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domingo, 12 de agosto de 2012

Espiritualidade e Identidade Gay


Por Paulo Stekel


Vou confessar a vocês! Tive a ideia deste artigo após consultar as estatísticas do blogue Espiritualidade Inclusiva e constatar que alguém pesquisou exatamente sobre isso. Tal indivíduo devia estar buscando alguma relação entre sua identidade gay e a espiritualidade, esperando encontrar algum alento para um conflito interno, talvez. Vamos ajudá-lo!

A primeira coisa a definir é “identidade gay” ou, como poderia ser mais amplamente nomeada, “identidade LGBT”. Depois, precisamos observar se esta identidade é em algo compatível ou incompatível com uma busca espiritual.

Identidade gay tem a ver, obviamente, com padrões de pensamento, formas do gay ver a si mesmo, o tipo de significado que atribui às suas atrações homossexuais e o que isso significa para ele.

A psicóloga Vivienne Cass (Austrália) desenvolveu um modelo de formação de identidade gay, o Model of Homosexuality Identity Formation, que pode ajudar a definir como se processa a formação de tal identidade, ainda que não explique em maiores detalhes como isso acontece.

Segundo esse modelo, a formação da identidade gay passa por seis estágios que, uma vez alcançados, o que não ocorre em todos os gays e nem é uma necessidade imperativa, determinam uma certa prontidão para a instalação de um repertório emocional/comportamental, tanto no nível pessoal como no social.


1. Confusão de identidade: nesse estágio o individuo começa a notar, a reconhecer e a aceitar sua atração sexual por outros homens. Mas não se imagina gay e identifica-se como heterossexual. Nem todos os indivíduos que estão nesse estágio irão passar para o estágio seguinte. Alguns aceitam suas fantasias homoeróticas, mas nem por isso consideram a possibilidade de se tornarem gays.

2. Comparação de identidade: durante esse estágio o indivíduo começa a considerar a possibilidade de que talvez seja homossexual. Ele provavelmente não emprega a palavra gay, uma vez que essa palavra está associada a um estilo de vida muito particular, com o qual ele não se identifica. É possível que aceite seu comportamento sexual, mas recuse a identidade. Ou que aceite a identidade, mas decida reprimir seu comportamento homossexual.

3. Tolerância de identidade: aqui, o individuo já começa a identificar-se como gay, embora ainda tenha dificuldades em se aproximar da cultura gay. Nesse estágio as experiências (positivas ou negativas) são determinantes para a continuidade (ou não) no processo de formação e para que ele se mova (ou não) ao estágio seguinte.

4. Aceitação de identidade: a passagem do estágio de tolerância para o de aceitação se dá a partir de um sentimento de pertencimento e de identificação com a comunidade gay. Nesse estágio o indivíduo tende a rejeitar os segmentos antigays da sociedade e a se aproximar cada vez mais de outros gays, adotando comportamentos, hábitos e linguagem própria do grupo gay com o qual se identifica.

5. Orgulho de identidade: nesse estágio o indivíduo identifica-se totalmente como gay, reforçando, sempre que possível, as diferenças entre gays e heteros. Podem surgir sentimentos de “nós contra eles” e uma necessidade de se assumir completamente. Esse costuma ser o estágio da maior parte dos ativistas.

6. Síntese de identidade: no último estágio prevalece a integração entre gays e heteros, e o indivíduo começa a compreender que nem todos os heterossexuais são antigays. O indivíduo reconhece e luta contra a homofobia e o preconceito, mas de uma forma mais tranqüila e sem sentir-se ameaçado. Consegue integrar sua afetividade e sua sexualidade a todas as áreas da vida.

O fato é que provavelmente conhecemos pessoas LGBT em todos esses estágios.

Alguns gays se consideram heterossexuais a vida toda, pois mesmo tendo “casos” rápidos com pessoas do mesmo sexo, consideram que, sendo casados com alguém do sexo oposto, não se consideram como tendo uma identidade diversa da maioria. Outros gays até se consideram como tais, mas evitam qualquer aproximação com a cultura gya, os assuntos relacionados, ficando a parte de qualquer ativismo pró-direitos LGBT.

No meio religioso, o que impera é o desenvolvimento tardio da identidade gay. Gays cristãos, por exemplo, só começam a desenvolver sua identidade após chegar ao ensino superior, convivendo com outros gays em estágio de desenvolvimento maior. Alguns padres cristãos gays aceitam sua identidade, mas reprimem seu comportamento, considerando-o pecaminoso.

Uma ressalva à expressão “orgulho” usada no quinto estágio da psicóloga autraliana. Ela diz que neste estágio o indivíduo reforça “sempre que possível, as diferenças entre gays e héteros” e que esse “costuma ser o estágio da maior parte dos ativistas”. Na verdade, isso não tem nada a ver com o tão comentado (e polêmico) Orgulho Gay, mote das Paradas Livres pelo mundo afora. O verdadeiro Orgulho Gay tem mais a ver com uma sensação psicológica de “normalidade, afinal!” causada pela percepção de que ser LGBT não é uma aberração, mas está presente na natureza humana e até na animal, do que com uma atitude de superioridade. O que as Paradas Livres procuram enfatizar é essa “normalidade” e naturalidade da diversidade sexual, e não uma divisão do mundo social em LGBTs e Não-LGBTs.

Em A Identidade Gay: Uma Construção Histórica (ver http://www.pucsp.br/clinica/publicacoes/boletins/boletim10_07.htm), Elcio Nogueira afirma:

“A homossexualidade sofreu e ainda sofre, grandes preconceitos e estigmas, o sujeito homoerótico, é bastante estigmatizado, e as religiões sejam elas quais forem, ainda o colocam como o “porta-voz” do demônio, ou a aberração que tem de voltar aos caminhos de Deus. O Lócus social em que o indivíduo homoerótico foi obrigado a construir sua rede de identificações, suas subjetividades, ou o que lhe foi permitido desejar, e mesmo construir como relação possível com o outro, influíram e tiveram preponderância, nas hoje chamadas relações homoeróticas.”

Como hoje em dia alguns grupos do movimento LGBT têm criticado a comercialização de uma identidade gay e os auto-impostos guetos das culturas LGBT, nos referimos a “identidade gay” como uma construção da pessoa LGBT a partir de dentro e não de uma imposição ou pressão social. Tem mais a ver com o próprio auto-conhecimento do indivíduo acerca de sua sexualidade do que com uma construção midiática ou de marketing segundo certas doutrinas ou ideologias.

Exatamente aqui pode entrar o conceito de Espiritualidade, e é este conceito que pode diferenciar umas identidade gay “pura” de uma identidade forjada na mercadologia do momento.

No desenvolvimento da identidade gay nos moldes não mercadológicos que definimos, a busca da espiritualidade pode ser um auxiliar incrível. Mas, para isso, a relação com a espiritualidade deve ser mais profunda e interior que uma relação com alguma religião formal, embora esse segundo aspecto não esteja descartado nem seja contraproducente. Afinal, não há qualquer incompatibilidade entre busca espiritual e orientação sexual. O que é contraproducente é a prática de uma religião naturalmente homofóbica numa postura homofóbica. Então, se for para praticar religiões formais, que se busque os grupos inclusivos dentro delas.

Contudo, se estivermos falando em Nova Espiritualidade, uma tendência crescente no mundo e que se define por uma busca espiritual/religiosa transcendendo a religião formal, então, tudo o que ajude no autoconhecimento pode ser proveitoso.

Os aspectos de culto ao feminismo de algumas espiritualidade pagãs podem ajudar gays e lésbicas numa autocompreensão a partir da dualidade dentro de si mesmos, levando a uma integração de polaridades sem a necessidade de relações sexuais com o sexo oposto, por exemplo.

As práticas espirituais “xamânicas” que enaltecem a integração do ser humano com a natureza também podem ser úteis, pois mostram que a diversidade é a tônica do cosmos. Assim, o LGBT se percebe como parte natural do todo e não como um acidente de percurso.

Os grupos de meditação (Budismo, Hinduísmo, etc.) geralmente são mais amigáveis aos gays, o que pode ser uma boa forma de equilibrar mentes geralmente bagunçadas pela pressão social, familiar, e pelo preconceito homofóbico diário, sem contar um pouco de homofobia internalizada, uma forma de auto-flagelação.

Nos Estados Unidos, há comunidades de gays praticantes da “nova espiritualidade” que trabalham com xamanismo, mediunidade, canalização e que até “incorporam” o gender queer, um tipo de entidade espiritual gay. O Candomblé brasileiro já conhece isso, pois existem Orixás com aspectos masculinos e femininos, como Oxumaré.

A principal função da prática espiritual de um indivíduo gay em processo de desenvolvimento de sua identidade deve ser o equilibrar sua vida, sem culpas ou rancores sobre a homossexualidade.
Deve entender que o ser gay ou LGBT é uma condição espiritual pré-existente no seu ser.

Hoje em dia temos observado que os adolescentes estão saindo mais cedo do armário que trinta anos atrás. Isso se deve muito provavelmente à Internet, que faz com que se sintam menos isolados, pois pesquisando e interagindo em redes sociais estão vendo modelos positivos nos meios de comunicação, bem como nos grupos e comunidades das quais participam, inicialmente com perfis falsos (os “fakes”), depois abertamente declarando-se gays. Entre estes modelos positivos se encontram as Igrejas Inclusivas, os grupos inclusivos em religiões formais mais antigas e as setoriais LGBT de partidos políticos.

De qualquer forma, o conflito pessoal sobre os sentimentos homossexuais cria sempre uma difícil luta interna. Depois de anos tentando encontrar respostas e sem sucesso na tentativa de mudar seus sentimentos, muitos pessoas se convenceram de que seus sentimentos homossexuais são inatos e imutáveis, e agora aceitam uma identidade gay que finalmente termina a luta interna que lhes causou tanta frustração e tanta dor. Aceitar uma identidade gay tem implicações enormes, uma vez que ser gay inclui não apenas sentimentos pessoais, mas também descreve uma identidade social e política. Essa identidade social e política está sempre em construção e sofre adaptações, já que a construção social e política dos povos também muda. A formação da identidade e do orgulho dos povos negros, seja na África ou na Escravatura, passou por fases muito semelhantes às que passam os LGBT na busca por aceitação na sociedade moderna.

Hoje, a formação não apenas de grupos de apoio aos LGBT em processo de desenvolvimento da própria identidade, mas também de grupos envolvendo espiritualidade numa perspectiva LGBT (não para LGBTs) se mostra muito salutar na medida em que se percebe que alguém que saiu do armário tem muita necessidade de ser ouvido, acolhido e orientado.

Antes de sair do armário, a maioria dos gays não sabe quem é, se desconhece por completo, não consegue se ver no espelho sem um olhar de reprovação, mesmo que não consiga especificar o motivo. O moralismo das religiões formais tem muito a ver com isso, e esse moralismo contamina as famílias dos gays, chegando, ao final, a causar a pressão interna que vemos em quem demora a assumir-se. Este seria o momento ideal para a Nova Espiritualidade agir, acolhendo o LGBT em conflito sem fazer qualquer juízo moral, pois esta não é uma função original da religião – sua função original é levar o homem à felicidade, ao autoconhecimento e a uma vida de harmonia com o todo.

Gays saindo ou já completamente saídos do armário aderem ao “tribalismo”, buscando seus iguais, para compartilhar vida social, amizades e encontrar seu lugar num mundo que os exclui. Uma espiritualidade inclusiva, onde achamos que deva se inserir a Nova Espiritualidade, sempre orientará o indivídio LGBT a não afastar-se das pessoas, mas a integrar-se a elas, em todos os ambientes da sociedade, para não reforçar a “guetificação” LGBT. Se, antigamente, essa “guetificação” foi positiva na organização do movimento LGBT, hoje a ideia mais producente deve ser a integração, favorecendo a conquista de direitos igualitários.

A relação óbvia entre a Identidade Gay e a Espiritualidade está no autoconhecer-se. Primeiro, nos autoconhecemos como seres diversos numa variedade de orientações sexuais disponíveis na natureza. Percebemos nossa orientação como algo comum em outros, ainda que manifestando-se de modo muito peculiar – cada um vive sua sexualidade de modo próprio. Depois, nos autoconhecemos como seres humanos iguais ao demais, com os mesmos sofrimentos, anseios, momentos felizes e objetivos. Então, buscamos a transcendência. Isso é espiritualidade! Se uma religião formal – qualquer uma – não conduz o indivíduo (gay ou não) a isso, não tem qualquer proveito. E, o que não existe, deve ser criado, ou antes, percebido como natural e potencialmente existente...

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Homossexualidade sob a ótica do espírito imortal

Entrevista realizada pelo terapeuta e médium Wanderley Oliveira com o médico Presidente da Associação Médico-espírita de Minas Gerais, Andrei Moreira (link original: http://www.wanderleyoliveira.blog.br/artigos/entrevista-sobre-homossexualidade-com-andrei-moreira-15/09/2010)

1. Homossexualidade é ou não uma doença à luz do Espírito imortal?

“Desde 1973, a homossexualidade deixou de ser classificada como tal pela Associação Americana de Psiquiatria. Em 1975 a Associação Americana de Psicologia adotou o mesmo procedimento, deixando de considerar a homossexualidade como doença. No Brasil, em 1985, o Conselho Federal de Psicologia deixa de considerar a homossexualidade como um desvio sexual e, em 1999, estabelece regras para a atuação dos psicólogos em relação à questões de orientação sexual, declarando que "a homossexualidade não constitui doença, nem distúrbio e nem perversão" e que os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura da homossexualidade. No dia 17 de Maio de 1990 a Assembléia-geral da Organização Mundial de Saúde (sigla OMS) retirou a homossexualidade da sua lista de doenças mentais, a Classificação internacional de doenças (sigla CID). Por fim, em 1991, a Anistia Internacional passa a considerar a discriminação contra homossexuais uma violação aos direitos humanos” - Wikypedia

A Homossexualidade, segundo a ciência, é uma orientação afetivo-sexual normal. Sob o ponto de vista espírita, tem sido catalogada por muitos escritores espíritas como doença ou distúrbio da sexualidade, em franco desrespeito ao conhecimento científico atual. Não há base no conhecimento espírita para se afirmar tal coisa. Não há uma visão que seja consenso sobre o assunto no movimento espírita, mas há excelentes textos dos espíritos André Luiz e Emmanuel nos direcionando o pensamento e a reflexão para o respeito, acolhimento e inclusão da pessoa homossexual, entendendo a homossexualidade como uma condição evolutiva natural (e o termo “natural” como sinônimo de “presente na natureza”), decorrente de múltiplos fatores, sempre individuais para cada espírito, construída ou escolhida pelo espírito, em função de tarefas específicas ou provas redentoras, incluindo aí as condições expiativas e re-educativas devidas a abusos afetivo-sexuais no passado, que parecem ser a causa determinante da maior parte das condições homossexuais, segundo a literatura espírita.

2. Qual a diferença entre orientação e escolha sexual?

Orientação sexual representa o desejo e o interesse afetivo-sexual (note bem: não somente sexual, mas também afetivo) do indivíduo, decorrente de múltiplos fatores, os quais determinam com qual sexo ele se sente realizado para uma parceria íntima. A orientação sexual é fruto da história pessoal do indivíduo, presente e passada; é influenciada pela cultura e pelas identificações psicológicas, porém não controlada ou determinada conscientemente pelo indivíduo. Nasce-se com ela. Escolha é fruto da decisão consciente de se viver ou não a orientação, aceitá-la ou reprimi-la, de acordo com as idealizações e a pressão familiar-social-cultural do meio em que o indivíduo se encontra reencarnado.

3. O homem homossexual se sente uma mulher? A mulher homossexual se sente um homem?

De forma alguma. Identidade e orientação sexual são coisas distintas. Identidade é como o indivíduo se sente, a qual sexo pertence, com qual sexo se identifica psicologicamente. A orientação homossexual representa exclusivamente o direcionamento do afeto e do interesse sexual para indivíduos do mesmo sexo. O homem homossexual tem a sua identidade masculina, sente-se homem, embora possa ou não ter trejeitos afeminados, conforme sua história e identificação psicológica. Igualmente, a mulher homossexual tem a identidade feminina, embora possa ter ou não trejeitos masculinizados. Quando o indivíduo está em um corpo de um sexo, e sua identidade é a do sexo oposto, dizemos que ele é transexual, que é diferente do homossexual.

4. Em todos os casos, o espírito já renasce homossexual? É possível reverter essa orientação?

Há uma diferença entre comportamento homossexual e identidade afetivo-sexual homossexual. Observamos comportamentos homossexuais em indivíduos com doenças psiquiátricas, entre presidiários e soldados em guerra; nessas condições, na ausência da figura feminina, a prática sexual entre iguais praticada por muitos como campo de liberação das tensões sexuais e da busca do prazer. Isso não quer dizer que eles sejam homossexuais. O indivíduo com identidade homossexual é aquele que se sente atraído afetiva e sexualmente por pessoa do mesmo sexo, o que pode ser percebido ou descoberto em diferentes fases da vida do indivíduo. Não podemos afirmar que todos os homossexuais tenham nascido com essa orientação, pois a variedade de manifestações nessa área nos remete a múltiplas causas, embora a literatura mediúnica espírita nos informe de que em boa parte dos casos as pessoas homossexuais trazem de seu passado espiritual a fonte de sua orientação presente.

Não sendo, em si, uma condição maléfica para o indivíduo, mas neutra, podendo ser positiva ou não, dependendo da forma como for vivenciada, não há necessidade de reverter essa condição. A orientação da ciência médica e psicológica atual é de que o indivíduo homossexual que não se aceita e sofre com isso deve ser classificado como portador de transtorno egodistônico, e os esforços devem se direcionar no sentido de auxiliá-lo a se aceitar e se amar tal qual é, sentindo-se digno de amor e respeito, buscando relações que lhe fortaleçam o auto-amor e nas quais possa ser natural, espontâneo e verdadeiro, em busca de sua felicidade e de seu progresso.

Há religiosos e profissionais fundamentalistas que oferecem terapia e assistência espiritual, sobretudo em igrejas evangélicas, para que o indivíduo se “cure” da homossexualidade. Não há registros de casos bem sucedidos. O que frequentemente se observa são indivíduos bissexuais alterando o direcionamento do seu afeto para indivíduos do mesmo sexo, porém muitos deles têm relações sexuais clandestinas com pessoas do mesmo sexo e nos procuram nos consultórios cheios de culpa, medo e vergonha por não se sentirem “curados”. Além disso, há os indivíduos homossexuais que decidem vestir a máscara de heterossexuais e por algum tempo formam famílias; frequentemente, saem de casa após algum tempo para viverem o que sentem como sua real atração afetivo-sexual.

5. Existem casos de homossexualidade desenvolvida exclusivamente pela educação na infância? Em caso afirmativo, é possível reverter o processo?

Segundo Freud, sim, o que não significa que seja passível de reversão ou que haja necessidade disso. Segundo o Conselho Federal de Psicologia a identidade e a orientação sexual estruturadas na infância não são passíveis de reversão, e a homossexualidade não é uma condição que necessite reversão, já que não é uma doença e muito menos um desvio moral. Porém, na visão espírita, os benfeitores espirituais nos informam que o espírito, ao reencarnar, já escolhe a natureza de suas provas e as condições familiares sociais e pessoais necessárias ao seu progresso, conforme sua consciência indique a necessidade de reparação dos equívocos do passado e de melhoramento pessoal. Em outras situações, quando o espírito não se encontra maduro para definir suas provas, elas são estabelecidas por orientadores evolutivos, mas, ainda assim, são definidas previamente à reencarnação. Assim, a família, o corpo que a pessoa tem e os principais pontos da existência já estão definidos para patrocinar as condições necessárias ao progresso do indivíduo. Além disso, o espírito traz impressos em si o fruto de suas escolhas, o resultado de suas experiências passadas, em seu psiquismo e no corpo espiritual, a determinar a identidade e a orientação sexual da presente encarnação.

6. Muitos consideram que a abstinência é uma recomendação educativa no caso de homossexualidade. O que você acha?

Abstinência não representa educação do desejo e da prática sexual. Contudo, pode ser uma etapa necessária em certos casos, para a disciplina dos impulsos íntimos, de heterossexuais e homossexuais, quando se percebam necessitados de controle do desejo e da prática sem limites. Também pode acontecer que tenham a condição de abstinência imposta pela misericórdia divina como recurso emergencial de salvação perante circunstâncias de abusos reiterados nessa área.

Diz Ermance Dufaux, no livro Unidos para o Amor: “Abstinência nem sempre é solução e pode ser apenas uma medida disciplinar sem que, necessariamente, signifique um ato educativo. Por educar devemos entender, sobretudo, a desenvoltura de qualidades íntimas capazes de nos habilitar ao trato moral seguro e proveitoso com a vida. (...) A questão da sexualidade é pessoal, intransferível, consciencial e a ética nesse campo passa por muitas e muitas adequações.”

O Espiritismo recomenda a todas as criaturas a conscientização a respeito da sacralidade do corpo físico e da sexualidade, como fonte criativa e criadora, destinada a ser fonte de prazer físico e espiritual, sobretudo de realização íntima para o ser humano, em todas as suas formas de expressão.

Sintetiza Emmanuel, na introdução do livro Vida e Sexo: “(...) em torno do sexo, será justo sintetizarmos todas as digressões nas normas seguintes: Não proibição, mas educação. Não abstinência imposta, mas emprego digno, com o devido respeito aos outros e a si mesmo. Não indisciplina, mas controle. Não impulso livre, mas responsabilidade (grifos nossos). Fora disso, é teorizar simplesmente, para depois aprender ou reaprender com a experiência. Sem isso, será enganar-nos, lutar sem proveito, sofrer e recomeçar a obra da sublimação pessoal, tantas vezes quantas se fizerem precisas, pelos mecanismos da reencarnação, porque a aplicação do sexo, ante a luz do amor e da vida, é assunto pertinente à consciência de cada um”.

7. O homossexual não consegue de forma alguma ter atração por pessoa do sexo oposto ou isso pode acontecer de forma natural?

Segundo o relatório Kinsey, extensa pesquisa sobre o comportamento sexual humano realizada nos EUA na década de 60 do século XX, pelo biólogo Alfred Kinsey, tanto a homossexualidade como a heterossexualidade absoluta são condições raras em nossa sociedade. A grande maioria das pessoas tem uma condição de desejo predominante, em graus variáveis. Por exemplo, uma pessoa pode ser 80% heterossexual e 20% homossexual ou vice-versa. É natural, portanto, que uma atração heterossexual possa ocorrer na vida de um indivíduo homossexual, o que muitas vezes é entendido pelo leigo como “cura” da homossexualidade.

Emmanuel nos esclarece a respeito dessa realidade no livro Vida e Sexo, cap.21: “através de milênios e milênios, o Espírito passa por fileira imensa de reencarnações, ora em posição de feminilidade, ora em condições de masculinidade, o que sedimenta o fenômeno da bissexualidade, mais ou menos pronunciado, em quase todas as criaturas. O homem e a mulher serão, desse modo, de maneira respectiva, acentuadamente masculino ou acentuadamente feminina, sem especificação psicológica absoluta.”

Podemos compreender assim que todos os indivíduos trazem em sua intimidade a possibilidade de se sentirem atraídos e se apaixonarem por alguém do mesmo sexo (afinal de contas, a pessoa se apaixona por um indivíduo completo, e não pelo seu corpo apenas). Isso não significa que vá ou necessite viver essa situação. O psiquismo atende e responde ao impulso do espírito, que é assexuado, mas que cumpre programas específicos em um ou outro sexo, conforme definição anterior e necessidade evolutiva, inserido em um contexto sociocultural que o limita na percepção e expressão do que vai em sua intimidade profunda.

8. Homem ou mulher que tenham fantasias com pessoas do mesmo sexo podem ser considerados homossexuais?

Na adolescência as experiências homossexuais são naturais, definidas pela psicologia como experiências de experimentação de uma identidade sexual em formação; não atestam, necessariamente, a orientação homossexual. Já no adulto a fantasia é uma das formas de expressão do desejo e da atração homoafetiva e atestam a intimidade da criatura, mesmo que não sejam aceitas pela personalidade consciente.

9. Qual sua avaliação sobre como a comunidade espírita trata a homossexualidade?

Em geral, observamos uma abordagem superficial e discriminatória por parte da comunidade espírita com os homossexuais e a homossexualidade. É compreensível que seja assim, pois todo meio religioso lida com idealizações e preconceitos seculares. Todavia, tal postura pode ser modificada por meio do que recomenda Allan Kardec: estudo sério e aprofundado de um tema para que se possa opinar sobre ele. É lamentável que nós, adeptos de uma fé raciocinada, nos permitamos o mesmo comportamento dos religiosos fundamentalistas.

Observa-se muita opinião pessoal sem fundamento tomada como regra e lei. Tais opiniões costumam ser destituídas de compaixão e amorosidade terminam por isolar o indivíduo homossexual, tachando-o de doente, perturbado, promíscuo e/ou obsediado. Às vezes ele é até mesmo afastado das atividades espíritas habituais, como se fosse portador de grave moléstia que devesse receber reprovação e crítica por parte da parcela heterossexual “normal” da sociedade. Tais posturas são frequentemente embasadas no tradicional preconceito judaico-cristão-ocidental de que a única e exclusiva função da sexualidade é a procriação humana, tomando a parte pelo todo.

O Espiritismo é uma doutrina livre e libertária, compromissada com o entendimento da natureza íntima do ser humano e o progresso espiritual. Nos dá bases muito ricas de entendimento do psiquismo e da sexualidade do espírito imortal, como instrumentos divinos dados por Deus ao homem para seu aprimoramento e felicidade. Além disso, nos oferece esclarecimento a respeito das condições e situações determinadas pela liberdade do homem, que desvia esses instrumentos superiores de suas funções sagradas.

É imprescindível que se extinga em nosso movimento o preconceito e que os homossexuais tenham campo de trabalho, se dediquem ao estudo e à prática da doutrina espírita, com a mesma naturalidade de heterossexuais. Isso, para que compreendam o papel de sua condição em seu momento evolutivo e a utilizem com respeito e dignidade com vistas ao equacionamento dos dramas internos, ao cumprimento dos planos de trabalho específicos em sua proposta encarnatória e ao seu progresso pessoal, da família e da sociedade da qual faz parte, da mesma maneira como deve fazer o heterossexual.

10. Como devem se comportar os pais espíritas de um indivíduo que se descubra homossexual?

Aos pais de uma pessoa homossexual cabe o acolhimento integral e amoroso do indivíduo, com aceitação de sua condição, que nada mais é que uma das características da personalidade. Ser homossexual não é sinônimo de ser promíscuo, inferior, afeminado (para homens) ou masculinizado (para mulheres). Simplesmente atesta que o indivíduo se realiza sexual e afetivamente no encontro entre iguais. A pessoa homossexual deve receber a mesma instrução e educação a respeito da sexualidade que os heterossexuais, a fim de bem direcionar as suas energias e esforços no sentido da construção do afeto com quem eleja como parceiro (a). A postura na vivência da sexualidade, para homossexuais, deve ser a mesma aconselhada pelos espíritos a heterossexuais: dignidade, respeito a si mesmo e ao outro, valorização da família, da parceria afetiva profunda no casamento e dedicação da energia sexual criativa em benefício da comunidade em que está inserido.

O acolhimento amoroso da família é fundamental para que o indivíduo homossexual possa se aceitar, se compreender, entendendo o papel dessa condição em sua vida atual, e para que se sinta digno e responsável perante suas escolhas. A luta, para aqueles que vivem essa condição, é grande, a fim de afirmar a sua autoestima em uma sociedade que banaliza a condição sexual e vulgariza a diferença. A família é o núcleo onde se encontram corações compromissados em projetos reencarnatórios comuns, com vínculos pessoais de cada um com o passado daqueles que com eles convivem, devendo ser cada membro dessa célula da sociedade, um esteio para que o melhor do outro venha à tona, por meio da experiência amorosa.

Os pais de homossexuais poderão ler e compartilhar interessantes experiências de outros pais no site e nos livros de Edith Modesto: http://www.gph.org.br e Livros em: http://www.gph.org.br/publica.asp

11. Gostaria de acrescentar algo?

Romanos 14:14 “Eu sei, e estou certo no Senhor Jesus, que nada é de si mesmo imundo a não ser para aquele que assim o considera; para esse é imundo.”

Todas as experiências evolutivas onde estejam presentes o autorrespeito, a auto-consideração, a autovalorização e o auto-amor são experiências evolutivas promotoras de progresso e evolução, pois aquele que se oferece essas condições naturalmente as estende ao outro na vida. A homossexualidade, independentemente da forma como se haja estruturado como condição evolutiva momentânea do indivíduo, pode ser vivenciada com dignidade e ser um rico campo de experimentação do afeto e construção do amor, desde que aqueles que a vivam se lembrem de que são espíritos imortais e de que a vida na matéria é tempo de plantio para a eternidade, no terreno do sentimento e das conquistas evolutivas propiciadas pelo amor, em qualquer de suas infinitas manifestações.

Diz-nos Emmanuel no livro "Vida e Sexo", lição 21 – Homossexualidade, ed. Feb:

“A coletividade humana aprenderá, gradativamente, a compreender que os conceitos de normalidade e de anormalidade deixam a desejar quando se trate simplesmente de sinais morfológicos, para se erguerem como agentes mais elevados de definição da dignidade humana, de vez que a individualidade, em si, exalta a vida comunitária pelo próprio comportamento na sustentação do bem de todos ou a deprime pelo mal que causa com a parte que assume no jogo da delinqüência.”

E complementa André Luiz, no livro Sexo e destino – Cap. 5, pág 155 - ed. Feb:

“(...) no mundo porvindouro os irmãos reencarnados, tanto em condições normais quanto em condições julgadas anormais, serão tratados em pé de igualdade, no mesmo nível de dignidade humana, reparando-se as injustiças achacadas, há séculos, contra aqueles que renascem sofrendo particularidades anômalas, porquanto a perseguição e a crueldade com que são batidos pela sociedade humana lhes impedem ou dificultam a execução dos encargos que trazem à existência física, quando não fazem deles criaturas hipócritas, com necessidade de mentir incessantemente para viver, sob o sol que a Bondade Divina acendeu em benefício de todos.”

Para saber mais, indico, entre outros, os seguintes livros espíritas, com abordagens responsáveis e bem fundamentadas sobre o assunto:

1- Vida e sexo, Emmanuel/Chico Xavier, em especial cap. 21 - ed. Feb

2- Sexo e destino e Ação e reação - ambos de André Luiz/Chico Xavier - ed. feb

3- Além do Rosa e do Azul - Gibson Bastos - Ed. Celd

4- O Preço de ser Diferente (romance) - Ed. Vida e Consciência

5- Quem Perdoa, Liberta – José Mário/Wanderley Oliveira – Capítulo: "Homoafetividade e Mediunidade"

Sobre Andrei Moreira


Andrei Moreira é médico formado pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais. Integra, desde 2005, uma equipe do Programa de Saúde da Família, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Especializado em Homeopatia. Preceptor do Internato em Atenção Integral à Saúde da Faculdade de Medicina da Universidade de Alfenas, campus BH, desde 2008. Participa ativamente do movimento espírita nacional e internacional, proferindo palestras e seminários. Integra equipes de atendimento a pacientes com a metodologia médico-espírita na Amemg. Presidente da Associação Médico-Espírita de Minas Gerais, desde 2007. Autor do livro: "Cura e autocura – uma visão médico espírita" – AME Editora, 2010 e "Homossexualidade sob a ótica do espírito imortal" – 2012. Contatos: ammsouza@hotmail.com - www.amemg.com.br