Blogue do Movimento Espiritualidade Inclusiva. Artigos sobre visão inclusiva nas diversas formas de espiritualidade; denúncias de preconceito religioso e fundamentalista contra LGBTs; dicas de blogues, sites, filmes e documentários; tradução de artigos; divulgação de eventos LGBT e os inclusivos; notícias do mundo LGBT; decisões legislativas e debates políticos relativos aos direitos LGBT; temas culturais relevantes. Contato: espiritualidadeinclusiva@gmail.com
sexta-feira, 26 de abril de 2013
Carta Aberta da RENACI-LGBT ao Povo Brasileiro contra Marco Feliciano
Por RENACI-LGBT (A RENACI/LGBT – Rede Nacional pela Cidadania LGBT, um coletivo nacional de militantes LGBT independentes, divulga Carta Aberta à população Brasileira rechaçando mais uma vez o Deputado Pastor Marco Feliciano - PSC/SP. Postado originalmente em http://atos420.blogspot.com.br/2013/04/carta-aberta-ao-povo-brasileiro.html)
Carta Aberta ao Povo Brasileiro
O Brasil vive um momento especialmente doloroso.
Assistimos boquiabertos e em espírito de luta a um ataque sem tréguas e sistemático aos Direitos Humanos em nosso país. Direitos Humanos dizem respeito a todos nós, nossos familiares, nossos pais, nossos filhos, vizinhos, amigos, transeuntes na rua, desconhecidos; ao rapaz engraçado da padaria, à moça educada da farmácia, ao simpático cobrador de ônibus, ao padre de nossa paróquia, ao pastor de nossa igreja evangélica ali na rua de trás, à mãe de santo que benze nossos afilhados quando estão de bucho virado, ao senhor que mal fala o português, ao que fala muito bem a nossa língua e por qualquer pessoa que possa passar por nossa cabeça.
2013, Brasil: O Pastor Marco Feliciano (PSC – SP) assume a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados e utilizando-se da fácil penetração que obtém entre as massas começa a produzir um crescente levante contra as liberdades religiosas e individuais no Brasil. Se na Nigéria e em diversos outros países onde existem uma minoria cristã a intolerância religiosa já dizimou milhares de vidas, por aqui a coisa poderá ficar igual ou pior do que nos países sem predominância cristã.
Não, não estamos exagerando. A morte de Pais de Santo e fechamento de Terreiros de Umbanda e Candomblé é incentivada por Marco Feliciano. Em vídeos amplamente divulgados na Internet, ele diz: "Profetizo o sepultamento dos pais de santo. Profetizo o fechamento dos terreiros de macumba." Não contente, ele ataca também a Igreja Católica : "Eu conheço o Deus de Paulo (São Paulo). Não é o Deus dessa religião morta e fajuta em que você está. Se há algum católico entre nós aqui, o que eu duvido muito, mas, se tiver, deixa eu explicar uma coisa. Primeiro: você não pode sentir aquilo que nós sentimos sem experimentar o Deus que nós sentimos. 'Não, pastor, não, pastor, mas eu sou carismático. Eu até aprendi a falar em línguas, colocaram uma fita no rádio e eu decorei.' Esse avivamento é o avivamento de Satanás”.
Marco Feliciano vai mais longe, ele ataca mulheres, negros, homossexuais, católicos, políticos que verdadeiramente lutam pelos Direitos Humanos e qualquer pessoa que não partilhe de sua crença evangélica. Ataca artistas como John Lennon, Mamonas Assassinas e Caetano Veloso.
Desta forma, Marco Feliciano põe em xeque todas as grandes conquistas sociais dos últimos 60 anos. Com um pensamento opressor ele estimula o machismo, o racismo, a homofobia e a misoginia (ódio à mulher) e divide o Brasil em dois grupos: De um lado, armados com versículos bíblicos fora do contexto histórico em que foram apresentados, ficam os que acatam calados seus desmandos contra o segundo grupo que é composto por minorias que já são fragilizadas por inúmeras injustiças históricas ocorridas de forma criminosa e que lentamente tem conseguido seus direitos de forma dolorosa e suada, conquistas alcançadas através de muito suor, sangue e lágrimas.
Além disto, no âmbito político, Feliciano tem abusado de mentiras na tentativa de jogar seus fiéis contra o movimento que deseja vê-lo fora da Comissão de Direitos Humanos e Minorias. Sua assessoria tem lançados vídeos e frases fraudulentas a Deputados que são contrários às suas bizarrices. Uma das vítimas é o Deputado Federal Jean Wyllys, que tem sido caluniado com frequência, e a ele são atribuídas frases que apoiariam a pedofilia e o ódio ao cristianismo. Em uma delas, Feliciano diz que Jean Wyllys defendeu a pedofilia na Radio CBN o que foi prontamente desmentido pelo Grupo em sua página oficial na Rede Social Facebook. Ele também agride fisicamente, através de seguranças e da Polícia Legislativa, manifestantes que se colocam contra ele nas reuniões da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados.
E por tudo o exposto, através desta, viemos em tom de denúncia e suplica ao Povo Brasileiro que entre nesta luta conosco contra Marco Feliciano e a Ditadura Fundamentalista que ele deseja implantar no Brasil.
Na tentativa de criminalizar o movimento, Feliciano usa de artifícios fajutos para jogar a população evangélica e cristã contra nós inresignados brasileiros. Não somos contra qualquer religião, nosso movimento é pluralista, agrega todas as religiões e crenças, bem como todas as identidades de gênero e orientações sexuais. Existem diversos praticantes do cristianismo entre nós!
Outras ações de cunho Fundamentalista estão sendo tomadas no sentido de calar e tolher os Direitos Humanos de quem não compartilha das ideias desse setor evangélico sectário. A Bancada Fundamentalista da Câmara dos Deputados propôs proposta de emenda constitucional, que está em tramitação na casa, permitindo que Igrejas contestem a constitucionalidade de Projetos de Lei aprovados no Congresso Nacional junto ao Superior Tribunal Federal; há outra proposta de emenda à Constituição que subordinará as decisões do STF sobre constitucionalidade de leis a um aval do Congresso, assim, caso uma Lei que vá contra os desejos fundamentalistas sejam vistas como constitucionais pelo STF e que a Bancada Fundamentalista não deseje que ela seja válida, poderá retornar ao Congresso e ser derrubada. Isto torna-se um perigo real se lembrarmos que a Bancada Fundamentalista barra todo e qualquer projeto de lei ou ato normativo que protejam os mais básicos direitos das pessoas LGBTs, tais como a criminalização da homofobia e transfobia, o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, parceiro como dependente do INSS, direitos sexuais e reprodutivos da mulher, direito de religiões minoritárias, prevenção às DST/AIDS, educação contra a homofobia e transfobia junto a jovens e crianças, entre outros projetos de relevantes para a igualdade entre todos os brasileiros e brasileiras, independentemente de sexo, gênero, orientação sexual, identidade de gênero, raça, condição social, religião, origem. Além de perniciosos no que diz sobre Direitos Humanos, estes projetos atacam diretamente a independência assegurada ao Judiciário por meio da histórica e clássica regra da separação três poderes no Brasil.
Não desejamos que seja tolhido nosso direito de escutar a música que desejarmos, de torcer pelo time que amamos. Queremos continuar a tomar nossa cerveja nos fins de semana, depois de muitos dias de trabalho. Desejamos poder ir ao culto religioso que acalente nossos corações sem medo. Queremos amar as pessoas e casar com quem desejarmos sem o medo de sermos mortos ali na esquina. Quero poder cumprimentar a benzedeira que cuida de nossas mazelas, quero saber que ainda teremos cultura indígena no Brasil. Não desejamos que se ofendam por sua cor, raça, sexo, religião, orientação sexual, gosto musical, identidade de gênero ou qualquer outro quesito. Somos todos iguais perante a Lei e não pode haver divisão de classes entre melhores e piores. Marco Feliciano não deseja isto, ele deseja uma Ditadura Religiosa e Fundamentalista no Brasil.
Não somos o movimento LGBT, como ele quer fazer crer. Aliás, também somos o movimento LGBT, mas, somos também homens, somos mulheres, somos negros, somos brancos, somos católicos, somos evangélicos, somos budistas, somos harekrishnas, somos umbandistas, somos candomblecistas, somos ciganos, somos trabalhadores, somos estudantes, somos heterossexuais, somos homossexuais, somos bissexuais, somos transexuais, somos travestis, somos assexuados, somos férteis, somos inférteis, somos corintianos, somos palmeirenses, somos vascaínos, somos flamenguistas, somos atleticanos, somos crianças, somos adolescentes, somos idosos, somos desempregados, somos gordos, somos magros, somos soropositivos, somos deficientes, somos brasileiros, somos estrangeiros, somos você! Somos iguais a você!
Somos um Brasil contra o Fundamentalismo de qualquer religião. E não desejamos ver nenhum massacre como os que estão acontecendo em países não-cristãos! Não queremos esta reprodução.
O Brasil é o país do futuro e por isto é o país do amor e da tolerância! Junte-se a nós!
RENACI–LGBT Rede Nacional Pela Cidadania LGBT
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quinta-feira, 25 de abril de 2013
Nota da ANNEB – Aliança de Negras e Negros Evangélicos do Brasil contra o fundamentalismo religioso
Postado por Prª. Wall e Pr. Will em 14 abril 2013 às 17:30 (postado originalmente em http://negrosnegrascristaos.ning.com/profiles/blogs/anneb-ltimos-acontecimentos-em-torno-da-elei-o-da-presid-ncia-da e reproduzido aqui pela relevância)
NOTA PÚBLICA Nº 01 - 2013
Tema: Últimos acontecimentos em torno da eleição da Presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal
Assunto: Pronunciamento
Nós, da ANNEB – Aliança de Negras e Negros Evangélicos do Brasil vimos reafirmar o nosso compromisso com as Sagradas Escrituras (AT e NT), cujos valores inspiram a nossa luta contra toda e qualquer forma de discriminação à dignidade humana. O próprio Senhor Jesus Cristo, em seu evangelho, nos constrange a buscar entre todas as pessoas e de forma integral (Corpo, Alma e Espírito) uma vivência marcada pelo amor, pela justiça e pela paz, como testemunho autêntico de fé e compromisso com o seu Reino, principalmente com aquelas e aqueles que são consideradas e considerados mais vulneráveis em nossa sociedade.
Afinal, como bem diz o evangelho de Lucas 9.56 “O Filho do homem não veio para destruir as almas das pessoas, mas, para salvá-las”. Consequentemente, Jesus Cristo, por não fazer acepção de pessoas, convida a todos à vida plena, ao continuar dizendo: “Vinde a mim todos os que estais cansados e oprimidos e eu vos aliviarei” (Mt.11.28).
Isto posto, é nesse espírito de paz, justiça e amor que, de forma firme e irrevogável, nós, afiliadas e afiliados da ANNEB, repudiamos veementemente os pronunciamentos injuriosos contra as mulheres, os afrodescendentes e os homossexuais, proferidos pelo atual Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal.
Justificativa:
Nós, brasileiras e brasileiros, formamos um povo plural do ponto de vista étnico-racial. A diversidade assim compreendida é pauta atual e imprescindível nas relações sociais, institucionais e religiosas. Ao mesmo tempo é tão antiga como a imagem do corpo utilizada por Paulo (I Cor. 12.12), a qual evidencia a importância das diferenças das partes e a igualdade de valor de todas para o bom funcionamento do corpo, mesmo diante de classificações preconceituosas como: esta parte é melhor ou mais nobre que outras.
Embora afirmemos o ensino bíblico de que Deus criou a mulher e o homem e que esta é a sexualidade reconhecida pelas Igrejas Evangélicas, respeitamos o direito de escolha das pessoas homoafetivas, visto que vivemos numa sociedade democrática. Todavia, entendemos serem também inalienáveis os direitos iguais aos evangélicos no que tange à opção pela heterossexualidade.
Com efeito, o impasse que ora se estabelece na sociedade exige de todos nós, serenidade, maturidade e, sobretudo, responsabilidade em nossos discursos. Por isso, lamentamos a falta de preparo científico e amor fraterno do atual Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal, ao se pronunciar sobre temas, que no mínimo, nos convida a uma reflexão mais criteriosa.
A propósito, segundo Freitas, Arantes e Perilo (2010), essa possível virada icônica; hetero-homo; deve ser vista tanto no sentido da sexualidade-afetiva, quanto numa perspectiva política. De certa forma, a homossexualidade é também uma proposta de reorganização social, implicando em remanejo do capital econômico. Nesse sentido, o movimento homossexual deixa de ser visto como uma mera reação ao moralismo e passa a ser uma resposta à repressão e à exploração perpetrada por um sistema econômico patriarcal que junto com a modernidade já dá sinais de exaustão. Por aí se vê, que meros reducionismos ou mesmo, a violência verbal, não servirão em nada para dignificar o debate democrático. Isto posto, entendemos que precisamos de um moderador, cujo perfil esteja profundamente comprometido com a diversidade cultural e religiosa do nosso país. Não vemos esse perfil na atual presidência.
Reconhecemos que o racismo, os preconceitos e as discriminações são tratados nas igrejas e nas instituições evangélicas como tabu e com restrições. O assunto tem ensejado idéias de demonização e negativismo a respeito do povo negro e de seus costumes e tradições. Um exemplo disso são as afirmações do atual Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal, primeiro, atribuindo uma pseudo-maldição bíblica sobre as e os afro-descendentes, o que se constitui tanto uma perversidade, quanto um desrespeito crasso da exegese bíblica. Em tempo, a interpretação de textos sagrados a serviço da política ou mesmo da dominação e do controle social, não tem sido incomum na história da humanidade.
Nesta mesma linha de raciocínio, segue a segunda afirmação do Presidente em apreço, reforçando as representações machistas, ao propor a negação de direitos iguais às mulheres. Certamente, o mesmo não conhece a realidade das mulheres brasileiras, a começar de sua própria comunidade de fé. Não sabe que no país em que vive, mais da metade das famílias são monoparentais, chefiadas por mulheres. O nobre Senhor, não acompanha os jornais que diuturnamente demonstram que nossas mulheres estão sendo assassinadas. Certamente, o mesmo não tem tido interesse de acompanhar os últimos relatórios do Conselho Mundial de Igrejas que demonstram que “68% dos atendimentos a mulheres vítimas de violência, a agressão aconteceu na residência”.
Portanto, é inadimissível um parlamentar tão inconsequente em seus discursos os quais certamente, não representa as evangélicas e os evangélicos, as brasileiras e os brasileiros, incluindo católicas e católicos, comprometidas e comprometidos com uma vivência consciente dos valores do Reino de Deus (Paz, Justiça e Amor).
Nós da ANNEB entendemos, portanto, que dependendo da epistemologia cultural que uma dada sociedade alimente, haverá ou não respeito com a diversidade cultural de suas cidadãs e de seus cidadãos. E as religiões reúnem universos culturais simbólicos altamente diversos, por isso, a discussão dos direitos humanos certamente passa também pelo viés religioso. Do contrário, como bem nos lembra (Leitão e Vieira, 2010), “resta-nos a astúcia da ideologia da guerra e da classe oposta à outra”.
Referências
FREITAS, Fátima Regina Almeida; ARANTES, José Estevão Rocha; PERILO, Marcelo de Paula Pereira. Combatendo o preconceito: Discriminação e homofobia – Curso de Especialização, Diversidade Cultural e Cidadania, Universidade Federal de Goiás, 2010.
INFORMATIVO REGIONAL DA IGREJA METODISTA. 5ª RE. Ano 16. Janeiro-Fevereiro de 2013.
LEITÃO, Rosani Moreira e VIEIRA, Marisa Dama. Diversidade cultural e Cidadania In CIAR (Centro Integrado de Aprendizagem em Rede, UFG), 2010.
Assessoria:
Rev. José Roberto Alves Loiola
Relatoria Ministerial
Encaminhada para ANNEB-DF em 02/04/2013.
sábado, 20 de abril de 2013
Amar o homossexual e abominar a homossexualidade: sobre o amor pela metade
Por Luciano Freitas Filho
“O que é próprio das sociedades modernas não é o terem condenado o sexo a permanecer na obscuridade, mas sim o terem-se devotado a falar dele sempre, valorizando-o como o segredo.” Michel Foucault
As discussões e polêmicas atuais em torno das questões LGBT nos leva a refletir sobre vários apontamentos feitos por quem apóia ou por quem condena a Diversidade Sexual. Dentre essas questões, elencamos o discurso de alguns religiosos evangélicos ao afirmar o amor pelo homossexual, mas a condenação à prática da homossexualidade, sugerindo, inclusive, a “cura”.
Quando leio ou escuto esse discurso, vem em mente refletir acerca da coerência no que se prega. Respeitar e ter “bem-querer” por um homossexual e não tolerar sua homossexualidade é contraditório e, sobretudo, um discurso desprovido de sentido. Imaginemos, por exemplo, amar o negro e condenar sua negritude, amar o sujeito oriental e ter antipatia por seus “olhinhos puxados”.
A contradição em foco se dá quando vemos ou percebemos o corpo do LGBT desarticulado de sua alma, vemos naquele desejo e/ou afeto algo desprovido de significado, enxergamos uma mecânica sexual meramente instintiva. O homossexual e sua homossexualidade se completam e coabitam em um corpo e espírito que não é desprovido de desejo, de eroticidade e, sobretudo, de afetividade. Não há sentido amar homossexuais e condenar sua homossexualidade, não existe amor pela metade.
A nossa homossexualidade não é tudo o que somos na condição de pessoa humana, ela não configura o que somos na integralidade enquanto sujeitos do/no mundo. Entretanto, ela é parte constitutiva do que somos na condição de pessoas em relação com o mundo e com as pessoas que nele (co)existem.
Desatrelar o homossexual de sua Orientação afetivo-sexual é o mesmo que afirmar um sujeito assexuado, uma “entidade desencarnada”. A homossexualidade é constitutiva do homossexual na condição de humano, de indivíduo demasiadamente humano. É na linguagem e pela linguagem do meu corpo, que me constituo como sujeito na íntegra. Enquanto homossexuais, somos constitutivos da nossa relação com o mundo e do mundo conosco. É dialético, dialógico e, essencialmente, digno.
Pensemos, pois, sujeito na condição de objeto. Ao despir o homossexual de sua homossexualidade, coisificamos o sujeito, e isso por si só é de uma violência e mesquinhez ímpar, de longe é significado de amor para com meu próximo. É sem dúvida, mesmo que sem intencionalidade, um ato de homofobia, uma violação carnal do corpo, e essa homofobia, coadunando com Borrilo (2001), constitui-se como uma ameaça aos valores democráticos de compreensão e de respeito ao outro.
Não há cura para o que não precisa ser curado. Na verdade, o que precisa de cura e o que vem destruindo e abalando as relações da família não são os LGBT, mas sim as contradições e a persistência do capitalismo como discurso e prática em poder. O Desenvolvimento econômico das cidades reclama a solidez e seu firmamento, a “melhoria do bem estar das pessoas”, entretanto, sem humanização ela empurra para a fluidez, para o estado líquido, as relações familiares e as relações humanas como um todo.
Quando afirmamos amar o homossexual e condenar sua homossexualidade nos travestindo com/de boa-fé, estamos na verdade agindo de má-fé.
Sobre o autor
Luciano Freitas Filho é Secretário Nacional LGBT do PSB.
quinta-feira, 18 de abril de 2013
[Documentário] O Mesmo Amor
Por Espiritualidade Inclusiva
A pedidos, apresentamos aqui o vídeo-documentário "O Mesmo Amor", que mostra o trabalho realizado no Brasil pelas Igrejas Inclusivas.
O vídeo-documentário "O Mesmo Amor" foi produzido por quatro pessoas em parceria com a produtora Firehouse Media. "O Mesmo Amor" aborda a temática da homossexualidade dentro da religião, focando na existência de igrejas cristãs inclusivas. Os produtores Luiza Judice, Mariane Galacini, Ligia Dumit e Paulo do Valle são formados em Jornalismo pela PUC-Campinas e o vídeo é resultado de um projeto de conclusão de curso, produzido, gravado e editado de forma totalmente independente (e com o conteúdo bastante autoral).
"Em tempos de Felicianos, Malafaias, Bolsonaros e a intolerância (ou ignorância/desconhecimento) de grande parcela da população, acreditamos que o tema do documentário incita a reflexão, repensa a tolerância e proporciona discussões por outro viés do assunto." [Palavras de Luiza Judice, uma das produtoras do vídeo]
O MESMO AMOR [documentário]:
http://www.youtube.com/watch?v=KzXmnrG7-Fk
O documentário "O Mesmo Amor" é um retrato da relação de homossexuais com a religião a partir da história de vida de personagens que encontraram, dentro de um ambiente religioso que acolhe a diversidade, conforto e realização com a própria fé. O projeto tem como foco a Igreja Cristã Evangelho Para Todos, uma das primeiras igrejas cristãs do Brasil a pregar a Teologia Inclusiva.
Parabéns aos produtores pela iniciativa!
A pedidos, apresentamos aqui o vídeo-documentário "O Mesmo Amor", que mostra o trabalho realizado no Brasil pelas Igrejas Inclusivas.
O vídeo-documentário "O Mesmo Amor" foi produzido por quatro pessoas em parceria com a produtora Firehouse Media. "O Mesmo Amor" aborda a temática da homossexualidade dentro da religião, focando na existência de igrejas cristãs inclusivas. Os produtores Luiza Judice, Mariane Galacini, Ligia Dumit e Paulo do Valle são formados em Jornalismo pela PUC-Campinas e o vídeo é resultado de um projeto de conclusão de curso, produzido, gravado e editado de forma totalmente independente (e com o conteúdo bastante autoral).
"Em tempos de Felicianos, Malafaias, Bolsonaros e a intolerância (ou ignorância/desconhecimento) de grande parcela da população, acreditamos que o tema do documentário incita a reflexão, repensa a tolerância e proporciona discussões por outro viés do assunto." [Palavras de Luiza Judice, uma das produtoras do vídeo]
O MESMO AMOR [documentário]:
http://www.youtube.com/watch?v=KzXmnrG7-Fk
O documentário "O Mesmo Amor" é um retrato da relação de homossexuais com a religião a partir da história de vida de personagens que encontraram, dentro de um ambiente religioso que acolhe a diversidade, conforto e realização com a própria fé. O projeto tem como foco a Igreja Cristã Evangelho Para Todos, uma das primeiras igrejas cristãs do Brasil a pregar a Teologia Inclusiva.
Parabéns aos produtores pela iniciativa!
segunda-feira, 15 de abril de 2013
O Bom ou o Ótimo: Qual PLC 122 queremos?
Por Paulo Stekel
(coordenador geral do Movimento Espiritualidade Inclusiva)
Paulo
Stekel, 42 anos, natural de Santa Maria (RS), reside atualmente em
Canoas (RS). Músico, jornalista, prof. de línguas sagradas e
especialista em escritas antigas, de origem católica, se converteu
ao Budismo em 1995. Assinou declaração de união estável (2007) em
cartório de Porto Alegre (RS), com o companheiro com o qual vive há
quase 12 anos. É ativista em assuntos relacionados à
espiritualidade e Direitos LGBT, sendo administrador do blogue e
coordenador do Movimento Espiritualidade Inclusiva, ambos lançados
em dez/2011. Autor de mais de mais de 50 artigos sobre a relação
entre Espiritualidade, Sexualidade e Diversidade.
Introdução
No dia 25 de março de
2013, o Senador Paulo Paim fez um discurso no Senado Federal
intitulado “Pronunciamento sobre o PLC 122 que criminaliza a
homofobia”. Na qualidade de relator do Projeto de Lei da Câmara
122, conhecido por muitos como o Projeto da Lei Anti-homofobia, Paim
deu um tom muito claro, positivo e favorável à aprovação de um
projeto que realmente contemple as necessidades da comunidade LGBT
brasileira.
Lemos o discurso,
fizemos algumas considerações, o debatemos com colegas de ativismo
LGBT e, na quinta-feira (28 de março), em audiência com o próprio
Senador Paim, em Canoas – RS, juntamente com diversos defensores
dos Direitos Humanos, pudemos esclarecer alguns pontos do referido
discurso. As respostas que obtivemos diretamente do relator foram
plenamente satisfatórias, fazendo-nos ver que temos até o momento o
melhor relator que o PLC 122 poderia ter: um homem comprometido com
os movimentos sociais (afrodescendentes, aposentados, deficientes,
etc.) desde o início de sua militância política e, antes de tudo,
um conciliador. Um relator radical seria, com certeza, um tiro no pé.
O radicalismo muitas vezes tem norteado o debate e se faz necessário
um relator que saiba colocar o debate em seu devido lugar: a
violência contra minorias, uma delas, a LGBT.
Em nossa conversa, o
Senador Paim deixou bem claro que três conceitos o nortearão como
relator na definição do texto final do PLC 122: o ódio, a
violência e a intolerância. Lhe respondemos que nós,
os LGBT, queremos exatamente a coibição destas três formas de
preconceito contra nossa minoria. Não queremos mais do que isso, não
queremos fechar templos religiosos, não queremos trancafiar pastores
e não queremos queimar a Bíblia. Só queremos os mesmos direitos de
todos os demais cidadãos e a proteção contra atentados à nossa
integridade física e moral. A alegria dele ao ouvir isso foi
inspiradora. Não falamos por TODOS os LGBT, mas por experiência e
conhecimento de como funcionam as coisas, falamos pela maioria
sensata.
O tom da relatoria
O Senador Paim deixou
claro, e concordamos com ele, que é preferível a aprovação de um
projeto “bom” para todos – de forma que possamos nos resguardar
do ódio, da violência e da intolerância –, à aprovação de um
projeto “ótimo”, o que, dadas as forças democráticas em jogo,
é geralmente muito difícil ou mesmo impossível de se conquistar
num primeiro momento. Paim disse que prefere colocar em votação o
“bom”, por ser mais fácil aprovar e um primeiro passo para irmos
adiante. Faz sentido. Sabemos que as forças radicais deste país não
querem nem mesmo a aprovação do “bom”, mas isso não vem ao
caso, pois o debate vai aumentar a cada dia e vamos continuar lutando
e defendendo nossas necessidades cidadãs.
Há radicalismos em
todos os lados nesta questão. Há radicalismos fundamentalistas,
ideológicos, político-partidários... Nada disso contribui, de
fato, para o debate, apenas acirra os ânimos. Na construção de um
texto final adequado que contemple os três pontos a ser enfrentados,
conforme citados por Paim – ódio, violência e intolerância –
nenhum radicalismo é adequado, mas, sim, o consenso e a contribuição
de todos os interessados, garantindo a legitimidade do que venha a
ser aprovado. Em geral, os mais radicais, de que lado venham, são as
pessoas que menos conhecem o próprio PLC 122, como bem frisou Paim
em nossa conversa. A maioria nem sequer leu o projeto, não sabe o
que ele propõe, e usa de argumentos desviantes, para ganhar atenção
e forçar a opinião pública. Neste artigo, nossa principal função
é esclarecer os diversos formadores de opinião, sejam LGBT ou não.
O que o PLC 122 diz
em sua redação atual
Um percentual
considerável de pessoas envolvidas no debate em questão não sabe
minimamente o que o PLC 122 propõe. Não vamos transcrever o projeto
todo, mas, apresentando-o em seus pontos cruciais, ele diz o seguinte
(grifamos os trechos que interessam à comunidade LGBT):
Projeto de Lei da
Câmara Nº 122, de 2006 (nº 5.003/2001, na Câmara dos Deputados)
O CONGRESSO NACIONAL
decreta:
Art. 1º Esta Lei
altera a Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, o Decreto-Lei nº
2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e a Consolidação
das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de
maio de 1943, definindo os crimes resultantes de discriminação ou
preconceito de gênero, sexo, orientação sexual e identidade de
gênero.
Art. 2º A ementa
da Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, passa a vigorar com a
seguinte redação:
“Define os
crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor,
etnia, religião, procedência nacional, gênero, sexo, orientação
sexual e identidade de gênero.” (NR)
(…) Art. 4º A
Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, passa a vigorar acrescida do
seguinte art. 4º-A:
“Art. 4º-A
Praticar o empregador ou seu preposto atos de dispensa direta ou
indireta:
Pena: reclusão de
2 (dois) a 5 (cinco) anos.”
Art. 5º Os arts.
5º, 6º e 7º da Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, passam a
vigorar com a seguinte redação:
“Art. 5º
Impedir, recusar ou proibir o ingresso ou a permanência em qualquer
ambiente ou estabelecimento público ou privado, aberto ao público:
Pena: reclusão de
1 (um) a 3 (três) anos.” (NR)
“Art. 6º
Recusar, negar, impedir, preterir, prejudicar, retardar ou excluir,
em qualquer sistema de seleção educacional, recrutamento ou
promoção funcional ou profissional:
Pena – reclusão
de 3 (três) a 5 (cinco) anos.
Parágrafo único.
(Revogado).” (NR)
“Art. 7º
Sobretaxar, recusar, preterir ou impedir a hospedagem em hotéis,
motéis, pensões ou similares:
Pena – reclusão
de 3 (três) a 5 (cinco) anos.” (NR)
(...)Art. 7º A Lei
nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, passa a vigorar acrescida dos
seguintes art. 8º-A e 8º-B:
“Art. 8º-A
Impedir ou restringir a expressão e a manifestação de afetividade
em locais públicos ou privados abertos ao público, em virtude das
características previstas no art. 1º desta Lei:
Pena: reclusão de
2 (dois) a 5 (cinco) anos.”
“Art. 8º-B
Proibir a livre expressão e manifestação de afetividade do
cidadão homossexual, bissexual ou transgênero, sendo estas
expressões e manifestações permitidas aos demais cidadãos ou
cidadãs:
Pena: reclusão de
2 (dois) a 5 (cinco) anos.”
(...)Art. 9º A Lei
nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, passa a vigorar acrescida dos
seguintes arts. 20-A e 20-B:
“Art. 20-A. A
prática dos atos discriminatórios a que se refere esta Lei será
apurada em processo administrativo e penal, que terá início
mediante:
I – reclamação
do ofendido ou ofendida;
II – ato ou
ofício de autoridade competente;
III – comunicado
de organizações não governamentais de defesa da cidadania e
direitos humanos.”
“Art. 20-B. A
interpretação dos dispositivos desta Lei e de todos os instrumentos
normativos de proteção dos direitos de igualdade, de oportunidade e
de tratamento atenderá ao princípio da mais ampla proteção dos
direitos humanos.
§
1º Nesse intuito, serão observadas, além dos princípios e
direitos previstos nesta Lei, todas as disposições decorrentes de
tratados ou convenções internacionais das quais o Brasil seja
signatário, da legislação interna e das disposições
administrativas.
§
2º Para fins de interpretação e aplicação desta Lei, serão
observadas, sempre que mais benéficas em favor da luta
anti-discriminatória, as diretrizes traçadas pelas Cortes
Internacionais de Direitos Humanos, devidamente reconhecidas pelo
Brasil.”
Art.
10. O § 3º do do art. 140 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 – Código Penal, passa a vigorar com a seguinte
redação:
“Art.
140.
…......................................................................................................................
§
3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes à
raça, cor, etnia, religião, procedência nacional, gênero, sexo,
orientação sexual e
identidade de gênero, ou a condição de pessoa idosa ou portadora
de deficiência:
Pena:
reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos e multa.” (NR) (...)
O
texto original (2001) era menor e menos amplo que o atual, de 2006. O
que o Senador Paim, relator do Projeto, se propõe agora, é ampliar
o debate, dando voz a todos os setores da sociedade, favoráveis ou
contrários. O relatório que ele produzirá – segundo ele mesmo –
será feito a partir de muitos argumentos, mas sempre pautado pelo
debate internacional em curso, de modo que sirva para o combate à
homofobia, que é o que queremos. Isso está muito claro no discurso
a que nos referimos no início deste texto, e o qual comentaremos
trecho a trecho a seguir (os grifos são nossos).
O discurso do
relator
“Pronunciamento
sobre o PLC 122 que criminaliza a homofobia.”
Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores
Senadores,
A Constituição da
República contém, no conjunto de suas diretrizes para a construção
do Brasil que sonhamos, indiscutível vetor civilizatório, que nos
propõe a convivência social harmoniosa, coesa, tolerante e
hospitaleira.
Não há lugar, no
País livre e democrático que desejamos construir, para a aceitação
da discriminação e da intolerância, de qualquer
matiz.
Não aceitamos, no
Brasil, a discriminação racial ou decorrente das orientações
sexuais dos indivíduos. Por esta razão, estamos debatendo o
Projeto de Lei da Câmara nº 122 de 2006, que criminaliza a
homofobia.
Comentário:
Aqui, já se pode perceber o tom nitidamente anti-discriminatório que
norteará o relatório a ser produzido para o PLC 122. Ao citar a
discriminação racial imediatamente antes da discriminação por
orientação sexual, o relator deixa evidente a similitude existente
nas naturezas de ambas as formas de discriminação: a intolerância
com o outro por causa de sua pressuposta “diferença” (racial,
étnica, sexual, etc) e não encaixamento num status quo e
modus vivendi arbitrária ou culturalmente determinado pela
parcela dominante da sociedade (a branca e heterossexual, neste
caso). Baseado nesta noção óbvia, a via de equiparação do crime
de homofobia ao de racismo não nos parece inadequada nem impossível
de ser levada adiante. Em ambos os casos, a odiosa não aceitação
do outro por sua “diferença” é o mote para atos violentos
prejudiciais à dignidade do indivíduo – física e/ou moralmente.
Senhoras e Senhores
Senadores,
Os debates que dizem
respeito à diversidade sexual passam por questões de
conteúdo moral e religioso.
Em uma sociedade
plural e democrática, todas as correntes filosóficas;
teológicas; ideológicas; todo e qualquer grupo de pressão
merece expressar sua visão no espaço público.
A convivência
pacífica nas ruas e bairros da cidade impõe ao Estado igualdade no
tratamento a crentes e descrentes; a ateus, agnósticos ou àqueles
que acreditam no Criador do Universo.
Comentário:
Este trecho evidencia a importância do Estado Laico na
promoção e manutenção da paz na nação. Caso contrário,
qualquer corrente citada poderia interferir de modo majoritário na
vida da sociedade, obrigando correntes opostas a seguir regras
aviltantes conforme a natureza de suas crenças. Mas, não é assim.
Num Estado Laico as diferentes crenças têm seu direito à
existência e expressão garantidos, ressalvadas as formas previstas
em lei que redundem em prejuízo à vida (ex. apologia ao nazismo), à
dignidade (ex. racismo) ou à auto-estima de qualquer dos gêneros
(ex. preconceito contra a mulher), conforme definido pela Declaração
Universal dos Direitos do Homem.
Contudo, realmente o
debate acerca da diversidade sexual “passa” no mundo todo por
questões morais e religiosas. Mas, sob o ponto de vista de um Estado
Laico, tais questões morais e religiosas jamais poderiam impedir a
livre expressão sexual ou de gênero a cidadãos que possuem
“moralmente” os mesmos direitos, sob pena de um preconceito “aos
moldes” do racismo escravagista do qual o Brasil, aliás, foi o
último a se afastar. O seremos também no que concerne à homofobia?
Lutaremos para que assim não seja!
Se pegarmos a
Constituição da República, do inesquecível dia 05 de outubro de
1988, veremos, no caput do art.5º, um entre os mais importantes
vetores da Carta, que regula nossa vida coletiva.
A Constituição
Brasileira promove a dignidade da pessoa humana, e o seu art.
5º estabelece que, em nosso democrático País (abro aspas), “Todos
são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País
a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade privada, nos termos seguintes” (fecho
aspas).
Em seguida, o art.
5º oferta à sociedade brasileira seu longo e admirável catálogo
de Direitos Fundamentais, distribuídos em nada menos que 78 incisos
que se destinam, pela força de nosso pensar e agir coletivos, a
viabilizar a mais completa emancipação, tanto material quanto
espiritual, do povo brasileiro.
Vislumbramos,
portanto, a convivência mais harmônica e respeitosa dos membros da
sociedade brasileira, muito embora reconhecendo que a razão de ser
da Política, o seu suporte e seu núcleo residem, exatamente, na
administração dos conflitos em sociedades complexas, na certeza de
que no transcurso infindável do tempo, o debate nos preserve,
minimamente, o direito à própria expressão.
Comentário: Quando
a Constituição Federal garante a “dignidade da pessoa humana sem
distinção de qualquer natureza”, não deveríamos nem ter que
estar postulando através de um Projeto de Lei que a dignidade da
pessoa humana LGBT seja respeitada sem distinção de qualquer
natureza. Mas, uma Constituição democrática não é um texto
perfeito, nem parado no tempo, e nem consegue contemplar todas as
noções sociais ou as demandas de setores da sociedade
igualitariamente. Obviamente, deve ser adequada, e é exatamente isso
o que queremos com a aprovação do PLC 122.
O mesmo vale para as
demandas dos idosos e dos deficientes físicos, como citados no Art.
10º do projeto atual e aos quais nós, os LGBT, somos totalmente
solidários. Mesmo porque, em nosso Brasil, o preconceito se sobrepõe
ao preconceito. Temos o gay negro, o gay negro idoso, o gay negro
idoso e deficiente físico, a mulher negra idosa e deficiente
física... enfim, os estratos de preconceito se sobrepõem como
escaras de chibatas recorrentes ao longo de uma vida inteira... É
preciso corrigir isso o mais rápido possível, sob risco de regarmos
a semente de uma nação preconceituosa que não queremos para os que
virão depois de nós.
Se algum espaço
houver, na prática de uma Política que se queira maiúscula, em
qualquer sociedade avançada, é preciso compreender que a
intolerância legalmente albergada e aceita, não é compatível com
a democracia. A democracia não tem como tolerar a própria
intolerância.
Em uma discussão no
âmbito físico e espiritual do espaço público, de relevância para
a coletividade, parece politicamente inegociável que a livre
expressão represente a condição de base para a garantia da
liberdade humana.
O ser humano, dotado
de consciência e razão, nasce livre em sua essência mais profunda.
Desprovido de
liberdade, calado em seu direito mais sagrado de tomar a palavra na
rua ou na praça, terá morrido, espiritualmente, para a vida social
e até mesmo privada.
Comentário:
Realmente, quando a intolerância é aceita ou deixada livre em
uma nação plural, a semente do ódio e do levante se instala, pois
o ser humano tem um limite no sofrimento que lhe pode ser imposto. O
descontentamento dos povos, etnias e minorias oprimidas tem um limite
histórico bem conhecido, especialmente nos últimos séculos. Já
estamos ouvindo falar em uma “Primavera Gay” no Brasil, um
levante ideológico LGBT para pressionar mudanças na lei inspirado
nos moldes da “Primavera Árabe”. Será que precisamos deixar as
coisas chegarem a este ponto, quando bastaria reconhecer o que a
própria Constituição Federal franqueia a todos os cidadãos
brasileiros? Pois, a aprovação do PLC 122 seria este
reconhecimento.
A quem interessa manter
o status atual de preconceito homofóbico desenfreado em nosso
país? A fundamentalistas religiosos? A neonazistas? A conservadores?
Como podem invocar motivos religiosos para cometer ou incitar crimes
num país laico? Como podem incitar ou cometer assassinatos contra
pessoas unicamente por sua orientação sexual num país que não
criminaliza orientações diversas da heterossexual? Como podem
relacionar os direitos das orientações não-heterossexuais ao “fim
da família tradicional” num mundo em que o padrão pai-mãe já
foi quebrado há décadas? Podem porque a lei ainda não os coíbe!
Nós, LGBT, ainda estamos num verdadeiro “limbo jurídico” que
depende da boa vontade de magistrados quando o assunto é nossa
segurança, dignidade, direito à vida e mesmo benefícios sociais
franqueados a quaisquer outros cidadãos. Isso é inaceitável sob
todos os pontos de vista!
Senhoras e Senhores
Senadores,
O púlpito deste
plenário, no Senado da República, representa nada menos que o
espaço democrático da livre expressão das unidades federativas e,
consequentemente, de cada uma de suas gentes, e esta prerrogativa
historicamente construída deve se reproduzir em todos os aspectos da
vida coletiva.
Em nossa visão, ao
Estado laico cumpre a tarefa de a todos ouvir, indistintamente, sem
se deixar dominar por esta ou aquela visão de mundo; sem que se
admita a errônea cristalização, no ordenamento jurídico, de
concepções ultrapassadas que, visando uniformizar mulheres e homens
não uniformizáveis, culminem na supressão do direito inalienável
das minorias.
Ao representante
público, portanto, pouco importa os termos com que uma determinada
confissão religiosa ou filosófica, ou de setores da sociedade,
encaram fenômenos demasiado humanos, como a homossexualidade ou a
diferenciação de cor dos indivíduos.
Quero pontuar
novamente que, em uma sociedade que se pretenda democrática, a
vontade geral só poderia admitir a intolerância, nos estritos
marcos legais, contra a própria intolerância.
Comentário:
Este trecho é maravilhoso! O Estado Laico deve ouvir a todos, sem
distinções, mas, ao mesmo tempo, não deve se deixar influenciar a
ponto de cometer injustiças. A imparcialidade laica aqui está clara
tanto quanto, mais uma vez neste discurso, a natureza da
(homos)sexualidade e da cor dos indivíduos, sob o ponto de vista da
igualdade e do direito à existência, bem como de expressão, por
extensão.
Entre os dispositivos
de coerção social aplicados ao longo da História – por vezes
justa ou injustamente – cremos que os únicos incontestavelmente
niveladores da igualdade são, nas palavras do relator, os que
admitem a intolerância apenas “contra a própria intolerância”.
Intolerar a intolerância, quando partindo do Estado, é tutelar a
liberdade, garantindo sua expressão plena e igualitária, algo que a
intolerância perniciosa extrai do sujeito humano de modo vil e cruel
assim que se manifesta.
Acreditamos ser
nosso dever e nossa salvação combater as compreensões de mundo
que vislumbrem a uniformização dos seres humanos a partir de
réguas, critérios e particularidades que lhes sejam próprios.
A infeliz
experiência de autoritarismos e totalitarismos, em países
supostamente avançados, como a Itália, o Japão e, principalmente,
a Alemanha da primeira metade do século 20, mostram claramente que a
felicidade humana deve ser veiculada pelo debate livre, que nos
conduza à aceitação das mais variadas formas de vida, na certeza
de que o pluralismo social vem a ser nossa maior riqueza.
Comentário:
Esta é a grande luta enfrentada pelas mulheres, depois pelos
afrodescendentes e, agora, pelos LGBT. A uniformização de toda uma
sociedade a partir de noções particulares ou originadas em setores
dela atenta contra a dignidade geral. A História está repleta de
exemplos. A loucura de um único homem ao qual se permitiu
descuidadamente uma ascensão sem avaliação criteriosa de
consequências – Hitler – quase determinou a sobrevivência de
uma etnia inteira – a judaica. Quando a ajuda chegou, os mortos já
eram da ordem de milhões...
E, no caso da
homofobia? Qual deverá ser o “teto” na estatística de
assassinatos para que a sociedade brasileira se dê conta do
“homocausto” (holocausto gay) que está sendo promovido em nosso
país, nas palavras do decano do movimento LGBT brasileiro, Luiz
Mott? Não estamos mais dispostos a aceitar a morte de mais nenhum
LGBT por conta de homofobia, porque o valor de QUALQUER vida humana é
o mesmo! Nossa solução? A aprovação do PLC 122.
Por isso, em face
do renitente preconceito de raça ao afrodescendente ou da
intolerância aos gays, às lésbicas, aos bissexuais e aos
transgêneros, reiteramos, no Senado da República, o direito de
todos e de cada um à dignidade da própria existência; o
direito de todos e de cada um ao exercício cotidiano de sua
liberdade de ser e à livre escolha no que diz respeito à
vida privada.
Consideramos
desumana toda e qualquer forma de intolerância que resulte na ofensa
moral ou física a quem quer que seja e temos trabalhado
diariamente, no Senado, pela construção de um País francamente
acolhedor a todos os seres humanos, indistintamente.
Comentário:
Terceiro trecho que equipara argumentos pró-lei anti-racismo a
uma necessidade de mesma defesa no caso dos LGBT, combatendo
preconceito, a ofensa moral, promovendo o direito à dignidade, à
liberdade de ser e à livre escolha na vida privada. Creio que, indo
por este caminho, aprovaremos o PLC 122 e teremos uma implantação
semelhante à da lei anti-racismo: um processo gradual, suave e sem o
absurdo alardeado por seus opositores – o que também aconteceu à
época do debate sobre a lei anti-racismo –, ou seja, de um risco
de denuncismo e prisões em massa ou por qualquer motivo que não a
homofobia em si. Quem pensa assim, não entende nada de Direito
Criminal, nem dos procedimentos de uma delegacia, que precisa da
denúncia, da averiguação das provas e testemunhas, e só então
pode levar adiante o procedimento, considerando ainda a possibilidade
de falso testemunho. A aprovação do PLC 122 não vai colocar todos
os não-LGBT sob suspeição de homofobia. Pelo contrário, vai
garantir a expressão em todos os setores de uma diversidade já
vista em nichos da sociedade não norteados pelo preconceito.
Senhoras e Senhores
Senadores,
Considero importante
relembrar, no âmbito da religiosidade, que, na obra máxima da
cristandade, a Bíblia sagrada, o admirável Paulo manifesta sua
perplexidade ante as contradições da existência humana,
reconhecíveis em cada um de nós.
Diz o apóstolo de
Cristo: “Porque não faço o bem que quero, mas o mal que não
quero esse faço”.
Vou tomar
emprestadas as poéticas palavras de Paulo para me reportar à
quantidade de barbárie cotidiana em nosso País, em que uma mulher é
fisicamente agredida a cada cinco minutos; ou no mundo, em que
crianças de todos os continentes são alvo diário da violência de
adultos brutalizados, e sofrem com a exploração, abusos e doenças,
ou enfrentam, em sua mais linda idade, a necessidade de deixar seus
lares por conta de conflitos armados; sob governos que não lhes
garantem educação básica.
Exatamente porque,
no mundo em que vivemos, mulheres e homens não fazem o bem que
desejam fazer, mas apenas o mal que não querem, cerca de 218 milhões
de menores submetem-se, diariamente, ao inaceitável trabalho
infantil e entre elas, 300 mil atuam na condição de
crianças-soldado.
Impõe-se a todos
nós, portanto, trabalhar pela inversão da máxima do apóstolo
Paulo, tanto mais porque o mundo em que vivemos parece estar
gravemente adoentado.
Nele, as almas
perdidas frequentemente governam e tiranizam, submetendo a seu jugo
populações inteiras, por anos ou décadas.
No Brasil, acredito
que a lenta e paciente organização de nossa democracia irá nos
conduzir à gradativa neutralização da intolerância.
Comentários: As
almas perdidas realmente parecem ganhar cada vez mais e mais terreno,
e aqueles que vivem pregando o bem que se deveria fazer – os
religiosos – muitas vezes são os primeiros a colocar o seu
preconceito baseado em ideias arcaicas acima do bem que deveriam
defender e fazer. Os exemplos estão às avessas e tem cabido aos
oprimidos lembrar aos líderes as suas obrigações para com a
Humanidade...
Não faz muito tempo
nós vivíamos concepções de mundo mesquinhas e antigas, que
tiranizavam africanos e afrodescendentes e que negavam às mulheres o
direito à voz e a qualquer atuação fora dos estreitos limites do
próprio lar.
Nós seguimos
apostando no aprofundamento dos níveis de educação como antídoto
à brutalização de nossa vida social.
No País que
desejamos, todas as escolhas lícitas e não ofensivas ao direito do
próximo merecerão de todos o máximo respeito, e do Estado a
natural acolhida.
Comentário:
Afrodescendentes e mulheres já gozam de (relativos) direitos e
reconhecimento de suas naturezas junto à sociedade brasileira, mas
dos LGBT poderíamos dizer, repetindo as palavras do relator, que
ainda somos observados sob a vista de concepções de mundo
mesquinhas e antigas, que nos tiranizam e nos negam o direito à voz
e a qualquer atuação fora dos estreitos limites do próprio lar...
ops, nem mesmo do próprio lar, pois a alienação familiar é
frequentemente causa de uma das formas mais cruéis de homofobia, a
que tem levado muitos jovens LGBT ao suicídio ou a uma vida à
margem.
O Poder Judiciário
brasileiro, por exemplo, tem caminhado neste sentido, reconhecendo
a casais homossexuais a licitude da vida comum partilhada,
inclusive no que se refere às repercussões patrimoniais de sua
opção.
Comentário: Com
certeza, o Judiciário anda décadas à frente do Legislativo no
reconhecimento dos direitos das minorias. O aumento considerável no
número de decisões favoráveis a casais homossexuais deve servir
como recado a nossos parlamentares – o de que a sociedade
brasileira não está tão despreparada como querem nos fazer crer os
fundamentalistas no tocante a um novo modelo de família que não
seja constituído exclusivamente pelo padrão pai-mãe heterossexual.
O reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo pelo
STF e a reavaliação do que constitui núcleo familiar estão
adiante da coibição dos crimes de homofobia, o que é um flagrante
contra-senso; podemos nos unir diante de um cartório por entendimento
legal, mas não podemos nos defender do preconceito violento através
de uma lei que nos inclua. Discrepâncias fomentadas pela morosidade
de nosso Legislativo em ouvir as vozes da sociedade oprimida e
dar-lhes devida proteção legal...
Ao Estado laico
cumpre reconhecer, nas centenas de milhares de ativistas
políticos reunidos, anualmente, nos desfiles públicos em favor
dos direitos dos homossexuais, em todo o Brasil, a
indiscutível existência de um grupo de pressão, tão legítimo
e válido quanto os defensores dos interesses de empresários, de
trabalhadores, de donas de casa; tão aceitável quanto os cidadãos
que promovem os Direitos Humanos e, dentre estes, os defensores dos
direitos dos afrodescendentes; os promotores dos direitos dos
portadores de necessidades especiais; entre inúmeros outros
exemplos.
Quero com essa
menção reiterar que, em uma sociedade plural, todos os lícitos
interesses do cidadão pagador de impostos merecem acolhida e
reconhecimento pelo Estado, que pondera interesses na realização
do conceito de bem comum.
Comentário:
Ainda que as inúmeras Paradas Livres (ou Paradas Gays) realizadas
Brasil afora possam ser objeto de crítica de todos os lados, na
verdade, o que elas causam é um mal-estar no estômago dos
preconceituosos, a quem o mais odioso é ver minorias se expressando
livremente e buscando seu espaço de direito no Estado Laico. O
resto, é moralismo e hipocrisia para desviar a atenção do maior
objetivo do movimento LGBT: a conquista de direitos igualitários.
Não direitos especiais, mas igualitários. Quem nos acusa de buscar
direitos especiais, acima dos demais cidadãos deveria ver o quão
contraditório é o que diz. Se não temos nem sequer direitos
igualitários, como poderíamos postular algo especial? De forma
alguma! Este NUNCA foi e NUNCA será o objetivo do ativismo LGBT.
Somos, sim, um grupo de pressão, como muitos que desembarcam em
Brasília todos os dias com os mais variados interesses; e, somos,
como os demais, pagadores de impostos.
Senhoras e Senhores
Senadores,
Tenho a grata
satisfação de atuar, na Comissão de Direitos Humanos do Senado,
como relator do Projeto de Lei da Câmara nº 122, de 206, que
criminaliza a homofobia.
Na condição de
relator, tenho a intenção de dar amplitude ao debate, pela
abertura do espaço democrático de nossa Comissão às vozes da
sociedade, contrárias ou favoráveis à proposta em debate.
Por meio de
audiências públicas, pretendo produzir um relatório equilibrado e
em consenso com o debate internacional em curso, que contemple
todos os interesses em jogo, ao mesmo tempo em que sirva para o
combate à homofobia, ao ódio e à violência gratuita que campeia
no Brasil.
A premissa com
que pretendo nortear o debate é a premissa maior de que todos somos,
a despeito de nossa cultura, de nossa opção religiosa ou orientação
sexual, contrários à homofobia, na medida em que a liberdade
humana está na base dos Direitos Humanos.
Comentário:
Este trecho é o mais claro do discurso do relator, pois dá o tom de
sua relatoria. A amplitude do debate é importante para a
legitimidade do processo. Por vezes, será acirrado, mas a democracia
o permite, nos limites da lei.
As audiências públicas
já estão em curso e devem se intensificar nos próximos meses.
Todas as forças – favoráveis e contrárias – já se movimentam
para fazer valer suas ideias. Eis a hora da sociedade brasileira se
posicionar e dizer se é conivente com o preconceito violento que
ceifa vidas humanas por conta de sua orientação sexual ou se é uma
sociedade de paz, fraterna, que busca o amor ao próximo e que não
aceita o ódio, a violência e o assassinato em circunstância
alguma.
Um país em que alguns
cidadãos não possuem a mesma liberdade dos demais, estando sujeitos
a diversas formas de violência quando decidem expressá-la
abertamente, não é um país totalmente livre, pois seu próprio
preconceito, velado ou às claras, o mantém preso ética e
moralmente numa escuridão espiritual cruel.
Senhoras e Senhores
Senadores,
Vemos no debate
humano, desde tempos imemoriais, a voz audível de intelectuais
humanistas, que fazem engrandecer e avançar, geração após
geração, o valor inegociável da liberdade humana.
Pensadores como Elie
Wiesel, nascido na Transilvânia e de confissão judaica, tendo
perdido, aos 15 anos, a mãe, o pai e uma irmã nos campos nazistas
de extermínio, afirmou o seguinte: (abro aspas) “Eu jurei nunca
ficar em silêncio onde os seres humanos estiverem passando por
sofrimento e humilhação. Devemos sempre tomar partido.
Neutralidade ajuda o opressor, nunca a vítima. O silêncio
encoraja o torturador, nunca o atormentado” (fecho aspas).
Ainda que
profundamente marcado por sua vivência infeliz de aniquilamento e
ódio, Elie Wiesel, ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 1986,
costumava relembrar que “O oposto do amor não é ódio, mas
indiferença”, e logrou trabalhar por um mundo melhor, mais
livre e mais aberto à aceitação das diferenças.
Comentário: Isso
nos permite concluir que neutralidade e indiferença, quando se trata
de confrontar opressões, são mais cruéis do que se pensa, pois
passam uma procuração subliminar ao opressor para que ele continue
agindo impunemente. Quando fundamentalistas se recusam a debater o
PLC 122 ou mesmo a propor uma redação mínima que defenda os
oprimidos (e, nunca propuseram uma redação mínima que nos
contemple) e pregam que não somos objeto de direito protetivo, mas
que deveríamos “fazer nossas coisas” no escuro de nossos
quartos, longe de seus olhos, isso é, nitidamente, opressão da pior
espécie, além de falta de uma espiritualidade que contradiz o que
pregam.
Nunca tivemos embates
religiosos violentos no Brasil. Nunca tivemos levantes sociais sérios
por aqui. Nunca entramos em guerra com outro país desde a formação
da República. Vamos, agora, criar a semente de um embate entre
religiosos fundamentalistas e movimentos sociais porque o Estado
Laico está sob ameaça devido a interferências impensadas em
qualquer país sério? Nenhum cidadão consciente e de bem deseja
isso!
Senhoras e Senhores
Senadores,
O tempo presente nos
incita à ação coletiva em defesa das liberdades.
Neste ano de 2013,
em que a Igreja Católica escolheu seu novo Papa, que terá por
desafio a bem-vinda renovação valorativa do cristianismo no mundo,
vale relembrar que a octogenária Rainha Elizabeth Segundo, da
Inglaterra, assinou nova Declaração de Direitos Humanos
contrária à discriminação de homossexuais, apoiada por 54
Estados.
Comentário:
Pois bem, se a octogenária Rainha da Inglaterra, a quem poderíamos
facilmente julgar a fina flor do conservadorismo europeu, reconheceu
os direitos dos homossexuais, como podemos nós, que pertencemos ao
Novo Mundo, promessa de renovação do planeta, demorar tanto tempo
para aprovar mecanismos legais de defesa dos oprimidos? Estamos muito
atrasados e não há mais tempo a perder!
O Brasil generoso,
aberto, democrático, conciliador e plural haverá de reforçar, em
todo o mundo, os melhores exemplos de tolerância e de hospitalidade,
primando pelas garantias inerentes à liberdade humana, uma vez que,
nas palavras do sociólogo português Boaventura Souza Santos, (abro
aspas) “temos o direito de ser iguais quando nossa diferença
nos inferioriza, e temos o direito de ser diferentes quando a nossa
igualdade nos descaracteriza. Daí a necessidade de uma igualdade
que reconheça as diferenças e de uma diferença que não produza,
alimente ou reproduza as desigualdades” (fecho aspas).
As minorias no
Brasil sempre reiteram que, dadas as condições humanas, “ser
diferente é normal”, e o que pretendemos, no Senado da
República, é fomentar e garantir o direito inalienável de que
cada concidadão nosso busque, de maneira lícita e que mais lhe
aprouver, a própria felicidade, que orienta a trajetória
pessoal de cada indivíduo no mundo.
Era o que tinha a
dizer,
Sala das Sessões,
22 de março de 2013.
Senador Paulo Paim.
Comentário: A
nossa busca por Felicidade, no momento, passa pela garantia de nossa
própria integridade física, não contemplada plenamente na lei
brasileira, do ponto de vista jurídico. Mais do que “diferentes”
nós, LGBT, somos “diversos” e, em nossa diversidade, devemos ser
reconhecidos como naturalmente existentes e não um produto
artificial de qualquer ordenamento comportamental consciente ou
mutável por (auto)flagelação. Não podemos ser curados porque não
somos doentes; não podemos ser mudados porque não escolhemos ser
como somos; não podemos ser escondidos porque estamos sob o mesmo
sol e pisando no mesmo solo da Pátria, Mãe Gentil! Lutaremos até o
fim pelos nossos direitos inalienáveis já reconhecidos
internacionalmente, não esmoreceremos nunca, e seremos, sim, um
grupo de pressão cada vez mais forte, pois a fraqueza nos tem matado
em maior número a cada dia sob os olhares “neutros” e
“indiferentes” daqueles que deveriam nos defender pelo simples
fato de sermos seres humanos...
À guisa de
conclusão
De tudo o que
analisamos acerca do discurso do relator Paim vislumbramos uma
conclusão óbvia e inspiradora: a aprovação do PLC 122 não será
o fim, mas apenas o começo de um processo de valorização da
dignidade e da identidade LGBT no Brasil, além de um exemplo e
recado para o resto do mundo: nós existimos e temos os mesmos
direitos de todos!
A impressão que o
Senador Paim nos causou foi muito positiva, de modo que realmente
temos esperança de que ele está e continuará do lado dos oprimidos
– como já o demonstrou em seu histórico impecável. Ainda que
pese sua neutralidade como relator, para poder promover um debate
plural, podemos considerá-lo nosso aliado e alguém mais que
interessado e comprometido com o bem comum, a segurança, a
integridade e a dignidade de todos nós, os LGBT.
A parte que compete a
ele é ser o relator. A nossa parte é contribuir com o debate de
modo intenso e participativo, para que a redação final contemple
nossas necessidades. Como sugere o título deste artigo, o PLC 122
que queremos pode ser o “ótimo”, mas assim, certamente não será
aceito por muitas forças contrárias. O PLC 122 “bom”, que
contemple o enquadramento legal do ódio, violência e intolerância
aos LGBT, certamente será aprovado pois, em caso contrário, será o
fim da democracia livre chamada BRASIL! Contudo, como o texto final
do Projeto ainda não foi produzido, no momento não podemos dizer,
de fato, qual seria o texto “ótimo” e qual seria o texto “bom”.
Cabe-nos fazer a lição de casa, posicionando-nos e contribuindo
para a construção deste texto. Mãos à obra!
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paulo stekel,
PLC 122
quinta-feira, 11 de abril de 2013
Uma veste, um culto e um pouco de teologia – A assustadora ideia de um homossexual com poder
Por André Musskopf [publicado originalmente em http://andremusskopf.blogspot.com.br/2013/04/uma-veste-um-culto-e-um-pouco-de.html]
Uma das frases e cenas de que mais gosto no filme Milk – A voz da igualdade é quando ele (Milk) tem uma vitória na Câmara dos Conselheiros garantindo-lhe poder de negociação com o Prefeito. Pensativo, ele diz: “Um homossexual com poder... isso é assustador”. Isso não deixa de ser verdade para qualquer espaço de atuação, inclusive na Igreja. Há várias formas de se materializar o poder que alguém detém ou supõe-se que detenha. Embora não seja essa a sua função, não é incomum no senso comum ou mesmo em algumas teologias bastante questionáveis, atribuir-se poder a alguém, preferencialmente aos homens, quando em trajes especiais como albas, batinas, talares, camisas com gola clerical e outros modelos com nomes mais complicados e aparências ostentatórias. O terno e a gravata também entram nesse rol de “vestes de poder”, embora o argumento para usá-lo ao invés de vestes litúrgicas mais tradicionais seja comumente o de se vestir de maneira comum para justamente não reafirmar a diferença entre o ministro (autoridade) e a comunidade (leiga). Mas e quem é que, no meio do povo, usa terno e gravata em seu cotidiano? O fato é que, mesmo que concordemos que a roupa, ou no caso as vestes litúrgicas, não conferem nem representam um poder especial à pessoa no exercício de tarefas ministeriais, há um poder simbólico que não passa despercebido.
Isso fica mais evidente quando se trata supostamente de um “gay” e, ainda mais, “um militante da causa gay”. Um homossexual usando uma veste litúrgica e co-celebrando um culto... isso sim é assustador! – para algumas pessoas. É fato que para os mais em dia com as discussões teológicas sobre ordenação ao ministério eclesiástico, ministério geral de toda pessoa crente, culto cristão e outras questões relacionadas não há nenhum problema teológico ou dogmático em um “gay” ou mesmo um “militante da causa gay”, batizado e membro da Igreja co-celebrar um culto usando veste litúrgica semelhante aos/às demais celebrantes. Afinal, a veste litúrgica tem única e exclusivamente a função de identificar as pessoas responsáveis e ministrantes de uma celebração litúrgica, sem lhe conferir nem poder ou status especial diante da comunidade que compõe o corpo de Cristo, sem nenhuma distinção de mérito. Ainda assim, mais do que a ideia a imagem de algo dessa natureza tem aparentemente um poder simbólico sobre quem se depara com o fato de que algo assim pode acontecer.
Alguns/as podem dizer “é assim que deve ser”; “eu sinto a presença do Espírito Santo”; “é tão bom ver isso acontecer”; “esse é o seu lugar”; e outros/as podem dizer que “isso é um escândalo”; que “a Igreja não deveria permitir”; que “isso é uma falta de ética”; que é “como Renan Calheiros estar na Comissão de Ética: é regulamentarmente correto, porém eticamente equivocado” (será que diríamos o mesmo a respeito do Deputado Marco Feliciano na presidência Comissão de Direitos Humanos e Minorias?). E como nossa teologia não alcança para questionar a participação litúrgica de um gay (e militante) num culto cristão, poderíamos sair em busca de uma outra justificativa que dê algum alento para a assustadora imagem que essa realidade evoca – um homossexual com poder. Invoquemos a tão abusada (e necessária) ética e teremos uma racionalização teológica capaz de impedir o triunfo apocalíptico da aberração final de nosso bem religioso mais precioso. Será?
Meus senhores! Até nisso uma tal teologia não alcança. Se adentrarmos no campo da ética cristã, por exemplo, teremos que colocar as nossas cartas na mesa. O repetir de versículos bíblicos ou a invocação do tão caro princípio protestante sola Scriptura é apenas um mascaramento para a falta de traquejo no campo da ética teológica. Afinal, nenhuma ética cristã se sustentaria, começando pelas Escrituras Hebraicas ou mesmo apelando exclusivamente para o Testamento Cristão (antes ou depois do processo de canonização), sem o diálogo com os dois mil anos de cristianismo e, principalmente, com os desafios colocados a cada nova geração – ou seja, a experiência real e cotidiana de cristãos/ãs e suas experiências de fé. Talvez mesmo os/as luteranos/as mais ortodoxos/as não exatamente compreendam o que significa o princípio sola Scriptura no contexto da teologia luterana (para me manter nessa linha específica do pensamento teológico). Até mesmo aí teríamos que entrar no campo da história da interpretação do texto bíblico e utilizar as ferramentas disponíveis para a sua compreensão no contexto mais amplo das relações e formas de conhecimento contemporâneas. É... dá um certo trabalho. Mas falar de ética implica pelo menos nisso, assim dizem os currículos das instituições teológicas por aí. E ainda assim, seria necessário discutir em que consiste a falta de ética nesse caso específico – da expressão simbólica de um homossexual com poder co-celebrando um culto cristão.
Se tivermos acordo sobre o que implica a participação numa prática litúrgica (no caso um culto eucarístico) conforme descrito acima, a falta de ética não estaria na simples participação. Como no caso de Renan Calheiros, reconheceríamos a legitimidade regulamentar (talvez dogmática e doutrinária) dessa participação. A falta de ética estaria, então, em algo anterior, ou seja, no fato de ser “um gay”, “militante da causa gay”, a aceitar tomar parte em tal evento e considerando tais condições. Mais do que isso, a falta de ética talvez não estivesse nem no fato de “ser” um gay, mas muito mais no fato de ser um “militante da causa gay” - e mais uma vez estamos muito mais no campo do poder simbólico do que do poder efetivo, afinal, na prática, “um gay”, “militante da causa”, tem pouco ou nenhum poder efetivo numa estrutura institucional que nega a sua existência ao se negar a dialogar com e sobre a mesma, mesmo quando emite (e nisso concordaríamos) documentos teologicamente frágeis e politicamente irrelevantes.
Fiquemos, por ora, no campo do poder simbólico. O que há de anti-ético, do ponto de vista da ética teológica cristã em “ser gay” e “militar na causa gay”? Como discutido acima, no campo da discussão ética, seria necessário muito mais do que alguns versículos bíblicos para estabelecer um posicionamento conclusivo a esse respeito (como, aliás, nem muitas igrejas tem feito), sem discutir o tema do ponto de vista da história (inclusive da interpretação bíblica) e da realidade concreta de pessoas (inclusive batizadas e membros da Igreja) no atual momento histórico. Não me parece, do que tenho visto por aí, que exista algum posicionamento eticamente sustentável quanto ao caráter anti-ético de ser ou militar na causa gay (dentro ou fora da igreja), mas eu certamente estaria aberto a discutir essas questões. No caso específico do exercício do ministério ou de funções ministeriais (como é o caso de uma celebração litúrgica) talvez o mais assustador seja que um homossexual não se apresenta para dita ocasião vestindo um “talar rosa”, pois muitos/as já ouviram falar acerca de um livro que eu mesmo escrevi e onde discuto a questão de “homossexuais e o ministério na igreja”. Embora tenham ouvido falar, se guardam em seu imaginário e em suas fantasias a ideia de que um gay, militante, defendesse (pelo simples fato de ser gay e militante) o uso de um dito “talar rosa”, seguramente não leram o livro e muito menos estão em condições de fazer julgamentos pseudo-éticos sobre a participação de um homossexual, usando vestes litúrgicas, num culto cristão. Afinal, é muito mais assustador se um homossexual se apresenta para essa tarefa sem a marca de sua exclusão (o talar rosa), mas apenas como um de nós, pois assim, qualquer um de nós poderia ter a sua sexualidade questionada. E então, já nem é mais de ética que estamos falando.
Deve ser mesmo assustadora a imagem de um homossexual de vestes litúrgicas co-celebrando um culto para quem se agarra e defende as estruturas de poder (mesmo eclesiásticas) que continuam pervertendo o Evangelho de Jesus Cristo e a Palavra de Deus. De minha parte, agradeço a Deus pelas bênçãos e peço coragem e lucidez na caminhada. Pois mesmo quando me canso de fazer essas conversas tendo em vista a falta de capacidade reflexiva e crítica de alguns/as, ao fazê-lo, me relembro porque dediquei tanto da minha vida ao estudo da teologia e como é delicioso o trabalho teológico quando se deixa Deus atuar e nos surpreender.
Sobre o autor
André Musskopf é teólogo luterano. Bacharel, Mestre e Doutor em Teologia pela Escola Superior de Teologia (EST). Área de Concentração: Teologia Sistemática. Pesquisador nas áreas de: Estudos Feministas, Teorias de Gênero, Teoria Queer, Masculinidade, Homossexualidade e Diversidade Sexual, na sua relação com Religião e Teologia. Mora em São Leopoldo - RS.
Blog: http://andremusskopf.blogspot.com.br - Contato: asmusskopf@hotmail.com
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terça-feira, 9 de abril de 2013
Ato Canoense de Repúdio a Marco Feliciano
Por Coletivo LGBT e Simpatizantes de Canoas
Ato
Canoense de Repúdio a Marco Feliciano
No dia
12 de abril, Canoas mostrará que é contra todas as formas de
discriminação. Manifestação Fora Feliciano movimentará vários
grupos discriminados na Praça do Avião.
09
de abril de 2013, Canoas - A exemplo do que já
acontece desde março em todo o Brasil, Canoas mostrará nesta
sexta-feira (12) que Feliciano não a representa! O Ato Canoense
de Repúdio a Marco Feliciano está sendo organizado pelo
Coletivo LGBT e Simpatizantes de Canoas, com apoio de diversos
setores da sociedade civil, religiosos de matriz africana, ONGs de
ativismo LGBT, Escolas de Samba e todos os indignados com o
preconceito que Marco Feliciano representa.
Ele não
é o único, mas representa em seu discurso radical todas as formas
de discriminação presentes em nosso país. Suas declarações têm
atingido negros, mulheres, homossexuais e minorias religiosas.
Algumas
frases de Feliciano: “Africanos descendem de ancestrais
amaldiçoados por Noé, isso é fato” - “Eu profetizo a falência
do reino das trevas. Profetizo o sepultamento dos pais de santo.
Profetizo o fechamento dos terreiros de macumba. Profetizo a glória
do Senhor na Terra.” - “A podridão dos sentimentos dos
homoafetivos levam ao ódio, ao crime, a rejeição.” - “A AIDS é
o câncer gay.”
É em
repúdio a estas formas cruéis de preconceito que vários movimentos
sociais de Canoas se manifestarão. A concentração será a partir
das 17h no Calçadão e, em seguida, haverá uma caminhada até a
Praça do Avião, onde a sociedade civil se manifestará.
Assinam o
Ato de Repúdio:
-
Coletivo LGBT e Simpatizantes de Canoas;
-
Movimento Espiritualidade Inclusiva;
-
Gabinete do Vereador Paulinho de Odé;
- ONG
Parceiros da Diversidade;
- FAUERS
(Federação Afro-Umbandista Espiritualista do RS);
- UNIAXÉS
(Movimento pela União dos Axés);
- Escola
de Samba Rosa Dourada;
- Escola
de Samba Acadêmicos de Niterói.
Coletivo
LGBT e Simpatizantes de Canoas
Redes
sociais: http://www.facebook.com/groups/coletivolgbtcanoas
Fones:
(51) 8416-6063 (Flávio Paim); 9217-5164 (Paulo Stekel); 9583-0205
(Ver. Paulinho de Odé)
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