domingo, 6 de maio de 2012

Você é espiritualista... e homofóbico? (Uma pergunta para os amigos de verdade)

Por Paulo Stekel


Estou protelando a escrita deste artigo há muito tempo. Como espiritualista, budista, universalista, apoiador das terapias holísticas e também ativista do movimento gay, especialmente na visão da chamada “Espiritualidade Inclusiva”, convivo com pessoas que se dizem “espiritualistas” e “espiritualizadas” todos os dias. Há muitos gays nesta área, e o número tem aumentado nos últimos anos, especialmente na área de magia wicca, práticas de matriz africana, massoterapia, Reiki e Terapia Floral.

Contudo, não me escapa o fato de que também há muita gente que não esconde seu pensamento retrógrado quanto à presença de pessoas pertencentes à comunidade LGBT no meio espiritualista. Já tive vários embates com terapeutas relativamente conhecidos do Rio Grande do Sul sobre a questão homossexual e fiquei bastante decepcionado com a visão fundamentalista de alguns. Parece que reproduzem o velho pensamento homofóbico judaico-cristão revisitado pela maçonaria masculina em seus discursos. Pela Internet recebo com certa frequência mensagens de amigos e conhecidos sobre a questão homossexual que revelam seus preconceitos, desconhecimento e valorização da vida humana em escalas de orientação sexual. Uma vileza incompatível com a espiritualidade!

Há mesmo na aparentemente inocente visão da Teosofia uma tendência altamente homofóbica, como eu mesmo pude confirmar ao trabalhar em conexão com a Sociedade Teosófica, no ano de 2005. Também confirmei que a Maçonaria masculina é muito mais preconceituosa que a mista pelo mesmo motivo pelo qual não aceita mulheres em seu quadro de membros: as mulheres são consideradas inadequadas e espiritualmente não-completas para o aperfeiçoamento, mesmo pensamento medieval da Igreja da Inquisição que ainda se impõe na negativa atual do Vaticano em se ordenar sacerdotisas.

Como tenho milhares de contatos em minhas listas de email e nas redes sociais das quais participo, é natural de vez em quando deparar-me com espiritualistas homofóbicos. E, os há, em certa quantidade. Toda a vez que compartilho um novo artigo do blogue Espiritualidade Inclusiva nas redes percebo quem é quem. Uns bloqueiam nosso perfil para não receberem mais nossas atualizações, mas hipocritamente continuam membros de nosso perfil nas redes. Querem parecer politicamente corretos, mas são espiritualmente podres por dentro!

Numa época em que a espiritualidade tem saído dos bancos das igrejas para o interior das pessoas, como ainda se pode admitir que aqueles que pregam um novo mundo, uma nova era de paz e amor, possam continuar excluindo seres humanos simplesmente por causa de sua orientação sexual? Como ainda se atrevem a colocar palavras preconceituosas na boca de Deus, de anjos, de mestres, de mentores ou o que o valha?

A homossexualidade, bissexualidade e transexualidade estão presentes em todos os setores de nossa sociedade e não há como varrê-las para debaixo do tapete. Para isso, teríamos que incinerar (à moda nazista) ou fuzilar (à moda chinesa maoísta) cerca de 10% de toda a humanidade, sem qualquer possibilidade de que, assim, não nasceriam mais pessoas “diferentes”, já que a maior parte delas nasce de pais “heterossexuais”. Confundir sexo, gênero e orientação sexual é causa de mais preconceito, na certa!

E, o desconhecimento de muitos espiritualistas, universalistas e adeptos das mensagens dos “Mestres da Grande Fraternidade Branca” e da “nova era” sobre a sexualidade humana é gritante. Por isso, inventam terapias menos conhecidas da mídia para, supostamente, corrigir determinados “desvios sexuais” e até criam tratamentos com terapia floral para “curar o homossexualismo”.

Derrubando esta falácia, a terapeuta floral Maria Helena Ribeiro Facci Ruiz, em seu artigo “O Floral e o homossexualismo” (sic) [http://www.alumiar.com/saude/47-floraisdebach/348-ofloraleohomossexualismo.html] escreve:

“Perguntaram-me se há floral para o homossexualismo. Eu respondi que não. O floral ajuda o indivíduo a equilibrar-se. Modifica seu estado mental; faz aflorar a harmonia onde existe desarmonia. Porém, o floral não é específico para homossexualidade. Não importa se a criatura é hétero ou homossexual. Importam as emoções trabalhadas por ela. Importa o que a incomoda no momento. Importa se ela está certa das escolhas que fez. Se houver uma incerteza a respeito de que caminho seguir e de que escolha sexual definir ela poderá beneficiar-se da essência Scleranthus que é do grupo da insegurança e extremamente eficaz quando oscilamos entre duas possibilidades. Se houver medo de enfrentar a sociedade e suas opiniões, poderemos indicar Mimulus que é para medos específicos. (...) Essas são apenas algumas das essências a serem indicadas e tratam de desequilíbrios emocionais que podem acometer todos os indivíduos independentemente da escolha sexual que tenham feito.

Este assunto sobre homossexualidade é dos mais delicados e não me sinto adequada para falar sobre ele já que muito tem sido discutido nas mais variadas áreas e das mais competentes formas. Joyce Mc Dugall em seu estudo sobre a sexualidade observa que não há diferenças entre analisandos homossexuais e heterossexuais. Os problemas e desequilíbrios que acometem uns, acometem também os outros. Casais homossexuais apresentam as mesmas queixas em seus relacionamentos.

(…) Penso que devemos olhar para o ser que se apresenta a nós como um todo, como algo único e fadado a cumprir algo. Fadado a chegar a algum lugar: o dele, o que lhe cabe. Quando esse ser nos procura ou a qualquer forma de terapia ele se apresenta fervilhando de minhocas e lesmas que devem ser levadas em conta. Não importa se ele se relaciona com o mesmo sexo. Importa o quanto ele está inteiro nas suas escolhas.

Muito há que ser questionado e muitas essências a serem indicadas. É que o indivíduo que ali está não é um hétero ou um homossexual. É uma roseira inteira, um mundo particular, um sistema a ser conhecido, não por mim, mas através de mim. Precisa de minha orientação, mas mergulhar em suas próprias águas somente ele poderá fazer. Somente ele poderá aceitar-se como de fato é.”

Sábia orientação, embora não seja a mais comum no meio espiritualista. Ou a falta de preparo é a tônica, ou o preconceito descarado, ou o velado. De qualquer forma, homossexuais que procuram espiritualistas e terapias holísticas para si, raramente encontram pessoas preparadas para compreendê-los, salvo se estes também forem homossexuais, como tenho observado na prática.

Há pelo menos dois sistemas de florais que pretendem um certo “equilíbrio” nos casos de desajustes causados por “homossexualismo” e “lesbianismo” que deixam muito a desejar no esclarecimento do que realmente pretendem. Um tem origem na Argentina e outro é brasileiro. Há outros no mesmo grau de confusão. Devemos saber separar as terapias dos preconceitos de seus “sintonizadores”. Não há nada a ser “curado”, “transformado” ou “mudado” no caso de homossexualidade e lesbiandade. Todo o indivíduo LGBT é um ser completo, com as mesmas faculdades e qualquer outro, e assim deve ser respeitado, considerado e tratado.

No final, o problema é que muitos grupos espiritualistas, do mesmo modo que as grandes religiões instituídas, excluem totalmente os LGBT de suas práticas, desconsiderando um princípio primordial da Natureza material e espiritual: a diversidade, a multiplicidade e a adaptabilidade. Penso que as “sexualidades não-heteronormativas” estão nesta conta da Natureza. Aliás, entre os animais a homossexualidade foi encontrada em cerca de 500 espécies, evidenciando os princípios da diversidade, multiplicidade e mesmo adaptabilidade, já que algumas delas simplesmente conseguem mudar de sexo para manter o equilíbrio do grupo. O fator socializante da bissexualidade entre os primatas, por exemplo, tem sido amplamente pesquisado atualmente.

Lembrando de minha própria história, nos idos de 1990 participei de grupos espiritualistas que, ou calavam-se quanto a expressões sexuais não-heteronormativas, ou “caíam de pau”, “descendo o porrete” à moda Malafaia sem a menor vergonha. Muitos gays se afastavam destes grupos, pensando ser indignos de qualquer busca espiritual ou elevação.

Ao participar dos chamados “grupos gnósticos” a coisa ficou mais séria, pois estes consideram a homossexualidade e símiles algo tão “inferior” energeticamente a ponto de manchar a suposta “pureza clínica” que buscam com suas práticas tântricas sexuais duvidosas. Ao mesmo tempo que não aceitavam gays, propuseram a um amigo heterossexual que não possuía parceira para o sexo tântrico por ser apaixonado por uma menina que não o queria, que este buscasse uma prostituta para a concretização do ritual! Hipocrisia homofóbica que aceita tudo para os heterossexuais em nome de uma evolução falaciosa e condena o simples beijo gay!

Quando me tornei membro da Sociedade Teosófica (aquela fundada pela russa Helena Blavatsky em 1875), em 1994, passei a conhecer mais sobre a homofobia reinante nos meios espiritualistas “de elite”. Gays eram ali tolerados, mas inferiorizados nas conversas de bastidores, além do fato de que não eram bem-vindos na “Escola Esotérica”, a que se propõe a ser uma preparação para o “contato” com os Mestres da Fraternidade Branca. Em 2005, quando trabalhei mais conectado à Sociedade Teosófica, em Brasília, percebi o quanto a “espiritualidade de elite” (a da classe média alta) é homofóbica! Entre estes, os gays são considerados desviados, desviantes, seres de energia inferior e conduzentes às trevas. Não estou exagerando!

Este quadro só mudará quando os espiritualistas LGBT e os simpatizantes se unirem e mostrarem que espiritualidade não depende de sexo, gênero ou orientação sexual, mas de uma conduta mental correta que venha a se refletir em palavras e ações, conforme o ensinamento do Buda e de outros grandes instrutores da humanidade.

Vamos fazer isto? OK. Comecemos, então apoiando esta ideia: sou espiritualista, sou LGBT e tenho o mesmo valor espiritual que qualquer outro ser humano! Assuma isto com todas as forças e você conquistará o espaço, o respeito e o reconhecimento que lhe é de direito! Ou, cale-se e continue sendo espezinhado pelos cantos como eram os leprosos nos tempos de Cristo.

Sei que, ao enviar esta postagem a meus amigos e contatos, alguns se insurgirão, reclamarão, criticarão e deixarão sair a fera homofóbica que escondem sob o véu de uma aparente política de boa vizinhança. Mas, hipocrisia e espiritualidade não combinam, e estou disposto a dar a cada um o que desejar: minha amizade ou minha indiferença, mas nunca minha submissão! Faça você o mesmo, pois se sentirá melhor, e compartilhe conosco.

Mas, antes, faça a si mesmo a pergunta que não quer calar: você é espiritualista... e homofóbico? Esta é a pergunta que eu mesmo deixo aos amigos de verdade e aos seres humanos realmente interessados no bem da toda a humanidade, sem distinções...

6 comentários:

Allan Yoshikawa disse...

Você ganhou com toda certeza minha admiração!

Que trabalho incrível você está fazendo!

Parabéns!

Espiritualidade Inclusiva disse...

Grato pelo elogio, Allan!

Já que está gostando de nosso trabalho, venha somar-se a ele, seja ajudando na divulgação de nosso blogue, seja falando do Movimento Espiritualidade Inclusiva em sua região. Em breve começaremos a congregar apoiadores em todo o Brasil e teremos alguns representantes nos Estados. Continue conosco.

Abraços,

Paulo Stekel
(coordenador)

Anônimo disse...

Amigo, voce está errado ao criticar o que desconhece (práticas gnósticas).
Antes que vc interprete mal o que estou aqui dizendo, adianto que sou gay e gnóstico e militante dos direitos LGBT.
Porém, não confunda a postura lamentavelmente homofóbica da maioria dos gnósticos, que é reflexo de ignorância e diria até de pouco brilho espiritual, com a sabedoria e a prática gnóstica - estas são milenares e ancestrais e estão em pé de igualdade com o xamanismo tolteca, com o taoísmo e com o yoga como caminhos para a iluminação.

Existem gnósticos que admitem o sexo gnóstico entre mulheres e homens. São raros, mas existem.

Existe uma corrente da Gnose que chega a afirmar que os homossexuais são seres que tem facilidade para a elevação da shakti-kundaliní e que possuem em si tanto o princípio feminino quanto o masculino o que, de acordo com certas interpretaçoes, os torna seres até mesmo superiores...

Por tudo isso, não dirija comentários hostis a gnose. Se necessário, dirija a alguns gnósticos: os homofóbicos.

Paz!

Obs: vc já pesquisou o conceito de "two-spirit"? é como algumas tribos indígenas norte-americanas chamavam os seus e as suas homossexuais. Eram considerados, nestas tribos, seres espiritualmente elevados e especiais, por isso ocupavam lugar de destaque.

Espiritualidade Inclusiva disse...

"Anônimo gnóstico".

Primeiro leia atentamente o trecho em que falo dos gnósticos:

[Ao participar dos chamados “grupos gnósticos” a coisa ficou mais séria, pois estes consideram a homossexualidade e símiles algo tão “inferior” energeticamente a ponto de manchar a suposta “pureza clínica” que buscam com suas práticas tântricas sexuais duvidosas. Ao mesmo tempo que não aceitavam gays, propuseram a um amigo heterossexual que não possuía parceira para o sexo tântrico por ser apaixonado por uma menina que não o queria, que este buscasse uma prostituta para a concretização do ritual! Hipocrisia homofóbica que aceita tudo para os heterossexuais em nome de uma evolução falaciosa e condena o simples beijo gay!]

Ficou claro que falo da pseudo-gnose criada por Samael Aun Weor, onde aconteceu o que descrevo. Portanto, sei muito bem do que estou falando.

Ademais, não estou falando da Gnose legítima, a original, que tem conexões com a Sabedoria Primordial. Mas, sinceramente, o que os discípulos e seguidores de Samael fazem pelo mundo não tem nada de gnóstico, além de ser um visão extremamente exclusivista, tantrismo negro e homofobia pura. Eu mesmo passei por preconceito por causa disso entre eles na década de 1990.

Nada mais a declarar.

Paulo Stekel

Unknown disse...

Nossa, sou praticante de Wicca onde todas as forms de amor, são amor. Ah mas quando coneçei a frequentar e estudar a gnose me deparei com lastimas direcionada a nossa opção sexual... Eles falam em matar o Eu, ego ou defeito, ou seja dentre muitos o pior é ser gay. Francamente, aqueles que se acham dono da verdade são os mais cegos nos mistérios do Universo. Deus é amor não essa ideologia puritana que tentaram me ensinar.

Espiritualidade Inclusiva disse...

Pois é, Cleiton Ferreira. você viu in loco o que dissemos aqui. O Movimento Gnóstico moderno é, além de puritano, tremendamente machista e homofóbico. Tanto que um homossexual declarado JAMAIS consegue avançar de fase nos estudos deles porque nunca o deixam ir adiante. Mas, paradoxalmente, eles não têm a mínima vergonha em sugerir a seus praticantes heterossexuais que peguem uma prostituta para o sexo tântrico, caso não tenham namorada ou esposa. Esta é a medida da hipocrisia. Abraços!