terça-feira, 13 de dezembro de 2011

O que é “Espiritualidade Inclusiva”

Por Paulo Stekel

A espiritualidade inclusiva (em inglês, inclusive spirituality) só pode ser definida após deixarmos claro o significado dos dois termos relacionados: espiritualidade e inclusão.

Espiritualidade é uma dimensão do ser que traduz, conforme as diversas crenças, religiões e filosofias religiosas, o modo de viver e agir típico de alguém que busca a plenitude da sua relação com o transcendental. Ainda que nas diversas religiões essa dimensão possua suas nuanças, podemos dizer que a espiritualidade “traduz uma dimensão do homem, enquanto é visto como ser naturalmente religioso, que constitui, de modo temático ou implícito, a sua mais profunda essência e aspiração” (George Brown, em Spirituality: history and perspectives).

O termo inclusivo vem de Inclusão, o ato de incluir, compreender ou encerrar.

Então, espiritualidade inclusiva é uma espiritualidade que inclui. Inclui o que? Inclui todos, independentemente de sexo, gênero, classe social, raça, etnia, tendência política e orientação sexual. Uma espiritualidade inclusiva não demoniza ninguém; não vê o sexo como algo sujo, mas divino; não vê um gênero como superior a outro; não privilegia classes sociais; não reconhece “raças superiores”, mas apenas uma raça: a humana; não denigre a imagem ou os valores de qualquer etnia; não tem preconceito com relação a tendências políticas; não exclui pessoas por causa de sua orientação sexual... Ou seja, é uma espiritualidade afinada com a Declaração Universal dos Direitos do Homem no seu significado mais profundo.

Enquanto a religião, no seu aspecto formal, institucionalizado, é um sistema fechado, dogmático e de diálogo unilateral, a espiritualidade é algo subjetivo que transcende os limites da religião formal, sendo esta sim, aberta ao diálogo e viva, no sentido de que está conectada ao homem em movimento no mundo, biológica e socialmente.

Há algumas décadas que pesquisadores internacionais têm estudado o caso de pessoas que se consideram “espirituais”, mas não “religiosas”. Alguns inserem essa ideia no conceito de “nova espiritualidade”, mas, a mais das vezes, se trata simplesmente de alguém que manifesta uma “espiritualidade inclusiva”, ou seja, baseada no interior e sem rótulos, e não na religião exterior, que é um rótulo em si. A verdadeira intenção por trás da espiritualidade inclusiva é unir as pessoas, o que tem muito a ver com o que a palavra “religião” significa: “reunir”. Espiritualidade inclusiva é reunir corpo e alma, crenças e valores, razão e paixão, espiritualidade e religião. Assim, você não tem nem que escolher entre espiritualidade e religião, bastando ser você mesmo, amando incondicionalmente e vivendo além dos rótulos.

A espiritualidade inclusiva respeita e considera todas as tradições, religiosas ou não, inclusive a ciência, bem como a Sabedoria Antiga, todas as linguagens e metáforas humanas. A espiritualidade inclusiva é Universal, humanista, e é a visão daqueles que buscam um despertar transcendental fora dos rótulos da religião formal, ainda que sejam membros praticantes de alguma. O importante é que estes não confundem os rótulos com a realidade... Afinal, a espiritualidade é um aspecto significativo e integral da vida humana, e, reconhecendo-se o espírito inato de cada pessoa, deve-se reconhecer também que existem caminhos diversos para nutrir o espírito humano. A espiritualidade inclusiva reconhece que a espécie humana está dentro da grande comunidade da vida. Não há caminhos certos ou errados, ou melhores, mas apenas diferentes, outras maneiras.

Uma abordagem espiritual inclusiva considera que todos os homens nascem ou são criados iguais, dotados de direitos inalienáveis pertencentes a todos. Ainda que abrace a conexão inevitável entre o Transcendente (Deus, Consciência Suprema, Buda, etc.) e o Estado, distingue Deus da Igreja, o Sagrado do Profano, especialmente para fins de governo. Isso, porque cada um busca seu caminho para o Transcendente, ou mesmo caminho algum... E, isto está em seu direito inalienável oriundo do fato de alguém simplesmente ter nascido e estar vivo, em pé de igualdade com qualquer outro ser vivo.

Isso é difícil de compreender quando se sente a verdade de modo tão apaixonado que ela acaba por excluir os que não a sentem, sendo estes considerados “os não-salvos”. Então, o fanatismo (a visão estreita e fechada, baseada no temor, violentamente proselitista e “demonizante” do diferente, uma espiritualidade compartimentada, fragmentada) se instala e os fundamentos são vistos de forma absoluta num mundo de coisas relativas – eis a origem do moderno conceito de “fundamentalismo”.

Nesse contexto, é possível ser gay e ter uma vida “espiritual” quando as religiões, em sua maioria, condenam a homossexualidade? É possível que se aceitem as várias direções da sexualidade sem recair em argumentos fragmentados do que seja essa sexualidade? Dentro da esfera limitada das religiões formais – umas mais, outras menos –, provavelmente não. Mas, na esfera da espiritualidade inclusiva, algo bem distinto da religião, com certeza, sim. Isso, porque a espiritualidade é a percepção da existência de experiências além do plano concreto, transpessoais, a sensação interna de algo além dos sentidos ordinários. Quando criamos uma instituição que categoriza a espiritualidade chegamos à religião, que, então, encapsula e limita a interpretação de nossas percepções, padronizando e generalizando a experiência. Seja o indivíduo negro, branco, homem, mulher, baixo, alto, gay, heterossexual ou bissexual, ninguém deixa de ser um indivíduo, completo. A questão é como viver essa plenitude, como não aumentar a ilusão da separação. Para isso, temos que aprender a escutar nosso próprio coração.

Então, é claro que um gay também precisa ter uma vida espiritual. Sua compreensão espiritual do mundo o fará entender que é possível amar alguém do mesmo sexo, alguém com quem não será possível reproduzir nos padrões biológicos da maioria, mas que esse também não é o único objetivo do amor. Se fosse, como ficaria a situação dos casais heterossexuais estéreis? Não poderiam amar-se por não poderem reproduzir?

Pode parecer forte, mas a afirmação de que as religiões institucionalizadas não podem trazer uma vivência plena e gratificante para a espiritualidade gay se aplica também à espiritualidade não-gay. Ou seja, um caminho linear, pré-definido, normatizado, não faz bem a nenhum ser humano, gay ou não. Afinal, a alma humana não se encaixa em moldes pré-definidos, seja pela religião ou pela ciência. Cada alma é única, não segue um padrão absoluto, ainda que existam semelhanças entre as almas. Então, o que homossexuais precisam é de uma espiritualidade inclusiva, em consonância com as suas verdades internas.

De qualquer forma, já há “Igrejas Inclusivas” em vários países, todas procurando preencher a lacuna espiritual na vida gay, lacuna esta criada pela exclusão milenar causada pelas religiões institucionalizadas. Elas não consideram a homossexualidade como uma doença a ser cura, e representantes de algumas delas provavelmente escreverão neste blogue no futuro, assim como religiosos inclusivos de outras fés, como budistas, hinduístas, judeus, muçulmanos, católicos, representantes da “nova espiritualidade”, etc.

Nosso blogue conterá vários tipos de postagens: artigos enfatizando a visão inclusiva nas diversas formas de espiritualidade; artigos denunciando o preconceito religioso e fundamentalista contra a diversidade de orientação sexual; dicas de blogues, sites, filmes e documentários sobre temas pertinentes; tradução de artigos internacionais importantes; divulgação de eventos LGBT, especialmente os de caráter inclusivo; artigos permitindo o contraditório e o direito de resposta, quando cabível ou mandado por força legal; notícias do mundo LGBT pertinentes; decisões legislativas e debates políticos relativos aos direitos LGBT em geral, conforme sua relevância e pertinência no tocante aos propósitos do blogue; temas culturais relevantes.

Considerando que nosso blogue será público, e para não ser reclassificado como inadequado para menores, não conterá nem admitirá postagens com conteúdo pornográfico explícito, conteúdo racista, neonazista, fundamentalista, preconceituoso, incitador de violência ou discurso de ódio. Colaboradores do blogue que não seguirem estas recomendações poderão ter seu direito a postagem revogados pelo administrador. Pedidos de revisão de materiais inadequados postados no blogue podem ser feitos por qualquer pessoa diretamente ao email espiritualidadeinclusiva@gmail.com

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