade de líderes religiosos.

Uma religião queer deve significar o reconhecimento da multiplicidade de vozes e perspectivas em todo o mundo, o elevar-se acima da religião de origem para observá-la como mais uma tradição entre muitas.

Para muitos de nós tal tradição tem sido o Cristianismo, e, nesse sentido, com uma maior e mais elevada perspectiva, - o que é chamado de "espiritualidade" - permite uma resposta simples sobre a história da Igreja e a opressão baseada na Bíblia: é tudo mito de qualquer maneira, tome o que é significativo para você e deixe o resto para trás.

Isso é religião queer: deve-se compreendê-la, não "acreditar" nela. Ela liberta você da religião enquanto mostra o que ela realmente era, inicialmente, e assim "despertando" você para a natureza da consciência e a natureza de "Deus", como uma dica sobre quem você realmente é como entidade consciente inquirindo sobre a natureza de sua existência.

O cerne das tradições mitológicas é aumentar a visão das pessoas acima das preocupações cotidianas e egoístas e inspirar compaixão. O objetivo da religião não é estar certa, mas ser amorosa e gentil. Se a Bíblia diz que os homossexuais devem ser apedrejados, é evidência de uma bíblia ultrapassada e inadequada para abordar questões da vida contemporânea.

Você não precisa explicar "textos de horror", aqueles versículos da Bíblia que são citados fora do contexto, para justificar a condenação da homossexualidade como algo inevitável, porque é "a vontade de Deus." Você pode simplesmente rasgar as páginas do livro.

Na verdade, você pode achar que seria mais simples salvar apenas uma página, como uma regra de ouro de Jesus sobre isso e jogar fora todo o resto. Isso é provavelmente o que o próprio Jesus teria feito.

A mensagem a ser aprendida a partir da observação das atitudes anti-gays e do comportamento das igrejas cristãs é que é hora de seguir em frente. Vamos jogar fora o bebê com a água do banho, porque na verdade a água está suja, o bebê morreu e o corpo está em putrefação, merecendo um enterro respeitoso.

Não é suficiente para o Cristianismo Queer seguir buscando os significados originais, ou descobrir que Jesus teria sido pró-gay, ou se ele tinha as palavras para falar sobre tais questões - embora, naturalmente, isso seja verdade. A Cristandade é mais uma voz no diálogo sobre o significado espiritual - e ela tem um sotaque muito antiquado.

Você próprio precisa estranhar a religião. Todos nós, gays e heterossexuais, precisamos de um novo paradigma espiritual que faça sentido no mundo moderno e fale com uma voz moderna e esclarecedora. Isso, eu acho, é o que é "espiritualidade gay", é a direção para onde a raça humana está evoluindo.

O "novo mito" é o conto do que a religião e o mito têm sido na história da evolução da consciência. Podemos entender que estas coisas têm sido metáforas sobre a consciência.

Esta constatação é a seguinte: 1) um mito de ordem superior, 2) uma “queerização” real - no sentido de despojar - da religião e das noções tradicionais de autoridade religiosa, e 3), ironicamente, a salvação da religião como uma forma de alta cultura, arte.

Se a religião e o mito estão em concorrência com a ciência para descrever o mundo material externo, a religião necessariamente perderá. Se a nova compreensão da religião e do mito é a ferramenta científica para descrever as estruturas da consciência profunda no interior, no mundo "espiritual", então a religião e a ciência trabalham lado a lado, em prol da evolução e expansão da consciência.

Pois, tudo isto é fundamentalmente a respeito do Universo despertando para si. De um modo paralelo e profundamente significativo, eu acho que ser queer é despertar para si mesmo. Ninguém se identifica como gay ou “bicha” sem ter despertado de alguma forma, isto é, sem ter compreendido os indícios que suas vidas dão sobre sua própria experiência interior da consciência.

Ser queer, ser gay dá-nos o suporte notório para a compreensão e o movimento em direção ao novo mito que é a vanguarda da evolução da consciência. É ser um com o universo em evolução, sendo um com o Big Bang, sendo um com "Deus".

O caminho para a religião queer é ser Deus.


Sobre Toby Johnson

Toby Johnson, PhD, é autor de oito livros: três livros de não-ficção que aplicam a sabedoria de seu professor e "velho sábio", Joseph Campbell aos modernos problemas sociais e religiosos cotidianos, três romances do gênero gay que dramatizam temas espirituais no âmago da identidade gay, e dois livros sobre a espiritualidade de homens gay e a experiência mística da homossexualidade.